O manifesto concebido para livrar Lula da cadeia tortura a verdade e trucida a língua portuguesa
Por
Augusto Nunes
"Por que Lula?", pergunta a
primeira linha do manifesto em que 424 autodenominados intelectuais a serviço
do PT imploram ao chefe da seita que oficialize a candidatura à eleição de
2018. Até os bebês de colo e os doidos de hospício sabem a resposta: porque a
esperteza talvez ajude a fantasiar de "perseguido político" um prontuário
ambulante enriquecido por sítios, apartamentos, palestras secretas, jatinhos,
negociatas africanas, filhos que multiplicam dinheiro de origem misteriosa e
outros espantos. Só finge não saber disso a fila de signatários do documento,
puxada pelo inevitável Leonardo Boff e previsivelmente engrossada por Chico
Buarque (assinatura n° 9) e João Pedro Stédile (n° 10).
Por que submeter a verdade
a tão selvagens sessões de tortura?, perguntam os brasileiros normais ao fim da
leitura do manifesto. Não há uma única e escassa menção ao assalto à Petrobras,
ao maior esquema corrupto de todos os tempos, a descobertas da Lava Jato, à
herança maldita legada por Lula e Dilma, a quadrilheiros engaiolados, à
devastação provocada por 13 anos de roubalheira e incompetência. Aos olhos dos
fiéis, a alma viva mais pura do mundo não tem nada a ver com isso. Lula tem
tudo a ver apenas com a consolidação da democracia, o extermínio da pobreza, o
sistema de saúde próximo da perfeição, o sistema educacional de dar inveja a
professor finlandês e a transformação do Brasil numa potência petrolífera
respeitada no mundo inteiro, fora o resto.
E por que assassinar o
pobre português já no primeiro parágrafo?, perguntam os que tratam com mais
brandura a língua oficial do Brasil. Em que medida o massacre do idioma
ajudaria a livrar da cadeia um ex-presidente que saiu da História para entrar
na bandalheira? Teriam os redatores do palavrório resolvido homenagear o
Exterminador do Plural? Ou seria uma demonstração de solidariedade aos
inventores da linguística lulopetista, para os quais falar errado está certo?
Se não tem nada de mais insultar o português pronunciando frases como "Nós pega
os peixe", os discípulos de Lula estão à vontade para redigir o trecho abaixo
reproduzido, com observações em negrito do colunista.
"É o compromisso com o
Estado Democrático de Direito, com a defesa da soberania brasileira e de todos
os direitos já conquistados pelo povo desse (Errado, o certo é 'deste') País, que (Alguém infiltrou uma vírgula bêbada entre 'País'
e 'que') nos faz, através desse (É errado o uso de 'através desse': o certo é 'por
meio deste') documento, solicitar ao ex-Presidente Luiz Inácio
LULA da Silva que considere a possibilidade de, desde já, lançar a sua
candidatura à Presidência da República no próximo ano (A candidatura deve ser lançada desde já ou no próximo
ano?), como forma de garantir ao povo brasileiro a dignidade, o
orgulho e a autonomia que perderam".
Como é que é, companheiros
inteleques? Quem "perderam"? O povo? Nesse caso, foram simultaneamente
trucidados os fatos e a concordância verbal. O povo brasileiro nunca "perderam"; sempre perdeu, no singular. Mas desta vez não perdeu a dignidade, o
orgulho e a autonomia, como fantasia o manifesto. O que perdeu foi a montanha
de dólares acumulada pelo PT e seus comparsas. Também perdeu o respeito pelos
farsantes no poder havia 13 anos, perdeu a paciência com os poderosos patifes e
perdeu o medo de ditar os rumos da nação.
Nenhum país tem mais intelectuais
por metro quadrado que o Brasil, constatou Nelson Rodrigues. O problema é que a
maioria é incapaz de pensar. Enquanto mantêm guardado na cabeça um romance
incomparável, escritores escrevem manifestos de envergonhar o mais bisonho
reprovado no Enem. Nessa categoria figura o que sonha com a volta de Lula.
A coleta de assinaturas recomeçará na segunda-feira, informou o site do
PT. Sobra tempo para que os 424 pensadores façam as correções indispensáveis.
Se quiserem copiar as feitas acima, estejam à vontade. De nada.
Também clama por um revisor
com mais de cinco neurônios o texto que festeja no site do PT a desembestada
ofensiva retórica. Confira:
"Numa iniciativa que
responde à escolha que milhões de brasileiros manifestam com clareza sempre que
lhe perguntam quem deve governar o país, o lançamento da candidatura de Luiz
Inácio Lula da Silva à Presidência da República começa a tomar forma e
conteúdo. A partir de segunda-feira (6), todo cidadão brasileiro será
convidado a colocar seu nome, através de uma plataforma aberta na internet, a
um abaixo assinado que solicita a Lula considerar a possibilidade de, desde
já, lançar sua candidatura a Presidência da República como forma de garantir ao
povo brasileiro a dignidade, o orgulho e a autonomia que perderam."
Esse monumento à ignorância
vai ficar sem retoques. Primeiro, porque a cena do crime deve permanecer
intocada, como alertam as séries policiais da TV americana. Depois, porque o
parágrafo acima, da mesma forma que o manifesto, é uma prova contundente de que - ele, de novo - Nelson Rodrigues tinha razão: os idiotas estão por toda parte.
Por que estariam ausentes de reuniões que terminam com o parto de outro
manifesto?
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