Por Augusto Nunes
"Da maneira que está sendo
veiculado, dá a impressão que o acolhimento vai representar absolvição ou
redução de pena automaticamente, e não é absolutamente nada disso", queixou-se
Celso de Mello no domingo ao repórter Severino Motta, da Folha, com quem conversou enquanto tomava
café com a filha numa livraria de Brasília. Nesta quarta-feira, ao votar pelo
acolhimento dos votos infringentes, o decano do Supremo Tribunal Federal
caprichou na pose de quem não está inocentando ninguém. Mas tornou inevitável a
absolvição, daqui a alguns meses, de todos os mensaleiros condenados pelo crime
de formação de quadrilha.
Ao contrário dos que
votaram pela condenação, os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Cármen
Lúcia e Rosa Weber não conseguiram enxergar uma quadrilha onde Celso de Mello,
em agosto de 2012, viu o mais descarado bando de quadrilheiros que já
contemplara em 43 anos nos tribunais. Mas o mesmo Celso de Mello, como se
constatou nesta tarde, também acha que todo réu absolvido por quatro ministros
do STF pode valer-se do embargo infringente para ser julgado de novo. Julgado
e, no caso, inocentado por um Supremo espertamente modificado pela incorporação
de duas togas escaladas para socorrer companheiros em apuros.
Com a chegada de Teori
Zavaschi e Roberto Barroso, os quatro viraram seis e a minoria virou maioria.
Assim, é mera questão de tempo o parto oficial do mais recente monstrengo
jurídico do Brasil lulopetista: o bandoleiro sem bando. Segundo os ministros da
defesa, os quadrilheiros do mensalão não formaram uma quadrilha. Como não houve
quadrilha, tampouco existiu um chefe. José Dirceu, portanto, será oficialmente
exonerado do cargo que exerceu enquanto chefiava a Casa Civil do governo Lula.
Embora condenado por corrupção ativa (sem direito a embargo infringente), o
guerrilheiro de festim sabe que acabou de livrar-se da prisão em regime
fechado. Na hipótese menos branda, passará alguns meses dormindo na cadeia (e
pecando em paz durante o dia).
Ao prorrogar a velharia com
nome de produto de limpeza, Celso de Mello decidiu que os votos de quatro
ministros valem mais que a opinião de 70% dos brasileiros que sonharam com o
começo do fim da corrupção impune. Para proteger um zumbi regimental, deixou a
nação exposta aos inimigos do Estado de Direito. Se tivesse socorrido a
democracia ameaçada, Celso de Mello mereceria ser nome de praças e avenidas em
todo o país. Por ter estendido a mão aos criminosos, talvez tenha perdido até a
chance de ser nome de rua em Tatuí, a cidade paulista onde nasceu, cresceu e
vai desfrutar da melancólica aposentadoria reservada a todo aquele que poderia
ter sido e não foi.
Fonte: "Direto ao Ponto"
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