Por Mary Zaidan
Não se deve levar a sério o que Lula
diz. Fala pelos cotovelos, não raro pelos calcanhares, a exemplo da exortação
para que militantes arrancassem materiais de adversários das ruas de São
Bernardo. E não tem qualquer apreço pela coerência entre o que disse ontem, o
que diz hoje e o que dirá amanhã. Muito menos pela verdade.
Sobre o mensalão, navegou entre o
traído que de nada sabia ao humilde que pede desculpas à nação pelo escândalo
que pegou de calças curtas os seus mais caros auxiliares. Daí, migrou para a
fantasiosa versão do caixa 2, expressa em entrevista mais fantasiosa ainda,
transmitida pelo Fantástico, da TV Globo, em julho de 2005, dois dias depois de
ser gravada em Paris.
A esse enredo, Lula e sua turma
penduraram adereços. A ênfase de que culpados seriam punidos "doa em quem doer"
ecoou no vazio.
A fala dura do ex-presidente do PT e
hoje governador gaúcho Tarso Genro preconizando a refundação do partido deu
lugar à de um Ricardo Berzoini (PT-SP): "A prioridade é reeleger o
presidente Lula. Depois veremos isso (a apuração) com calma. E essa história do
mensalão é uma ficção."
E por aí foi. Mensalão virou algo que
nunca existiu, com Lula assegurando que como ex se dedicaria integralmente a
provar que tudo não passara de farsa, coisa da direita para derrubar o primeiro
presidente operário. Algo, aliás, que a dócil oposição nem mesmo cogitou.
Se o transmudar dos fatos já era de
admirável desfaçatez, o que se vê agora bate todos os recordes dessa categoria.
Antes de o julgamento começar, Lula
mexeu vários pauzinhos ou toras inteiras. Tentou em vão convencer ministros
pelo adiamento, manobra que veio à tona quando Gilmar Mendes denunciou a
tentativa de coação.
Instigou seu partido a conclamar o
povo a ir às ruas, tarefa cumprida, pateticamente, pelo deputado Rui Falcão.
Julgamento em curso, constrangeu aliados para que assinassem nota de apoio a ele, contestada no seio dos mesmos partidos que a subscreveram.
Julgamento em curso, constrangeu aliados para que assinassem nota de apoio a ele, contestada no seio dos mesmos partidos que a subscreveram.
Do cineasta Luiz Carlos Barreto,
amigo do réu José Dirceu, obteve carta aberta com 264 assinaturas da elite
intelectual. Barreto batizou o documento como "filosófico-doutrinário". Seja lá
o que isso quer dizer, não é nada filosófico, ou muito menos doutrinário,
alertar o país para a presunção da inocência, como se a Suprema Corte não fosse
capaz de enxergá-la.
Agora, com condenações se acumulando
e a proximidade da análise dos crimes do núcleo petista, Lula já antecipou seu
novíssimo truque: o julgamento só está acontecendo porque ele, Lula, combateu
como ninguém a corrupção. "Se juntarem todos os presidentes da história do
Brasil, vocês vão ver que eles não criaram instituições para combater a
corrupção como nós criamos em oito anos. Sintam orgulho porque se tem uma coisa
que fizemos, foi criar instrumentos para combater a corrupção."
Mais desfaçatez, impossível.
* Mary Zaidan
é jornalista, trabalhou
nos jornais “O Globo” e “O Estado de S. Paulo”, em Brasília. Há cinco anos
coordena o atendimento da área pública da agência Lu Fernandes Comunicação e
Imprensa
Fonte: “Blog
do Noblat”
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