Por Reinaldo Azevedo
Em julho de 2003, o jornalista Guilherme Fiuza escreveu um texto
intitulado "Lula privatizou a si mesmo". O Ministério Púbico pedira, então, que
a Polícia Federal abrisse um inquérito para investigar denúncia de Marcos
Valério, segundo quem Lula - sim, o Babalorixá de Banânia - havia intermediado
o repasse de R$ 7 milhões de uma empresa de telefonia portuguesa para o PT. A
informação era pública, e Fiuza fez considerações a respeito. O partido decidiu
processá-lo por danos morais, com pedido de indenização de R$ 60 mil.
Pois é…
Agora o PT pediu sabem o quê? Uma audiência de conciliação!
Aconteceu depois que o advogado de Fiuza apresentou em juízo a lista negra
elaborada pela legenda, da qual, como vocês sabem, faço parte. Segundo o senhor
Alberto Cantalice, vice-presidente do partido, Fiuza integra a súcia de homens
que fazem mal ao Brasil: além de nós dois, compõem o rol dos perigosos Diogo
Mainardi, Augusto Nunes, Demétrio Magnoli, Marcelo Madureira, Arnaldo Jabor,
Lobão e Danilo Gentilli. Sabem como é… Somos pessoas más. As boas estavam
reunidas na Petrobras, fazendo um Brasil melhor.
Pois é… Só que Fiuza quem não quer conciliação. Quer que o
processo siga até o fim. Afinal havendo ainda juízes em Berlim e no Brasil, é
ele quem está sendo molestado pelo PT, não o contrário. O texto que motivou a
ação do partido integra o excelente livro "Não É a Mamãe", publicado pela
Editora Record.
*
Lula privatizou a si mesmo
O Ministério Público pediu à Polícia Federal abertura de inquérito
contra Lula. A base do pedido é a denúncia de Marcos Valério, que o acusa de
ter intermediado um repasse de R$ 7 milhões de uma telefônica para o PT.
Valério afirmou que foi a Portugal em 2005 para preparar essa operação.
O Ministério Público parece que bebe. Será possível que os
procuradores ainda não entenderam? Lula não sabia. Tanto não sabia, que até
outro dia afirmava, para quem quisesse ouvir, que o mensalão não existiu. A
condenação de seus companheiros mensaleiros, aliás, deve ter sido um choque
para ele. Se é que ele já sabe o que aconteceu no Supremo Tribunal Federal.
É uma injustiça essa suspeita de armação petista para sugar milhões
de uma empresa privada de telefonia. Todos sabem que o PT prefere extorquir
empresas públicas. Até porque as estatais são coisa nossa (deles). Com tanto
trabalho para chegar ao poder e passar a ordenhar os cofres do Banco do Brasil,
da Caixa Econômica, do BNDES, por que Lula e sua turma perderiam tempo
achacando uma telefônica portuguesa?
Ao receber a notícia sobre o inquérito contra Lula por suspeita de
envolvimento com o valerioduto, José Dirceu reagiu imediatamente. E disparou o
argumento fulminante: o mensalão não existiu. Se existe alguém com autoridade
para afirmar isso, esse alguém é José Dirceu. Condenado a dez anos de prisão,
ele sabe que essas coisas que não existem podem dar uma dor de cabeça danada.
Se Lula não sabia de algo que não existiu, nada melhor do que ser defendido
pelo lendário Dirceu, guerreiro do povo brasileiro - personagem que também não
existe.
Enquanto o filho do Brasil espera esfriar a denúncia do pedágio
colhido com a telefônica, recebe a solidariedade dos fiéis por seu trabalho com
as empreiteiras. Sabe-se agora que Lula fez uma série de viagens internacionais
bancadas por algumas grandes construtoras brasileiras. Ele explicou que isso
foi um ato patriótico - foi ajudar empresas nacionais a fazer negócios no
estrangeiro, para o bem do Brasil. Não restam mais dúvidas: a vida é bela. E é
feita de gestos nobres como este: um ex-presidente aproveita seu tempo livre
para fazer boas ações, ajudando empresários a ganhar dinheiro no exterior,
porque país rico é país sem pobreza empresarial.
Aí surge um comovente coro de progressistas, éticos e crédulos para
afiançar as turnês lulistas, gritando que Lula não fez nada demais. De acordo
com a nova moral da república companheira, não fez mesmo. Qual o problema de o
líder máximo do partido que governa o país desenvolver uma relação particular
(ou patriótica) com grandes empreiteiras que têm o governo como cliente? Que
mal haveria na ajuda de Lula a empresas decisivas no jogo político, com suas
doações às campanhas eleitorais? Qual o problema de Lula ter viajado para a
Venezuela para arrancar de Hugo Chávez US$ 1 bilhão, devido a uma dessas
empreiteiras, que pagou a viagem de Lula? E se essa empresa for a mesma que
realizará seu sonho de construir o estádio do seu clube de coração para a Copa
do Mundo, fazendo a alegria de milhões de torcedores-eleitores fiéis?
Não tem problema nenhum. Esse é o Brasil moderno, onde as coisas
acontecem às claras, inclusive o tráfico de influência. A não ser quando o
ministro do Desenvolvimento declara secretos os documentos de financiamentos do
BNDES a Cuba e Angola, para obras dessas mesmas construtoras amigas de Lula.
Deve ser para a imprensa burguesa não meter o bedelho – sempre uma boa causa.
Por acaso, o ministro do Desenvolvimento é Fernando Pimentel, amigo de Dilma
que prestou consultorias milionárias à indústria de Minas Gerais. Como se sabe,
essas consultorias nunca foram demonstradas. Devem ter sido também apenas um
ato patriótico, nova definição para o velho ditado “uma mão lava a outra”.
Pelo visto, a mão que nenhuma outra lavou no final das contas foi a
do companheiro Valério – logo ele, que lavou tanto para tanta gente. Agora, o
operador do mensalão que não existiu quer mostrar a mão grande do chefe. Será
mais um susto. Ele não sabia.
Fonte: "Blog
Reinaldo Azevedo"
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