Por Reinaldo Azevedo
Todo mundo sabe que este blog manda para campos de
reeducação do estilo quem emprega clichês como "corações e mentes", "desabalada
carreira" e "ponta do iceberg", muito especialmente este último, que, depois
daquele navio, vem carregado de morbidez e maus augúrios. O escândalo em curso
na Petrobras, no entanto, não nos deixa outra saída. De tal sorte ele é
acachapante que até o estilo tem de ser sacrificado. Sim, leitores amigos, tudo
o que Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef revelam é apenas a… ponta do iceberg.
Até agora, a imprensa não deu o devido peso a um
trecho do depoimento de Paulo Roberto, que remete a uma questão de que tenho
tratado com frequência aqui no blog. Os descalabros que estão sendo revelados
na maior estatal e na maior empresa brasileira são sintomas de uma doença
profunda do país, que está na origem de boa parte da nossa desgraça, dos nossos
desastres, das carências do povo brasileiro, de seu atraso, de sua miséria, de
sua falta de esperanças, de sua falta de perspectivas: o tamanho do estado.
Não se trata de firmar aqui uma posição meramente
ideológica - mais ou menos estado na economia - ou uma escolha de princípio.
Estamos lidando é com matéria de fato. Num dado momento, do depoimento, o juiz
Sérgio Moro pergunta a Paulo Roberto se as empresas que se encarregavam do
pagamento da propina sempre cumpriam com a sua parte. E Costa diz o seguinte,
leiam com atenção:
"Essas empresas, excelência, elas tinham interesses
não só dentro da Petrobras, mas em vários outros órgãos de governo, não é?,
vários órgãos de governo, a nível de ministérios, a nível de secretarias etc.,
compostas por elementos dos partidos. Então, vamos dizer: se elas deixassem de
contribuir com determinado partido naquele momento, isso ia refletir em outras
obras a nível de governo, que os partidos não iam olhar isso com muito bons
olhos. Então, seria um interesse mútuo dos partidos, dos políticos e das
empresas, porque não visava só a Petrobras, visava hidrovias, ferrovias,
rodovias, hidrelétricas etc."
Entenderam? O que Paulo Roberto está a nos dizer é
que a falcatrua, nos entes do estado, é universal. A Petrobras, então, nesse
caso, era, de fato, apenas a ponta do iceberg. Esse mesmo Paulo Roberto já
acusou as empreiteiras de atuar de forma cartelizada - um cartel que o Cade,
comandado por um peixinho de Gilberto Carvalho, nunca se ocupou, pelo visto, de
investigar. Mas isso ainda é o de menos: a ser verdade o que diz Paulo Roberto - e ele sabe muito bem como ficou multimilionário - o aparelhamento do estado,
além de conduzir à ineficiência, ao atraso, ao desastre, também serve à
roubalheira mais escancarada.
A sua fala não deixa dúvida: há uma estrutura
gigantesca, organizada e treinada para drenar os recursos públicos. Sendo como
ele diz, as empreiteiras entram, sim, como as corruptoras, mas observem que ele
diz também que não lhes restam muitas alternativas. Por que elas não
denunciavam? A ver. No mais das vezes, creio, o pragmatismo lhes diz que sua
tarefa é fazer obras, não arrumar processos na Justiça.
O PT está no poder há 12 anos. É impressionante que
o partido que chegou como a encarnação da esperança - nunca acreditei nisso
porque conhecia os valentes; mas milhões acreditaram - tenha se tornado não
apenas um cultor dos vícios, mas um verdadeiro reorganizador da bandalheira.
Se o PT vencer a disputa, é evidente que as coisas
ficarão como estão - afinal, os companheiros não veem motivos para mudar,
orgulhosos que são de sua obra, como se nota pelo horário eleitoral. Se Aécio
vencer, não tenho esperanças de que possa haver um novo ciclo de privatizações
das grandes empresas. Não está no seu programa. Mas se abre a possibilidade de
que se estabeleçam critérios técnicos para as nomeações, para que se reduza
substancialmente o número de cargos de confiança de livre provimento para que
se criem mecanismos efetivos para que o estado deixe de ser capturado por
larápios.
Para a tristeza do estilo e a má sorte dos
brasileiros, a roubalheira na Petrobras é, sim, só a ponta o iceberg.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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