Por José Casado
Está em ascensão uma
tendência política tradicionalista em questões morais e sociais, defensora da
liberdade individual e do livre mercado. Pode emergir das urnas em outubro sob
a bandeira da renovação da democracia cristã, hoje dispersa na geleia
partidária brasileira.
Desde o início da disputa
presidencial as pesquisas destacam uma organização gestada na harmonia
ecumênica entre protestantes e católicos, o Partido Social Cristão. Ele
conseguiu escavar e preservar uma trincheira no instável terreno da
centro-direita.
O PSC surgiu no
pós-ditadura, na coligação de forças que derrotou Lula e levou Fernando Collor
de Mello à Presidência, em 1989.
Disputou a eleição de 1994
quando outro Fernando, o Henrique Cardoso, surfou na estabilidade da moeda, o
Real, epílogo de duas décadas de agonia inflacionária. Na época o candidato do
PSC, um militar, obteve 0,38% dos votos.
Agora o partido apresenta
um pastor evangélico, a bordo de um roteiro conservador, moldado no ideário da
moral cristã e de princípios caros ao liberalismo na política e na economia.
Com um tom populista, e
cautelosamente contido na fronteira da laicidade, o candidato do PSC Everaldo
Pereira prega contra o aborto e o controle da natalidade com o mesmo fervor com
que defende a "assistência psicológica" aos homossexuais.
Flerta com o "Estado
mínimo" e faz o elogio do livre mercado com vigor similar à proposta de
relações diretas com as massas, espelhando-se na experiência do Cheque Cidadão - o controvertido programa assistencialista do qual foi um dos operadores no
governo Garotinho, no Rio do fim dos anos 90.
Sua desenvoltura levou a
centro-direita alinhada ao PSC a um desempenho inédito: 4% nas pesquisas dos
últimos dois meses. Se confirmado nas urnas, multiplicaria por onze a
preferência alcançada na disputa de 20 anos atrás. Equivale a seis milhões de
votos no universo de 142 milhões de eleitores.
Esse volume ajudaria a
conduzir a eleição ao segundo turno. O Datafolha atribui 38% a Dilma Rousseff.
É igual à soma dos índices de oito dos seus adversários: 33% divididos entre
Aécio Neves (PSDB), Eduardo Campos (PSB) e Everaldo Pereira (PSC) e mais 5%
entre José Maria, do PSTU; Eduardo Jorge, do PV; Luciana Genro, do PSOL; e
Mauro Iasi, do PCB.
A perspectiva aberta já
fomenta apostas no mercado futuro do Congresso. Abriu-se uma negociação entre
alas partidárias distintas, porém complementares como dois lados da mesma
moeda. O objetivo é reeleger no Rio o deputado Eduardo Cunha, atual líder do
PMDB na Câmara. Em seguida, levá-lo à disputa pela presidência da Câmara -
terceiro posto na linha sucessória da República.
A despeito de indivíduos e
interesses obscurantistas no jogo eleitoral, o que as pesquisas mostram é a
receptividade de parte do eleitorado ao projeto liberal-conservador. Refletem a
fermentação em torno de ideias afinadas com o liberalismo econômico e o
conservadorismo clássico, mesmo com mofo residual da Guerra Fria.
É saudável para a
democracia. E, talvez por isso, a centro-direita tenha virado atração nas
livrarias. Editoras nacionais contabilizam recordes sucessivos na impressão de
autores locais, com vendas de até cem mil exemplares por título.
Fonte: "O Globo"
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