No "politicamente
correto", usa-se e abusa-se dos eufemismos, trocando-se palavras fortes
por palavras fracas para tornar palatável o que deveria ser rejeitado.
Por Percival Puggina
O famigerado "politicamente
correto" parece nascido nas páginas de 1984, o profético livro de George
Orwell sobre o totalitarismo em expressão máxima. É a própria
"novilíngua", que manipula, suprime ou recompõe vocábulos para
dominar a linguagem e o pensamento. O "politicamente correto" já fez
muito disso e já foi longe demais. Vocábulos triviais foram carimbados como
impróprios e se converteram no que Orwell talvez chamasse de
"impalavras", ou "despalavras". Ao sumirem, por supressões
e patrulhamento, some a ideia que expressam e é restringido o que podemos
pensar.
No "politicamente correto",
usa-se e abusa-se dos eufemismos, trocando-se palavras fortes por palavras
fracas para tornar palatável o que deveria ser rejeitado. Neste último fim de
semana, por exemplo, a edição de ZH estampou matéria cujo título mencionava o
possível fim da "paralisação" dos policiais militares no Espírito
Santo. Paralisação? Mas aquilo não foi um motim? Na Globo News, uma locutora
referia as "eventuais ações" sobre "possíveis crimes"
praticados pelos "grevistas". O próprio presidente da República, em
nota sobre aqueles episódios, pediu o fim da "paralisação". Não fazem
diferente aqueles que falam em "ocupação" sempre que manipulados
baderneiros de esquerda metem o pé e entram porta ou vidraça adentro em alguma
propriedade pública ou privada. Ora, só se pode ocupar o que está vago,
devoluto, ou não tem proprietário, inquilino ou comodatário. Tudo mais é
invasão, seja um parlamento, uma estância ou uma escola.
O que acabo de escrever evidencia a
crescente fragilidade nas nossas estruturas de comunicação. Se formos
desatentos a esses e outros processos em curso na vida social, corremos o risco
de ser tragados por eles, imperceptivelmente submissos a um insinuante ideal
totalitário, tornando-se a sociedade vulnerável ao domínio de quem controla as
palavras que ela usa.
Por isso, chamam a atenção de todos,
com aprovação de muitos e rejeição de outros tantos, a conduta e o vocabulário
utilizado por agentes políticos como Trump e Bolsonaro. Do primeiro, escreveu
outro dia o prof. Neemias Félix que, perto dele, o segundo parece um poeta. O
que os faz notórios, principalmente, é a ruptura com a novilíngua, com os
eufemismos e com o déficit de testosterona, que já habituou a sociedade a
conviver com falas molengas e discursos pasteurizados, nos quais só os
adjetivos lânguidos e as imprecisões cuidadosamente estudadas têm assento às
mesas onde a comunicação se estabelece.
Caem juntas, a cultura e a
civilização. Caem a golpes de dissimulação, covardia e melindres, vulgarmente
conhecidos como mimimis.
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