Laís Bodanzky nas filmagens de "Chega de Saudade"
Divulgação
Entrevista - Laís Bodanzky fala do seu olhar sobre os bailes, as locações-personagens, os desafios de filmar “Chega de Saudade”, e dos sentimentos revelados nas pequenas histórias.
Antes mesmo do filme “Chega de Saudade” ser um projeto bem definido, uma coisa já era certa para a diretora Laís Bodanzky: O seu segundo longa-metragem se passaria num universo tão presente na narrativa que, de pano de fundo, se converteria em personagem.
“Mais do que uma locação, o salão União Fraterna, onde o filme foi rodado, em São Paulo, é um personagem de ‘Chega de Saudade’”, afirma Laís.
Na entrevista abaixo, a cineasta conta como foi atraída pelos salões de baile e relata a complexidade enfrentada numa produção em que a dança e a música são elementos protagonistas. Laís também fala sobre o ângulo feminino predominante no filme, entre outros temas.
Antes mesmo do filme “Chega de Saudade” ser um projeto bem definido, uma coisa já era certa para a diretora Laís Bodanzky: O seu segundo longa-metragem se passaria num universo tão presente na narrativa que, de pano de fundo, se converteria em personagem.
“Mais do que uma locação, o salão União Fraterna, onde o filme foi rodado, em São Paulo, é um personagem de ‘Chega de Saudade’”, afirma Laís.
Na entrevista abaixo, a cineasta conta como foi atraída pelos salões de baile e relata a complexidade enfrentada numa produção em que a dança e a música são elementos protagonistas. Laís também fala sobre o ângulo feminino predominante no filme, entre outros temas.
Quais são as principais características de “Chega de Saudade”?
Trata-se de um filme que pretende criar intimidade entre espectador e personagens. As impressões relatadas por uma mulher de cerca de 50 anos, que assistiu às sessões de teste do filme, ilustram bem este componente em potencial do “Chega de Saudade”. Esta pessoa me disse que ao assistir ao filme se sentiu como se tivesse ido ao baile. Que foi como se conhecesse cada um dos personagens, inclusive os menores. E que se sensibilizou com os sentimentos retratados nas pequenas histórias que se desenrolam num dia de baile. A meu ver este filme é feminino, e se relaciona muito com este público. Aborda questões universais, mas de um ângulo próprio das mulheres. Trata de situações alegres e dolorosas. Quem vai ao baile em busca de um par entra no jogo da vida, marcado por situações ambíguas e sentimentos conflitantes. Você ganha, você perde. E para ganhar, muitas vezes tem de ceder em algo. Neste contexto, existe a verdade da esposa, e a verdade da amante. A razão da casada, e a da solteira. A vantagem da arrojada e a da tímida. Sem certo e errado. O benefício desta aposta é que estas pessoas conquistam a chance de terem momentos felizes. Elas têm uma atitude de ir para a rua, de sair do casulo. Agora, este também é um filme para voyers, homens e mulheres. Ele permite uma gostosa visita ao mundo dos bailes. Que é uma festa com muitos atrativos e emoções.
Que tipo de baile o filme mostra?
O “Chega de Saudade” contém características de diversos salões de bailes. Ele foi filmado no União Fraterna, um local bem tradicional deste circuito. Mas somamos a ele elementos de outros salões e tipos de eventos dançantes. Há ingredientes tanto dos chamados bailes da terceira idade - que na verdade são freqüentados por pessoas dos 30 e 40 anos em diante - quanto de outras casas de forró, brega e samba-rock onde o público é mais jovem. Nosso salão é como a cidade de São Paulo, que é uma salada cultural, que tem representantes de várias regiões do país e do mundo convivendo em harmonia. Isso, pra mim, é lindo. Pode ter japonesa dançando com negro; ruivo europeu paquerando uma senhora de traços indígenas.
Você se identifica, em algum nível, com os freqüentadores dos bailes?
Eu sou fruto desta mistura. Minha mãe nasceu na Bahia e meu pai em São Paulo. Mas ele aprendeu a falar alemão antes do português. Meus avós paternos vieram da Áustria um pouco antes da Segunda Guerra. Além disso, sempre gostei de dançar. Fiz aula de bale clássico e jazz. Sou de uma geração que recuperou o gosto pelos bailes. Peguei uma boa fase do brega e forró. Freqüentei casas na Vila Madalena em que a gente dançava ao som ao vivo do Waldick Soriano. Nesta época sentia a mesmo frisson que descobri nos bailes tradicionais.
Foi aí que você notou um mundo pródigo em personagens?
Pois é, este universo extremamente rico me deu a oportunidade de rodar numa locação-personagem, e fazer um filme de personagens. Eu tinha o desejo de filmar num ambiente que de tão característico é parte integrante, e talvez principal, dos acontecimentos. E que é determinante para o desenho das demais personagens.
Este é um tipo de cinema que me emociona pela sutiliza, como, por exemplo, são os filmes da diretora e atriz francesa Agnes Jaoui. Refiro-me a “O Gosto dos Outros” e “O Gato Sumiu”. O primeiro tem vários personagens muito humanos e bem definidos cujas histórias se entrecruzam. O segundo tem Paris - não a do cartão postal - como locação-personagem. Procurei usar estes dois tipos de abordagem no “Chega de Saudade”.
Como foi o processo criativo do filme?
A idéia veio quando fui pela primeira vez ao Cartola Clube, em São Paulo, e fiquei encantada com a vitalidade dos bailes tradicionais. Eu guardei todas as anotações daquela época, coisa de 10 anos atrás. Anos e um longa-metragem depois, em 2003, fui convidada pela Oficina Oswald de Andrade - um núcleo de criação e produção cinematográfica paulista - para comandar um curso de desenvolvimento de projetos. Como não sou professora, sugeri que a oficina tratasse do desenvolvimento de um projeto real, o meu. A idéia foi bem acolhida e lá pude investigar com atores, diretores, roteiristas e produtores situações e cenas do universo dos bailes. Um pouco mais tarde, uma dupla de pesquisadores de roteiro - um homem e uma mulher - saíram pelos bailes da cidade em busca de personagens característicos dos salões. Nós, Luiz Bolognesi e eu, jogamos algumas idéias, e recebemos outras de volta, às vezes
surpreendentes. O que me ajudou inclusive a amadurecer o conceito do filme. Fomos experimentando. Isto permitiu que o roteiro fosse inspirado em personagens reais, mas completamente transformado por outras histórias que queríamos tratar. No início das filmagens, quando o roteiro já estava pronto, pude testar - com o elenco oriundo dos bailes - a verossimilhança dos personagens. Estes dançarinos foram selecionados por uma equipe de pesquisadores de elenco que percorreram os salões em busca de “pés de valsa” e tipos físicos representativos da mescla dos bailes.
Como foi trabalhar com um elenco que mistura nomes históricos e novas estrelas?
Foi muito prazeroso, além de ser uma honra propiciar para parte do público a redescoberta de grandes atores. Todos atenderam ao convite com entusiasmo e se mostraram completamente disponíveis. Fizemos cerca de um mês de ensaios com o elenco principal e o de apoio. Lançamos mão de diferentes trabalhos e tratamentos, o que se mostrou adequado. Com a Tônia Carreiro e o Leonardo Villar fizemos várias leituras de roteiro. Com o Stepan Nercessian e a Cássia Kiss fomos a alguns bailes, para observar os dançarinos. Com o Paulo Vilhena e a Maria Flor houve mais espaço para experimentação e improviso. Foi um processo muito instigante.
E a convivência com os freqüentadores dos salões que participaram do filme?
Foi sensacional. Trabalhamos com 150 pessoas que fizeram não apenas figuração. Nós o definimos como elenco de apoio porque eles foram essenciais para conferir ao filme a áurea e a alma dos salões de baile. Eles dançaram durante toda a filmagem, sem ler roteiro, se dedicando exclusivamente a bailar. Vestiram as próprias roupas que costumam usar nos salões. Demonstraram uma vitalidade impressionante. Durante as cinco semanas e meia de filmagem, dançaram das 8 da manhã às 6 da tarde, de terça a domingo. E muitos deles ainda tinham fôlego para ir para os bailes de noite. Meu receio, antes de rodarmos, era que o pessoal se cansasse e fosse embora - e aconteceu o contrário. Chamo a atenção para o fato de na maior parte do tempo eles tinham de dançar sem música. Ninguém queria filmar cenas em que os personagens iam embora do baile. Atentos às exigências de continuidade, eles temiam ser descartados caso participassem dessas despedidas ocorridas na ficção. Estou certa de que gostaram muito do trabalho. A produção do filme alugou algumas casas em volta do União Fraterna para servir de infra-estrutura para o elenco de apoio. Eles viviam tocando violão e fazendo festas. Foi uma diversão à parte.
Que desafios de produção o filme apresentou?
Foram vários, de verdade. Tive uma crise no começo da filmagem. Eu tinha de decidir onde deveria estar a câmara, como iríamos filmar. Estabelecíamos, a produção e eu, uma limitação de espaço no salão onde se desenrolariam determinadas cenas. Algo como um quarto do espaço. No resto, se postava a equipe técnica. Ao mesmo tempo, pedia ao Walter Carvalho - o diretor de fotografia que fez, ele próprio, a câmera do filme - que improvisasse. O resultado é que o Walter fazia um movimento de 360 graus, e agente ficava desesperado, porque o salão inteiro não estava preparado para ser filmado. Tive uma crise porque não sabia como iria filmar. O Walter me disse que a gente tinha de ir fazendo, improvisando. Que a gente descobriria o filme depois da primeira semana. Foi o que aconteceu, mas não sem que modificássemos o planejamento. Decidimos aumentar significativamente o número de integrantes do elenco de apoio, para que o salão sempre estivesse cheio. Já na montagem, tive uma segunda crise. Apesar de contente com o resultado das filmagens, não tinha certeza se havíamos conseguido manter uma linha narrativa consistente. Mais uma vez temi não ter o filme. O montador Paulo Sacramento fez um gráfico com os 18 personagens principais. Analisamos a participação de cada um. Cruelmente cortamos partes que gostávamos muito. Ao mesmo tempo recorri às minhas primeiras anotações, que tinham o frescor dos sentimentos da primeira impressão, sempre forte. Assim, retomamos, mais uma vez o caminho do filme. Também os obstáculos na preparação da dança eram imensos. Pedi ao J. C. Violla que – além de treinar os bailarinos para dançar sem música - não coreografasse os passos, para que fosse capturada a naturalidade dos bailarinos. Por outro lado, tínhamos de manter o controle das ações no salão, o conjunto e a harmonia. Isso sem falar na parte musical. O BiD, o nosso produtor musical, ficou encarregado pela trilha e pela direção da banda, que de verdade não tocava. Os músicos que gravaram as canções no estúdio não são os mesmos que aparecem no filme. Ainda enfrentamos uma questão de agenda, que nos obrigou a filmar em cinco semanas e meia, menos tempo do que prevíamos e podíamos. O problema é que havia um casamento marcado no União Fraterna, mas isso eu deixo para a produção contar.
O projeto também continha fatores vantajosos?
Sim. Nós filmamos em ordem cronológica, o que é o sonho de todo diretor. Geralmente as exigências logísticas e de produção não permitem isso. No nosso caso era o contrário, era a única opção. Para se ter uma idéia do que isso significa, nós alugamos um imenso aparato de luz para simular as cenas diurnas nas primeiras duas semanas, período em que filmamos o começo do longa. Depois disso, não tinha mais jeito de se rodar a primeira parte. A produção cronológica gerou muitas outras vantagens importantes. A fotografia e a preparação de elenco se beneficiaram deste fator. Também é interessante notar que o “Chega de Saudade” é um ciclo. Na história, o que indica o começo, o meio e o fim é o tempo do relógio. Tanto que o ensaio geral que fizemos foi corrido, como se fosse uma peça de teatro. Sempre trabalhamos com o universo de quatro horas de um baile. No roteiro, para facilitar o trabalho, o Luiz colocou o horário fílmico, para gente saber que horas a ação se desenrolava.
A questão do envelhecimento se faz presente em “Chega de Saudade”. Qual é a relevância dela no filme?
Foi aí que você notou um mundo pródigo em personagens?
Pois é, este universo extremamente rico me deu a oportunidade de rodar numa locação-personagem, e fazer um filme de personagens. Eu tinha o desejo de filmar num ambiente que de tão característico é parte integrante, e talvez principal, dos acontecimentos. E que é determinante para o desenho das demais personagens.
Este é um tipo de cinema que me emociona pela sutiliza, como, por exemplo, são os filmes da diretora e atriz francesa Agnes Jaoui. Refiro-me a “O Gosto dos Outros” e “O Gato Sumiu”. O primeiro tem vários personagens muito humanos e bem definidos cujas histórias se entrecruzam. O segundo tem Paris - não a do cartão postal - como locação-personagem. Procurei usar estes dois tipos de abordagem no “Chega de Saudade”.
Como foi o processo criativo do filme?
A idéia veio quando fui pela primeira vez ao Cartola Clube, em São Paulo, e fiquei encantada com a vitalidade dos bailes tradicionais. Eu guardei todas as anotações daquela época, coisa de 10 anos atrás. Anos e um longa-metragem depois, em 2003, fui convidada pela Oficina Oswald de Andrade - um núcleo de criação e produção cinematográfica paulista - para comandar um curso de desenvolvimento de projetos. Como não sou professora, sugeri que a oficina tratasse do desenvolvimento de um projeto real, o meu. A idéia foi bem acolhida e lá pude investigar com atores, diretores, roteiristas e produtores situações e cenas do universo dos bailes. Um pouco mais tarde, uma dupla de pesquisadores de roteiro - um homem e uma mulher - saíram pelos bailes da cidade em busca de personagens característicos dos salões. Nós, Luiz Bolognesi e eu, jogamos algumas idéias, e recebemos outras de volta, às vezes
surpreendentes. O que me ajudou inclusive a amadurecer o conceito do filme. Fomos experimentando. Isto permitiu que o roteiro fosse inspirado em personagens reais, mas completamente transformado por outras histórias que queríamos tratar. No início das filmagens, quando o roteiro já estava pronto, pude testar - com o elenco oriundo dos bailes - a verossimilhança dos personagens. Estes dançarinos foram selecionados por uma equipe de pesquisadores de elenco que percorreram os salões em busca de “pés de valsa” e tipos físicos representativos da mescla dos bailes.
Como foi trabalhar com um elenco que mistura nomes históricos e novas estrelas?
Foi muito prazeroso, além de ser uma honra propiciar para parte do público a redescoberta de grandes atores. Todos atenderam ao convite com entusiasmo e se mostraram completamente disponíveis. Fizemos cerca de um mês de ensaios com o elenco principal e o de apoio. Lançamos mão de diferentes trabalhos e tratamentos, o que se mostrou adequado. Com a Tônia Carreiro e o Leonardo Villar fizemos várias leituras de roteiro. Com o Stepan Nercessian e a Cássia Kiss fomos a alguns bailes, para observar os dançarinos. Com o Paulo Vilhena e a Maria Flor houve mais espaço para experimentação e improviso. Foi um processo muito instigante.
E a convivência com os freqüentadores dos salões que participaram do filme?
Foi sensacional. Trabalhamos com 150 pessoas que fizeram não apenas figuração. Nós o definimos como elenco de apoio porque eles foram essenciais para conferir ao filme a áurea e a alma dos salões de baile. Eles dançaram durante toda a filmagem, sem ler roteiro, se dedicando exclusivamente a bailar. Vestiram as próprias roupas que costumam usar nos salões. Demonstraram uma vitalidade impressionante. Durante as cinco semanas e meia de filmagem, dançaram das 8 da manhã às 6 da tarde, de terça a domingo. E muitos deles ainda tinham fôlego para ir para os bailes de noite. Meu receio, antes de rodarmos, era que o pessoal se cansasse e fosse embora - e aconteceu o contrário. Chamo a atenção para o fato de na maior parte do tempo eles tinham de dançar sem música. Ninguém queria filmar cenas em que os personagens iam embora do baile. Atentos às exigências de continuidade, eles temiam ser descartados caso participassem dessas despedidas ocorridas na ficção. Estou certa de que gostaram muito do trabalho. A produção do filme alugou algumas casas em volta do União Fraterna para servir de infra-estrutura para o elenco de apoio. Eles viviam tocando violão e fazendo festas. Foi uma diversão à parte.
Que desafios de produção o filme apresentou?
Foram vários, de verdade. Tive uma crise no começo da filmagem. Eu tinha de decidir onde deveria estar a câmara, como iríamos filmar. Estabelecíamos, a produção e eu, uma limitação de espaço no salão onde se desenrolariam determinadas cenas. Algo como um quarto do espaço. No resto, se postava a equipe técnica. Ao mesmo tempo, pedia ao Walter Carvalho - o diretor de fotografia que fez, ele próprio, a câmera do filme - que improvisasse. O resultado é que o Walter fazia um movimento de 360 graus, e agente ficava desesperado, porque o salão inteiro não estava preparado para ser filmado. Tive uma crise porque não sabia como iria filmar. O Walter me disse que a gente tinha de ir fazendo, improvisando. Que a gente descobriria o filme depois da primeira semana. Foi o que aconteceu, mas não sem que modificássemos o planejamento. Decidimos aumentar significativamente o número de integrantes do elenco de apoio, para que o salão sempre estivesse cheio. Já na montagem, tive uma segunda crise. Apesar de contente com o resultado das filmagens, não tinha certeza se havíamos conseguido manter uma linha narrativa consistente. Mais uma vez temi não ter o filme. O montador Paulo Sacramento fez um gráfico com os 18 personagens principais. Analisamos a participação de cada um. Cruelmente cortamos partes que gostávamos muito. Ao mesmo tempo recorri às minhas primeiras anotações, que tinham o frescor dos sentimentos da primeira impressão, sempre forte. Assim, retomamos, mais uma vez o caminho do filme. Também os obstáculos na preparação da dança eram imensos. Pedi ao J. C. Violla que – além de treinar os bailarinos para dançar sem música - não coreografasse os passos, para que fosse capturada a naturalidade dos bailarinos. Por outro lado, tínhamos de manter o controle das ações no salão, o conjunto e a harmonia. Isso sem falar na parte musical. O BiD, o nosso produtor musical, ficou encarregado pela trilha e pela direção da banda, que de verdade não tocava. Os músicos que gravaram as canções no estúdio não são os mesmos que aparecem no filme. Ainda enfrentamos uma questão de agenda, que nos obrigou a filmar em cinco semanas e meia, menos tempo do que prevíamos e podíamos. O problema é que havia um casamento marcado no União Fraterna, mas isso eu deixo para a produção contar.
O projeto também continha fatores vantajosos?
Sim. Nós filmamos em ordem cronológica, o que é o sonho de todo diretor. Geralmente as exigências logísticas e de produção não permitem isso. No nosso caso era o contrário, era a única opção. Para se ter uma idéia do que isso significa, nós alugamos um imenso aparato de luz para simular as cenas diurnas nas primeiras duas semanas, período em que filmamos o começo do longa. Depois disso, não tinha mais jeito de se rodar a primeira parte. A produção cronológica gerou muitas outras vantagens importantes. A fotografia e a preparação de elenco se beneficiaram deste fator. Também é interessante notar que o “Chega de Saudade” é um ciclo. Na história, o que indica o começo, o meio e o fim é o tempo do relógio. Tanto que o ensaio geral que fizemos foi corrido, como se fosse uma peça de teatro. Sempre trabalhamos com o universo de quatro horas de um baile. No roteiro, para facilitar o trabalho, o Luiz colocou o horário fílmico, para gente saber que horas a ação se desenrolava.
A questão do envelhecimento se faz presente em “Chega de Saudade”. Qual é a relevância dela no filme?
Este foi um assunto importante para a gente. Tanto que fiz questão de mostrar as rugas dos personagens no filme. Mostramos uma beleza com rugas. Sob este aspecto, Chega de Saudade foi influenciado pelo livro “A Velhice”, de Simone de Beauvoir. Ambas as obras contém o conceito de que a idéia de velho geralmente vem do outro, e não do próprio indivíduo. Claro que você sente os fatores do tempo no seu corpo, mas é a percepção externa que faz nos sentirmos velhos. Os personagens do filme não se entregam fácil. Eles se mantêm em movimento e fiéis aos seus desejos. Não perdem de vista a busca do prazer, sem ignorar a passagem do tempo.
(Material contido no press book distribuído pela Buena Vista International, através de Selma Santos Produções & Eventos)
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