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segunda-feira, 29 de junho de 2009

"No país dos suspensórios"

Artigo de Ferreira Gullar, na "Folha de S. Paulo":
Pergunto: pode continuar fazendo leis quem não as respeita? Lei é para os outros...

Um número considerável de bandidos presos recentemente (por assalto a banco, sequestro, latrocínio) estava em ação ou por efeito de progressão da pena ou de prisão albergue ("trabalham" de dia e voltam para dormir na prisão) ou estavam em liberdade graças a habeas corpus, isto é, por decisão de algum juiz. A última notícia é que Elias Maluco, o assassino do jornalista Tim Lopes, em breve ganhará as ruas valendo-se da decisão do Supremo que concedeu o benefício de progressão da pena aos autores de crimes hediondos. Por isso é que muitos policiais dizem que a tarefa arriscada, que cumprem, de prender bandidos, equivale a enxugar gelo.
Enquanto o deputado Paulo Maluf apresenta, na Câmara, um projeto para intimidar os membros do Ministério Público, outros deputados governistas procuram impedir que o TCU intervenha na execução de obras públicas fraudadas. É que ainda há pouca corrupção no país.
Dezoito deputados estaduais do Paraná tiveram a carteira de motorista cassada pelo Detran, tantas foram as transgressões que cometeram. Carli Filho, como se vê, é apenas um exemplo entre muitos. Então, pergunto: pode continuar fazendo leis quem não as respeita? Sabe-se agora que o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, também do Paraná, teve sua carteira cassada por excesso de multas. Lei é para os outros...
Para o governo, praticamente não há inflação mas, segundo a Maria, minha secretária, o leite longa vida subiu de R$ 1,70 para R$ 2,80 ou R$ 3; o leite em pó, de R$ 4,50 para R$ 5,40 ou R$ 6,20; o açúcar, de R$ 0,80 para R$ 2,50; o tomate, R$ 1,50 para R$ 2,80 ou R$ 3. Isso me lembra uma época distante, quando os índices de inflação divulgados pelo governo eram sempre mais baixos que a inflação real; é que, para calculá-los, incluía o preço dos suspensórios e de outros artigos que já quase ninguém comprava. Quais serão os suspensórios de hoje, não sei, mas que entram nos cálculos da inflação não tenho dúvida.
Com apoio do Ministério da Igualdade Racial, transita no Congresso um projeto de lei que obriga a contratação de 10 por cento de negros como modelos dos desfiles de moda e de atores nos filmes de publicidade. E os índios, não têm direito a cota? A impressão que dá é de que os defensores da igualdade racial estão tratando os índios de modo desigual.
Raramente se vê a CUT - tão atuante antes do governo Lula - vir à rua para protestar contra algo, a não ser quando sente seus privilégios ameaçados, como no caso da proposta de revogação do Imposto Sindical. E não é que, outro dia, mobilizou seu pessoal para protestar contra a criação da CPI da Petrobras? A rigor, o que a CUT tem a ver com isso? Aliás, por que tanto medo de uma CPI, cuja presidência e relatoria são do governo, que detém, na proporção de oito por três, a maioria de seus membros? Mas não é só a CUT. O próprio governo quer impedir de todos os modos que essa CPI funcione. Ou muito me engano, ou alguma coisa extremamente grave se oculta detrás de tanto temor.
Ultimamente, nos tribunais, réus, livres de algemas, avançam sobre os juízes para agredi-los. É que o STF proibiu algemá-los. Justiça avançada, essa nossa!
Cismado que sou com o mal uso do nosso idioma, gostei de ouvir, por duas vezes um locutor de televisão dizer que alguém, acidentado, "não corre risco de vida", em vez de "não corre risco de morte", expressão forjada por algum redator obtuso. Naquela noite, fui dormir aliviado.
Para a alegria da torcida, o árbitro que apitou o jogo Brasil X Egito marcou pênalti a nosso favor, aos 45 minutos do segundo tempo e, assim, vencemos a nossa primeira disputa na Copa das Confederações. Ele não viu que a bola fora defendida com o braço por um jogador egípcio. O jogo teria, portando, terminado injustamente empate, não fora alguém o ter informado pelo ponto eletrônico. A tecnologia salvou o espetáculo. Não dá para entender por que a Fifa não adota recursos tecnológicos para evitar erros graves na arbitragem, como já fazem outros esportes?
Em mais um desastrado pronunciamento, Lula opinou contra os que, no Irã, acusam de fraudada a vitória de Ahmadinejad. Afirmou que, como no futebol, aquilo era choro de derrotado. A verdade é que as manifestações continuaram. Custa crer que tanta gente insista em enfrentar a brutalidade da repressão policial, sem ter sérias razões para isso. Muitos governos democráticos condenaram a repressão, que prendeu e matou manifestantes. Obama disse ter dúvidas quanto à lisura do pleito. Lula, não, está com Ahmadinejad e não abre.

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