O poeta e acadêmico feirense Dival Pitombo, em 1978
em mais um aniversário desta terra de Padre Ovídio de São Boaventura, brindou
os leitores do tradicional jornal "A Tarde", lembrando os “Velhos tempos, belos
dias” da Feira de Santana, que vale a pena ver de novo. (Adilson Simas)
*
- Velhos tempos, belos dias. Assim como na canção.
Um povo sem memória é como um edifício sem alicerce. É inconsistente. Quem considera morto o passado, está pisando em areia movediça. "O passado já passou" é simplesmente imagem literária ou frase feita de música popular.
Um povo sem memória é como um edifício sem alicerce. É inconsistente. Quem considera morto o passado, está pisando em areia movediça. "O passado já passou" é simplesmente imagem literária ou frase feita de música popular.
Na história, como na vida de cada indivíduo, o
passado tem a força motriz que alimenta o presente. É como o ninho que abriga e
protege a águia, antes de aprender a dominar as alturas. Apenas no plano
temporal o passado nos parece vencido. Em verdade ele continua atuante dentro
de nós.
Ninguém consegue matar o passado dentro de si. Nem os povos, nem os homens.
Ninguém consegue matar o passado dentro de si. Nem os povos, nem os homens.
A Feira de Santana de hoje oferece motivos de
orgulho. Mas como esquecer os doces dias, em que a cidade adolescente guardava
ainda a pureza absoluta das coisas realmente simples?
Dos tempos em que o acontecimento mais importante
era a festa da Padroeira, para a qual se trabalhava o ano inteiro?
Os visitantes ainda não se chamavam turistas. E eram geralmente pessoas ligadas a terra por laços de família ou amizade. Durante a festa, a cidade se enchia deles. Não havia colégios secundários e os estudantes os cursavam na capital. As férias traziam-nos de volta. Com amigos, parentes, familiares que se engrossavam a população e faziam a alegria da temporada.
Os visitantes ainda não se chamavam turistas. E eram geralmente pessoas ligadas a terra por laços de família ou amizade. Durante a festa, a cidade se enchia deles. Não havia colégios secundários e os estudantes os cursavam na capital. As férias traziam-nos de volta. Com amigos, parentes, familiares que se engrossavam a população e faziam a alegria da temporada.
As novenas imponentes e frequentadas pela fina flor
da sociedade, reuniam as mais importantes famílias, que disputavam entre si a
primazia da decoração da igreja e os lances mais altos nos leilões que se
seguiam, no largo, após o ato religioso.
As tocatas e os fogos de artifício coroavam a noite
num esplendor inesquecível. Em volta do coreto o solo ficava fofo de confetes.
E as longas fitas coloridas das serpentinas cruzavam o céu, tecendo arabescos,
enquanto a juventude girava na praça, dançava formava grupos, ou namorava
envolvida pela névoa dos lança-perfumes que ainda não eram usados como
entorpecentes.
Como não havia boates, os jovens costumavam
organizar festinhas em casas de famílias. Para isto cortejavam-se para pagar a
orquestra e iniciavam a invasão, muitas vezes sem conhecimento prévio do dono
da casa. Chamavam "assustados" ou "festa de comissão". Denominação
oriunda do fato de serem organizadas por uma comissão, que se encarregava de
contratar os músicos e tomar outras providências.
Oscar Marques e Álvaro Carvalho eram os melhores
organizadores de tais festas. Dançarinos exímios eram também eficientes
cobradores da cota dos festivos companheiros.
Para isso realizavam operações incríveis, pois a
turma, depois de iniciada a festa, faziam as mais audaciosas acrobacias para
não pagar. Isto exigia uma estratégia especial dos cobradores que acabavam por
atacar o sujeito, no meio do salão, embalado no som, em companhia da
namorada.
Aí não tinha jeito. Tinha que pagar mesmo. Ainda assim, no final da festa, havia sempre uma queixa inevitável dos promotores: - Tomei uma ronca. Ronca era o prejuízo deixado no fim das contas.
Aí não tinha jeito. Tinha que pagar mesmo. Ainda assim, no final da festa, havia sempre uma queixa inevitável dos promotores: - Tomei uma ronca. Ronca era o prejuízo deixado no fim das contas.
Cícero Carvalho, Isaac Machado, Chico Sampaio,
Chico Barriga Azul, Mário Azevedo, Mário Santos Silva, Valdy Pitombo, Tatá,
Eduardo e Vavá Mota, Zé Brito e João José de Souza, constituíam o grupo dos
mais afamados "pés de valsa". Todos com certificado de um vasto tirocínio
no roteiro boêmio da velha Salvador, roteiro famoso que ia do Cassino Tabaris à
Pensão Americana e ao Cabaré de Zazá.
Perito no tango e no "blue", Valdir Pitombo
disparava para a pista na preocupação de garantir a dama, mal a orquestra
ensaiava o primeiro acorde. Costume que foi moderando, quando descobriu que
Cícero Carvalho o marcava sistematicamente com um olho mal intencionado.
Como as festinhas terminavam sempre à meia noite, a
maioria desses dançarinos, completava a noitada em outro local mais
distante e mais discreto, para os lados da Bacatela, frequentados por senhoras
de maior responsabilidade: - a Pensão de Petu.
O "footing" no mercado, nos dias de segunda-feira,
era outro ponto de encontro da "jeunesse doré" (hoje guarda jovem) daquela
época.
Quem conheceu a feira-livre, em seus últimos
tempos, não tem ideia de como se processava esse "footing". Não
exista aquela confusão dos diabos em que se transformou mais tarde. Era
disciplinada por uma organização modelar. Havia as simétricas e paralelas, onde
se distribuíam as mercadorias à venda.
No centro situava-se a ala dos sapateiros. Aí é que
a estudantada marcava encontro com as normalistas. Era uma festa semanal. O
passeio ao longo da pista prolongava-se por toda manhã de segunda-feira. Havia
mão e contra-mão. Namoros faziam-se e desfaziam-se naquela passarela "sui-generis" que a juventude dourava com o sol da sua alegria.
Ah! Onde está a floração daquele jardim?
Onde estão Julieta e Dedé Gonçalves?
Onde estão Jacy e Miriinha Assis? Silvia, Laurinha Martins, Matildes e Ernestina. Bernardete, Edelweiss, Bisa Dórea, Didira e Baby, Julieta Alencar, Aurora e Maria Madalena?
Onde estão todas elas?
Onde estão Julieta e Dedé Gonçalves?
Onde estão Jacy e Miriinha Assis? Silvia, Laurinha Martins, Matildes e Ernestina. Bernardete, Edelweiss, Bisa Dórea, Didira e Baby, Julieta Alencar, Aurora e Maria Madalena?
Onde estão todas elas?
A vida levou algumas para longes terras. E outras
já transpuseram as fronteiras do grande mistério.
Como era alegra a juventude do meu tempo!...
Como era alegra a juventude do meu tempo!...
Fonte: Adilson Simas
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