Por Reinaldo Azevedo
Pode haver outros, mas creio que poucos jornalistas combatem com
tanta firmeza o preconceito que há no Brasil, nas camadas ditas mais cultas -
no geral, são apenas pessoas orgulhosas do pouco que sabem e do muito que não
sabem - contra os evangélicos. Na verdade, existe um preconceito muito forte
contra os cristãos. Os católicos também são alvos constantes de desconfiança.
Mas não vou tratar disso agora. O que me incomoda profundamente em período
eleitoral é a busca desesperada dos políticos pelos votos dos crentes.
Muitos chegam a afirmar até uma convicção que não têm só para conquistar o
eleitor.
Nesta sexta, por exemplo, a presidente Dilma esteve na Assembleia
de Deus do Brás, em São Paulo – um braço da Congregação de Madureira. Foi
convidada a discursar no Congresso Nacional de Mulheres da Assembleia de Deus
Madureira, que reuniu fiéis de todo o país. Lembrou que o Brasil é um país
laico, mas citou o Salmo 33, de Davi: "Feliz é a nação cujo Deus é o Senhor".
Então tá bom. Eu preciso lembrar aqui algumas coisas.
Quando ministra do governo Lula, Dilma concedeu mais de uma
entrevista dizendo-se favorável à legalização do aborto. Está tudo documentado.
Eu lido com fatos, não com impressões. Notem, leitores: um candidato tem o
direito de pensar o que quiser. Não pode, ou não deve, é fingir o que não
pensa. A então ministra chegou a comparar a eliminação de um feto com a
extração de um dente. Houve uma forte reação dos cristãos - e percebam que,
aqui, eu não estou me posicionando sobre o aborto, mas sobre a hipocrisia
política. E se inventou uma Dilma que seria contrária ao aborto.
A então candidata foi a um programa de TV e se disse católica -
chegando a chamar Nossa Senhora de "deusa". O cristianismo é monoteísta, vale
dizer: crê num único Deus. Nossa Senhora, como se sabe, é uma santa. Chegou a
ir a Aparecida e foi filmada persignando-se - de maneira errada, diga-se.
Eleita presidente, nomeou para o Ministério da Mulheres Eleonora Menicucci, uma
defensora fanática do aborto, que já havia confessado tê-lo feito, em outras
mulheres, com as próprias mãos. Fatos. Eu só lido com fatos.
Os cristãos, com mais ênfase os evangélicos, fazem um intenso
trabalho de convencimento contra a descriminação das drogas, por exemplo. O
governo desta Dilma que vai a um templo evangélico citar um Salmo de Davi pôs
em prática uma política pública escancaradamente favorável à descriminação,
ainda que o faça de maneira um tanto oblíqua. Em maio de 2013, vários entes
federais promoveram um seminário em Brasília, patrocinado com dinheiro público,
em favor da descriminação e da legalização das drogas. Não se convidou para o
evento um único representante que se opusesse a essas teses. Fatos. O governo
Dilma, por intermédio do Ministério da Saúde - especialmente na atual gestão,
de Arthur Chioro, combate com unhas e dentes as chamadas comunidades
terapêuticas, que atuam com dependentes químicos - algumas são ligadas a
igrejas evangélicas. Fatos.
No dia 27 de janeiro de 2012, no Fórum Social de Porto Alegre,
Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, afirmou que os petistas
deveriam se preparar para travar com os evangélicos uma luta ideológica para
disputar a chamada "classe C". Entenderam? Para ele, seu partido e os cristãos
dessas denominações têm interesses contraditórios.
Também não demonizo posições. Cada um pense o que quiser e dispute
o coração do eleitor. O que estou cobrando é honestidade intelectual. Dilma tem
o direito de defender a descriminação do aborto ou sua política simpática à
descriminação das drogas. O que me desagrada, e isto vale para qualquer
partido, é essa mania de alguns políticos de achar que Deus tem prazo de
validade: geralmente, vai de julho a outubro dos anos pares, que são os
eleitorais. Depois, quem costuma dar as cartas na política é mesmo o capeta do
vale-tudo.
Fonte: "Blog
Reinaldo Azevedo"
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