Amigas e amigos do blog,
diante do resultado final do julgamento do Supremo Tribunal sobre a
admissibilidade dos chamados embargos infringentes no processo do mensalão - o ministro Celso de Mello, último
dos 11 ministros a votar e a desempatar, já deixou claro que vota por acatá-los
-, confesso que escrevo com um profundo sentimento de derrota e de desânimo.
Um sentimento tão grande quanto
o que senti quando as Diretas-Já não passaram por falta de 22 votos no
Congresso, em 25 de abril de 1984.
Algo semelhante à tristeza,
à perplexidade e o vazio diante da morte de Tancredo Neves, em 21 de abril de
1985.
Um sentimento de
impotência, de desalento, de LUTO.
O ministro Celso de Mello,
naturalmente, está em seu pleno direito de ao votar pela admissibilidade
dos embargos existentes no Regimento Interno do tribunal, mesmo que eles não
mais estejam previstos na legislação posterior ao regimento que trata,
especificamente, da tramitação de processos em tribunais superiores.
Para justificar seu voto, o
ministro se estendeu das Ordenações Filipinas do século XVII até os códigos
processuais estaduais que a Constituição de 1891 permitia. Argumentou com as
costumeiras solidez e erudição. O ministro insistiu na necessidade de um
julgamento pelo Supremo não ser influenciado pelo "clamor público" e invocou
com frequência a "racionalidade jurídica".
Celso de Mello é um
"defensivista", partidário do direito de mais ampla defesa dos réus.
Mesmo réus sob os quais
recai a acusação de estar envolvidos em uma conspiração corrupta para assestar
um "golpe de Estado branco", segundo palavras do ex-presidente do Supremo
Carlos Ayres Britto.
Sempre respeitei o ministro
Celso de Mello, por sua cultura jurídica, seriedade e aplicação ao trabalho.
Não acho que ele foi
cooptado por ninguém, até por haver se manifestado antes na direção em que
votou hoje.
Continuarei respeitando o
decano do Supremo.
Mas jogo a toalha diante da Justiça brasileira.
Jogo a toalha,
principalmente, diante da legislação com a qual a Justiça brasileira tem que
trabalhar.
Todo o nosso
arcabouço jurídico está pensado para NÃO punir os poderosos.
As leis já saem do
Congresso, com raríssimas exceções, contendo esse nefasto chip.
E o emaranhado de códigos, leis, estatutos, regimentos
e disposições processuais - ou seja, sobre a TRAMITAÇÃO das causas dentro do
Judiciário -, tal como demonstrou brilhantemente em post neste blog o ilustre juiz de Direito em São Paulo Alfredo
Attié, se tornaram, ao longo do
tempo, uma forma de complicar e até de impedir a plena aplicação do direito.
Uma forma de
atrapalhar ao máximo que se faça justiça.
É claramente o caso
dos mensaleiros, que estão escapando da cadeia graças a filigranas processuais.
Admitida a possibilidade de
embargos infringentes, como ocorreu hoje no Supremo, os advogados dos
mensaleiros, pagos a peso de ouro - por quem???? -, o primeiro que farão é
apresentar embargos de declaração para esclarecer supostos pontos obscuros dos
embargos de declaração já julgados.
Parece coisa de Kafka, mas
é a legislação brasileira a permitir a interminabilidade dos processos - única
e exclusivamente para quem pode pagar advogadões, claro.
Dezenas de milhares de
presos que apodrecem em nossas vergonhosas penitenciárias muitas vezes por
delitos leves e que em alguns casos, por milagre, contam com um raro defensor
público, JAMAIS vão obter qualquer colher de chá dessa barafunda processual.
Isso é coisa de
rico e poderoso, para rico e poderoso.
No caso dos mensaleiros,
somente depois de julgados os novos embargos de declaração, e somente após o
absurdo recesso de fim de ano do Judiciário - Deus do céu, por que não se faz
nesse Poder essencial à população rodízio para férias de seus integrantes, como
em qualquer empresa? -, é que começarão a ser examinados, um a um, os embargos
infringentes.
Esse lenga-lenga vai
consumir boa parte do ano de 2014, se não o ano todo.
Ano em que haverá uma Copa
do Mundo e eleições presidenciais, para o Congresso, os governos estaduais e as
Assembleias Legislativas.
A opinião pública, exausta,
estará descrente e dispersa.
É tanto tempo, que pode
haver mais uma troca de ministros no Supremo, por aposentadoria ou pelo dedo do
Altíssimo.
Estará tudo pronto,
então, para que os mensaleiros tenham suas penas aliviadas para prisão em
regime aberto, prisão domiciliar ou, mesmo, a plena absolvição.
De minha parte, desde
já, jogo a toalha.
O que mais fazer?
Fonte: "Política & Cia"
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