Por Sandro Vaia
Então ficamos assim: a
presidente come o que quiser, no restaurante que quiser, porque ela paga a
conta. E pronto.
A comitiva dela pode
sair da Suíça e ir para Cuba com uma ligeira paradinha em Lisboa porque o avião
não tem autonomia de voo e precisava abastecer.
Enquanto o avião
abastece e a comitiva presidencial tem todo direito de alugar as suítes que
quiser, no hotel que quiser, pagar as diárias que quiser.
Enfim, a comitiva
presidencial tem o direito de fazer o que quiser, inclusive o de mentir e de
dizer que a escala foi improvisada, embora o governo português jure que tinha sido
informado dois dias antes.
A oposição, como não
podia deixar de ser, fez praça de mais essa vistosa aventura governamental, e
encaminhou um pedido à Procuradoria Geral da República para que a escala fosse
investigada.
A Comissão de Ética
Pública da Presidência da República não se sente habilitada a investigar essa
tal de escala secreta - tão secreta que até as fotos do chef do restaurante
lisboeta com a presidente foram publicadas em todos os jornais - e daqui a
alguns dias ninguém lembra mais de nada.
No Brasil há uma
extraordinária vocação para magnificar a banalidade ao mesmo tempo em que se
banaliza aquilo que talvez devesse se magnificar.
Enquanto se discute se a
escala foi secreta ou não, se a presidente pagou ou não pagou a conta do
restaurante, se as diárias do hotel foram ou não abusivas, a presidente chegou
tranquilamente a Cuba, entregou o porto novo financiado com dinheiro brasileiro,
e posou para fotos carinhosas com o vovô ditador aposentado mais longevo do
planeta.
Já que se trata, aparentemente,
de exigir um pouco mais de transparência, talvez fosse mais útil, em vez de
pedir à PGR que investigue a escala do avião, o menu do restaurante, as diárias
do hotel e quem pagou a conta, que a oposição conseguisse explicações claras
sobre as condições de financiamento do porto de Mariel, sobre o projeto da Zona
Especial de Comércio que o governo cubano pretende implantar lá, e quais vantagens
o Brasil pretende tirar disso.
O governo poderia
aproveitar também para deixar claro porque o dinheiro que está sendo gasto lá
não é o mesmo que faz falta na melhoria da nossa infraestrutura portuária,
rodoviária e aeroviária. Se não é falta de dinheiro, é falta do que? De
vontade? De competência?
E já que se trata de
deixar as coisas claras, porque não aproveitar para pedir explicações também
sobre os detalhes do contrato de prestação de serviços que o Brasil assinou com
Cuba para a importação da mão de obra de médicos, e se as leis trabalhistas do
País estão ou não sendo desrespeitadas por ele.
Enfim, saber que Dilma
paga as suas próprias contas no restaurante pode ser muito tranquilizador, mas
as preocupações da oposição e do País deveriam ir muito além da conta do
bacalhau e do vinho.
Sandro Vaia é
jornalista.
Fonte: "Blog do Noblat"
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