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sábado, 31 de maio de 2014

Novo Código Comercial e sua influência no agronegócio

Por Daniele Barreto
Tramita no Congresso Nacional o projeto do Novo Código Comercial, o PL 1.572/2011, de autoria do deputado Vicente Cândido (PT-SP), que traz mudanças conceituais e práticas que disciplinarão o dia-a-dia das empresas. Já atrasada - pois na medida em que se industrializa, o Brasil fica para traz do ponto de vista do ordenamento jurídico -, a aprovação do Código lançará luz e regras no mundo empresarial. 
Arcabouço jurídico
O atual Código Comercial é de 1850, herança do império. Aprovado em junho do citado ano, regia as relações empresariais em um país latifundiário e cujo contexto comercial nada lembra as recentes inovações tecnológicas e a realidade social, econômica e ambiental do Brasil.
Vale ressaltar que tal norma sofreu inúmeras alterações no decorrer dos anos (numa vã tentativa de acompanhar a realidade) e, do original do século XIX, apenas temos a disciplina do Direito Marítimo. Todo o resto foi revogado em janeiro de 2003, quando entrou em vigor o Código Civil (CC) que trouxe um Livro tratando do Direito Empresarial. Ainda assim, mesmo com a recente mudança, não entendemos que a legislação contemple satisfatoriamente o peculiar setor.
Novo Código Comercial X Código Civil
Sendo aprovado o Projeto de Lei 1.572/2011, os artigos do CC que tratam do Direito das Empresas serão revogados, valendo a normatização nova.
Esse descarte de parte do Código Civil (que conta com pouco mais de 10 anos) e a profunda mudança na legislação não têm sido unânime na comunidade jurídica.
Enquanto o professor Carlos Joaquim de Oliveira Franco entende que o Código Civil ainda não foi bem absorvido pela população e que um novo Código Comercial geraria ainda mais problemas no setor, o autor da minuta do projeto (o professor Fábio Ulhoa, referência em Direito Comercial) argumenta que a economia brasileira mudou nos últimos tempos e as relações empresariais precisam ser desburocratizadas, através da adaptação nas leis e na condução das relações entre as empresas – o que tornaria obrigatória a elaboração de uma normatização mais densa e específica (como pretende o PL do Novo Código Comercial).
Segundo os que seguem o primeiro jurista citado, caberia, nesse momento, apenas pequenas mudanças no CC. Quem se filia à vertente de Ulhoa entende que discutir a matéria com profundidade leva, necessariamente, a princípios próprios de um Código Comercial - portanto, apartado na Lei Civil já vigente.
O Agronegócio no Novo Código Comercial
Esse projeto de Novo Código Comercial pretende grande influência no setor do agronegócio. Embora seja essencial ao crescimento do país - uma das maiores potências agropecuárias do mundo -, não há no Brasil uma legislação que discipline e assegure o setor, que tem larga importância, sendo responsável por 23% do PIB Nacional, o equivalente a mais de 1 trilhão.
O autor do Projeto classifica como "absurdo" o produtor rural ainda não ter tratamento de empresário pela legislação pátria, entendendo que o tema - pela importância - deve ser tratado como "questão de Estado". Mais do que uma simples regulamentação do setor, o que se objetiva é a preservação da cadeia produtiva - que se estende a indústria e comércio, e não se limita ao setor primário - mediante interferência do estado, inclusive, através do Poder de legislar.
Visando conferir ao setor dimensão jurídica compatível com a sua grandiosidade, em junho de 2012, o deputado federal Arthur Maia apresentou as Emendas nº 33 e nº 34, alusivas ao tema agronegócio, ao PL (o próprio deputado é Presidente da "Comissão Especial destinada a proferir Parecer ao PL nº 1.572 de 2011").
De fato, se afigura inadmissível que o agronegócio - propulsor da riqueza no país - não conte com leis específicas que permitam planejamento estratégico, estabilidade de preços, garantias de comercialização, dentre outras especificações que permitam, inclusive, ao agronegócio se articular com a sociedade e a cadeia produtiva e dialogar com o Judiciário baseado em normas mais compatíveis com a realidade do setor.
Com a inserção das Emendas referidas, Maia intenta reverter esse quadro, acrescentando o livro específico "Do Agronegócio" e colaborando com a busca que o setor trava pela excelência em competitividade.
Já nos primeiros artigos, a Emenda nº 33 conceitua o Agronegócio como "a rede de negócios, contratos e títulos que promovem a integração das atividades econômicas organizadas de fortalecimento de insumos, produção, comercialização, armazenamento, logística e distribuição, para consumo interno e internacional, de bens agrícolas, pecuários, de reflorestamento e pesca". Excepciona-se, por óbvio, a exploração da terra por grupo familiar sem caráter profissional e organizado, ainda que se comercialize o excedente, e atividades de caráter extrativista.
Como norteadora do setor, a Emenda inova trazendo a baila os "princípios do regime jurídico do agronegócio e dos sistemas agroindustriais", tais sendo: função social da cadeia agroindustrial; integração das atividades de cadeia agroindustrial, proteção da cadeia agroindustrial e desenvolvimento agroindustrial sustentável.
No tocante à função social, tão amplamente debatida, preocupou-se em versar sobre a proteção ao meio ambiente e a necessidade de produção de alimentos e bioenergia que se destine ao enfrentamento dos desafios globais de crescimento populacional. Percebemos que a abordagem da Emenda trás um entendimento compatível com a necessidade do Brasil em avançar na regulamentação do setor que mais cresce e destaca o país no internacionalmente, mostrando-se não apenas focada na questão econômico-financeira, mas de responsabilidade social e ambiental – o que compatibiliza a norma com outras regras de meio ambiente e proteção ao cidadão.
Em seguida, a Emenda insere os capítulos "Dos Contratos do Agronegócio" e "Dos Títulos do Agronegócio". Destacamos em ambos a abordagem do agronegócio como uma cadeia concatenada.
São disciplinados quatro contratos específicos: o contrato de monitoramento agroindustrial (tendo por objeto a prestação de serviços de levantamento inicial de lavoura, de reflorestamento ou de cria ou recria de animais e análise econômica agroindustrial); a administração fiduciária de estoques (tem por objeto a gestão de produtos, subprodutos ou resíduos de valor econômico dados em garantia ou entregues pelo produtor ou empresário da agroindústria); o depósito de produtos agropecuários (contrato pelo qual o armazém se obriga a guardar e conservar produtos dos gêneros dos autorizados por sua certificação) e a integração agroindustrial (empresários do agronegócio obrigam-se a conjugar recursos e esforços na exploração de atividade econômica agroindustrial, por meio de um sistema de integração).
Importância da regulamentação do agronegócio pelo Novo Código Comercial
O desempenho do agronegócio impõe que se volte um olhar mais atento ao setor.
Sucesso, inclusive em graves períodos de crise, o processo produtivo do agronegócio brasileiro tem passado por inovações que o ordenamento jurídico pátrio precisa acompanhar… Mas não tem conseguido!
Uma chance que não deve ser desperdiçada pelo Congresso é a aprovação do PL do Novo Código Comercial, visando, acima de tudo, desburocratizar o setor, garantir princípios gerais como a sustentabilidade e primar pela organização em cadeia.
Resta-nos esperar que o PL, como outras iniciativas aspiradas pelo povo brasileiro, não seja esquecido nos gabinetes do Congresso, enquanto os empreendedores do setor arcam com prejuízos repassados ao consumidor e enxergam, ainda que distante, a possibilidade de perda do protagonismo internacional, pela morosidade do Poder Legislativo.
Em sendo aprovado, as mudanças alçarão o Brasil à posição de primeiro país do mundo a reconhecer o agronegócio como uma atividade comercial por meio de um Código e guiarão nossa economia para maiores patamares.
Daniele Barreto é advogada, pós-graduada em Direito do Estado pela Ufba, consultora política credenciada pela Associação Brasileira de Consultores Políticos, colunista e blogger. www.danielebarreto.com.br

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