Por Reinaldo Azevedo
O governo Obama espionou jornalistas e pôs o Fisco no encalço da
direita republicana. Na luta contra o terror, ainda na gestão de George W.
Bush, teve inicio um amplo programa de monitoramento de ligações telefônicas.
Obama herdou o programa, é verdade. Decidiu ampliá-lo e o estendeu para os
provedores de Internet. Nunca se chegou tão perto do "Grande Irmão", do livro "1984", de Gerge Orwell, como agora. Nessas horas, é grande a tentação de
decretar o empate e sair por cima, condenando a hipocrisia: nessa perspectiva,
republicanos e democratas criticam uns aos outros por aquilo que todos fazem.
Na gritaria, pois, ninguém teria razão. Será assim mesmo? Não! Assim seria se
não houvesse o regime democrático, as eleições, os compromissos assumidos em
campanha.
George W. Bush respondeu como se viu aos ataques terroristas de
setembro de 2001. Certa ou errada, a guerra ao terror produziu os seus efeitos
também eleitorais. O então presidente foi reeleito em 2004, mas os republicanos
foram postos para fora na eleição de 2008. Obama ganhou nas urnas um
segundo mandato. Parcela dos eleitores americanos - e da opinião pública
mundial, é bom destacar - pode odiar os republicanos, considerar que Bush era
um reacionário insuportável, um, como é mesmo?, "partidário do unilateralismo" (vão escolhendo aí as ofensas…), o diabo a quatro. De uma coisa, no entanto, o
ex-presidente americano não podia ser acusado: hipocrisia. Disso, não! Nem ele
nem o Partido Republicano. Jamais esconderam o que pensavam e as opções que
haviam feito na chamada "guerra ao terror".
Mas e Barack Obama? Ah, aí a coisa é muito diferente. Não há mero
empate entre Bush e Obama porque este foi eleito com o compromisso de mudar a
política daquele - e com especial ênfase nessa área dos chamados "direitos
civis", que estariam sendo agredidos em nome do combate ao terror. Quando o
monitoramento começou, houve uma primeira grita, que, pessoalmente, considerei
exagerada - E ESCREVI ISSO NO SITE PRIMEIRA LEITURA. Há leitores que me
acompanham desde lá e sabem disso. É bem verdade que entendia, como entendo,
que as escutas tem de ser dirigidas, monitoradas por um comitê independente, de
sorte que sejam motivadas e justificadas. Em tempos de guerra e de combate ao
terror, programas assim são necessários. É chato, é perigoso, mas não há outro
jeito.
Ocorre que, ficamos sabendo agora, a gestão Obama decidiu usar a
licença que tinha para combater o terror para espionar quem lhe desse na telha.
Fica visível que não há critério nenhum. Todos estão na rede, e o governo pode,
a qualquer momento, selecionar o que deseja, a depender sabe-se lá de qual
necessidade. QUE ESTE É UM GOVERNO QUE PODE MOBILIZAR O ESTADO CONTRA, POR
EXEMPLO, ADVERSÁRIOS POLÍTICOS, ISSO JÁ SABEMOS, OS FATOS JÁ O COMPROVAM.
Obama faturou a eleição desmoralizando, de todas as formas, a
gestão de seu antecessor. A sua primeira campanha, como todos se lembram,
ganhou ares de defesa dos direitos civis. E, no entanto, o que se tem é isto:
um monitoramento das comunicações como nunca se viu, jornalistas espionados e
adversários do governo perseguidos por órgãos de Estado. Não obstante, aqui e
ali, ouvimos um muxoxo: "Ah, são todos iguais mesmo!" Parece desculpa de
mensaleiro: "A gente fez o que todo mundo faz". Ou ainda: "Aprendemos a fazer
isso com o PSDB…" Pouco importa o idioma, toda esse gente fala a língua franca
da vigarice.
Não, não! Sabem por que, nesse particular - e em muitos outros,
como já escrevi algumas vezes -, Obama é pior do que Bush, não havendo empate
nenhum? Porque o atual presidente dos EUA só está lá por ter prometido a
mudança; porque satanizou o outro por conta de programas de monitoramento;
porque disse que tudo seria diferente. O RESULTADO DAS URNAS OBRIGAVA OBAMA
MORALMENTE A MUDAR O PROGRAMA, A TORNÁ-LO AINDA MAIS RESTRITO. Em vez disso,
ele o expandiu e o ampliou para outras áreas das comunicação. É um vexame sem
tamanho!
A grita, obviamente, só não é maior porque, afinal de contas, o
democrata ainda é um "aliado" de poderosos lobbies politicamente corretos que
atuam na imprensa, nas entidades não-governamentais, nas redes sociais. Também
nos EUA há a má-consciência de esquerda, nossa velha conhecida (ainda que seja
a esquerda lá deles), a lhes dizer que, no fundo, tudo lhes é permitido porque
têm bons propósitos. Malvados são os outros.
Obama está apenas no primeiro ano de seu segundo mandato. Nessa
toada, e escrevi isso aqui quando estourou o caso da espionagem contra
jornalistas, deixou de ser uma hipótese amalucada a chance de que não termine o
mandato. A perseguição empreendida pelo Fisco a grupos de oposição, sozinha, já
é causa de impeachment. Conseguirá se recuperar nos três anos e meio que tem
pela frente? Vamos ver. Por enquanto, as coisas só pioram porque o verdadeiro
Obama - não o demiurgo inventado pelos deslumbrados - se revela.
Não! Não há empate nenhum! Obama venceu por larga margem o
adversário Bush no quesito hipocrisia, bravata e autoritarismo. O republicano
pôs o estado no encalço do terror e avisou: muitos americanos passarão a ser
monitorados. O jogo era explícito. O democrata prometeu acabar com isso, mas
universalizou a espionagem e não avisou ninguém.
Sob certo ponto de vista, poder-se-ia até dizer, com algum
exagero, que Bush recorreu a medidas autoritárias para combater o terror. Obama
fez outra coisa: recorreu ao estado policial para fazer política - muito
especialmente contra adversários ideológicos internos. Como evidencia o
arquivo deste blog, posso estar estupefato pela ousadia, mas não surpreso. Que
ironia! Em muitos aspectos, Obama é a primeira grande cria política da
Internet. E ele resolveu usar essa mesma Internet para exercitar o velho vício
do mando.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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