Reportagem publicada em 1966 retratou a feira como uma das mais tradicionais da América do Sul
Um retrato da Princesa do Sertão no século passado
O comércio de gado de Feira de Santana ganhou projeção internacional em 1966, quando foi tema de reportagem do jornal norte-americano "The New York Times", considerado o mais influente do mundo. O repórter Allen Yung esteve na cidade e acompanhou de perto o movimento no Campo do Gado, espaço que funcionava onde hoje estão o Museu de Arte Contemporânea Raimundo de Oliveira, o Fórum Desembargador Filinto Bastos, o Colégio Municipal e a Praça João Barbosa de Carvalho.
Na edição dominical de 26 de junho daquele ano, o jornal publicou a matéria intitulada "When it's roundup time way down in Brazil". O texto descreveu com riqueza de detalhes a rotina da feira realizada às segundas-feiras, a movimentação dos vaqueiros, os trajes de couro usados por homens e cavalos e a atmosfera festiva que tomava conta da cidade.
A feira como motor da economia local
A reportagem também ressaltou a importância econômica da feira para Feira de Santana, então com o comércio ainda concentrado em poucas ruas e sem a estrutura industrial que viria anos depois. O gado era a grande fonte de renda, sustentando a economia local e projetando o município como polo regional.
Quase 60 anos depois, o registro do "The New York Times" segue como um documento valioso, que mostra ao mundo a força das tradições sertanejase o papel de Feira de Santana como a chamada Princesa do Sertão.
Confira o texto traduzido:
The New York Times, domingo 26 de junho de 1966
Quando chega hora de reunir o gado no Brasil
Por Allen Yung
Feira de Santana, Brasil - Todas as segundas-feiras, uma das feiras de gado mais antigas e tradicionais da América do Sul ocorre no limite desta pequena cidade do Estado da Bahia. Uma visita pode ser um dos pontos altos de uma viagem pelo interior brasileiro.
Feira de Santana está situada a 70 milhas [112 quilômetros] a noroeste de Salvador, a capital do Estado da Bahia, e é facilmente acessível por ônibus. Os ônibus saem de Salvador a cada meia hora, e a tarifa de ida e volta é de apenas 80 centavos [de dólar].
No início da manhã de uma segunda-feira típica, 'cowboys’ a cavalo levam seus rebanhos para o 'cattle grounds', ou 'campo do gado', como são chamados em português.Cerca de 1.000 cabeças de gado são reunidas para serem comercializados nos ensolarados currais de madeira. No local, um intenso intercâmbio sobre negócios entre os fazendeiros que compram e os que vendem, inclusive novilhos.
O curral
A cavalo nas cercas do curral, fazendeiros conversam não apenas sobre a qualidade dos animais e o preço da carne, mas também sobre o clima, a política, o dia a dia e qualquer outro assunto que possa ser de interesse.
Às vezes, um animal consegue escapar. São momentos emocionantes para os presentes. Os 'cowboys', usando paus e chicotes, se esforçam em capturar o bicho. Uma festa para os espectadores que se deleitam em zombar do animal assustado e incentivar os 'cowboys' sentados nas cercas do curral, para que entrem na caçada.
Para os visitantes, é interessante observar os trajes utilizados. Os 'cowboys' brasileiros, chamados de 'vaqueiros', usam roupas rústicas de couro projetadas para protegê-los contra o mato espinhoso que domina o campo. O traje inclui sandálias de couro pesado, um colete de couro revestido de pele e um chapéu de couro sem forma.
Os cavalos também têm protetores de couro para cabeças e corpos. Todos os os equipamentos de equitação, tais como rédeas e selos são artefatos de couro. Estes são geralmente feitos à mão e estão à venda [para qualquer pessoa].
Os visitantes perceberão que esses artesanatos são interessantes para decoração. A negociação é uma parte essencial do mercado, com preço originalmente muito maior, mas que pode cair com acordo [choro/pechincha] entre o cliente e o comerciante.
As raças de gado encontradas são outro item de interesse. O mais curioso de muitas variedades diferentes da região é o 'Zebu de joelhos duplos', que originalmente foi levado da Índia para o Brasil.
O matadouro
É aqui que cerca de 50 cabeças de gado, diariamente, são trazidas de dois em dois, ou em três, para serem abatidos. Os novilhos são conduzidos por caminho pequeno e estreito. Lá, um homem, armado com uma faca simples, monta a cerca e mergulha a lâmina de 10 polegadas no pescoço do boi, diretamente atrás da cabeça. Em segundos o animal está morto. Em poucos minutos a carcaça é arrastada pelo chão para ser cortada.
Em cerca de dez minutos, dois homens removem o couro com cuidado para mantê-lo em uma peça e, dentro de uma meia hora, o novilho é transformado em dois lados de carne comercializável.
Feira de Santana existe quase que exclusivamente por causa desta feira de gado.
Mas há outros mercados menores em que o turista pode visitar. Exemplo são as comidas típicas, vestimentas e itens domésticos.
Everaldo Goes / Feira Hoje
https://feirahoje.com.br/
Matéria publicada originalmente em outubro de 2017 na Edição Especial Impressa do Feira Hoje.
Acesse também @feirahoje


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