Por Reinaldo Azevedo
Numa ditadura, usar máscaras significa um ato de
resistência. Não é certo, não é necessariamente assim, mas é possível que os
que lutam contra uma tirania queiram uma democracia. É bom não esquecer que, na
Síria, por exemplo, há terroristas combatendo um carniceiro. Mas sigamos: não
há como censurar os que usam máscaras para se opor a facínoras. Mas respondam
aqui a este jornalista que é cotidianamente torturado pela lógica: por que
alguém usa máscaras numa democracia?
Os rapazolas e as moçoilas que andaram sendo
molestados ideologicamente por professores que nunca leram Marx, mas que se
apresentam como especialistas no pensamento de um delinquente como Slavoj
Zizek, dirão que o direito à rebelião acompanha o homem como o ar que ele
respira. Alguns outros que se querem liberais em economia, mas libertários nos
costumes e valores, pensam mais ou menos como Zizek. No fim das contas, os dois
lados acreditam que podem chegar a resultados opostos recorrendo aos mesmos
instrumentos e valores. Há uma boa chance de que os dois lados estejam errados,
então…
Enquanto isso… Bem, enquanto isso, não é aceitável
que delinquentes, adicionalmente covardes, recorram a máscaras para sair por aí
quebrando tudo. Em nome de quê? De quais valores? Então eles acham que os
políticos são trapaceiros e ladrões e, por isso, quebram bancos? Então eles
acham que os serviços públicos são ruins e, por isso, quebram lojas de
departamentos ou concessionárias de carros? Então eles acham que o capitalismo
é um erro histórico e, por isso, resolvem impedir o direito que têm as pessoas
de ir e vir? Então eles acham que a imprensa não é boa e, por isso, querem
censura?
Ora, ora…
É claro que eu apoio a decisão da Justiça que
confere à polícia o direito de obrigar que manifestantes mascarados se identifiquem.
Se, com efeito, for posta em prática, acaba essa folia. Eu detesto gente
covarde. Olhem aqui: eu não me arrependo das ideias que tive, do que pensei, do
que defendi. Mas me arrependo, sim, do que, hoje, me parece besteira. Invadi
reitoria e prédio administrativo da universidade etc. e tal. O Brasil,
formalmente, ainda era uma ditadura - "A Ditadura Esculhambada" (o livro que
Elio Gaspari não escreveu…), mas, mesmo assim, não usei máscara. Apanhei com a
cara que eu tinha. Nessas e em outras circunstâncias.
Esse negócio de usar máscara para quebrar prédios
públicos e privados é uma mistura de pós-marxismo mal digerido, ministrado por
alguns professores universitários do miolo mole, com o que chamo geração
Toddynhyo & Sucrilho pós-construtivista. Jamais diga "não" ao monstrinho,
ou ele começa a quebrar a casa… Qual é? Mostrem a cara, corajosos! O que
querem? Fazer revolução quebrando banco de dia e dormir na caminha quente
arrumada pela mamãe à noite? Trotski, já lembrei aqui, era filho de um
latifundiário. Quando decidiu que queria pôr fim ao czarismo e ao capitalismo
nascente na Rússia, renunciou a tudo e foi morar no casebre de um jardineiro.
Eu não gostava da ditadura. Lutei contra ela e
arquei com as consequências. E era uma ditadura. Os mascarados não gostam da
democracia? Pois que lutem contra ela, então, mas arcando com as consequências.
Num regime democrático, costuma ser apenas a aplicação de Leis, também
democraticamente pactuadas.
E aproveito o ensejo para, mais uma vez, lastimar a
militância da OAB-RJ, que vem tendo um posicionamento lamentável. Em vez de se
portar como babá de baderneiro, deveria se aplicar à defesa do estado de
direito. E eu quero saber qual é o dispositivo legal que permite que pessoas
usem máscaras para sair barbarizando por aí. A eventual truculência da polícia
não serve de desculpa.
Não! Eu não gosto de Sérgio Cabral. Não! Eu não
estou entre os que admiram a suposta "genialidade" de José Mariano Beltrame, o
secretário de Segurança Pública. Fui quase um monopolista da crítica a ambos
durante um larguíssimo período. Mas eu os reprovo nos marcos da democracia.
Cabral foi eleito pela população do estado do Rio de Janeiro e só pode ser
apeado do poder segundo as regras do regime democrático. Não havendo um
processo judicial que o justifique, vocês terão de esperar ou a sua renúncia,
que é ato volitivo, ou as eleições. E fim de papo!
Os mascarados têm todo o direito de lutar pela
anarquia ou por uma ditadura. Mas a democracia tem o direito e o dever de se
defender. O resto é uma soma indigesta de submarxismo delinquente com
libertarismo de manual.
PS - Se, hoje, todos os mascarados fossem
identificados, vocês ficariam espantados ao descobrir a quantidade de
professores universitários que há entre eles. "Pobres da periferia e dos morros?" "Vítimas da violência habitual da polícia que decidiram reagir?" Uma ova! Já
fui muito pobre. Pobreza não é categoria de pensamento, eu sei. Mas também sei
quais são as suas urgências. Só sai quebrando tudo por aí, de caso pensado,
quem acredita que os bens materiais nos desviam, como é mesmo?, da verdadeira
“essência” do ser. Para ser idiota a tal ponto, é preciso não ter ou jamais ter
tido qualquer dificuldade com… os bens materiais. Não é o caso dos pobres.
Estes podem até se revoltar quando são maltratados por serviços públicos, como
o transporte urbano precário, por exemplo. Mas não criam uma estética e uma
ética da violência. Isso, com raras exceções, é um traço de classe, típico dos
filhos dos endinheirados. Assim, poucas coisas são tão tipicamente "burguesas" quanto ser um antiburguês!
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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