Por Reinaldo Azevedo
Vivemos imersos nos fatos. No mais das vezes, não temos
plena consciência do que está à nossa volta. Eis a importância do narrador, do
cronista, do moralista, do pensador. Ele não produz objetos de consumo, mas
objetos de consciência: liga os fatos aparentemente desconexos, confere ao
tempo uma unidade que ilumina a nossa trajetória e a dos outros. Por que isso
tudo?
Porque considero obrigatória a leitura do livro "Não É a Mamãe",
do jornalista Guilherme Fiuza, que reúne cem textos que ele escreveu para a
revista "Época" e para o jornal "O Globo". Vocês vivem aqui me pedindo dicas de
livros, não é isso? Daqui a pouco, vem o fim do ano, com seus inevitáveis e,
espera-se, agradáveis presentes. Ofereça a seus amigos e a quem você ama um
pouco mais de clareza. Fiuza - antes de tudo, um escritor competente - faz o
mais preciso e, em certa medida, devastador retrato dos quatro anos de governo
Dilma. Devastador, nesse caso, não é "depredador". Depreda quem pensa sem
método. Fiuza demole falácias com argumentos.
O livro, primorosamente editado pela Record, é, a um só tempo, um
guia saboroso e seguro para entender o que está em curso e, se querem saber, o
que virá. "Não É a Mamãe", desde o título, nos dá o entendimento de presente.
"Não É a Mamãe", lembrem os mais maduros e saibam os mais
jovens, era o bordão do bebê da família Dinossauro. Dilma nos foi oferecida
como a mãe do Brasil por Lula, que pretendia ser o pai. Lula e dinossauros se
estreitam num abraço insano. Não! Ela não é a mamãe, mas a madrasta má do nosso
futuro. Na realidade, afinal, não existe sapatinho de cristal. Se o governo
queima os ativos dos brasileiros, terminamos nas cinzas, no borralho.
Olhem para Guido Mantega, por exemplo, o ex-ministro no cargo,
situação inédita no mundo. E leiam o que vai no livro de Fiuza. Permito-me
reproduzir um trecho:
"Quem estava preocupado com a inflação pode ficar tranquilo. (…)
Diante da notícia de que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo tinha
ultrapassado o teto da meta - batendo em 6,51% ao ano em abril, contra o teto
de 6,5% -, Mantega explicou que não é nada disso. Segundo o ministro, a
aferição da meta não considera a segunda casa depois da vírgula. Estamos
salvos. (…) Melhor olhar só para a primeira casa, onde a moral e os bons costumes
monetários estão intactos. Ali não se veem a orgia dos gastos públicos no
governo popular, a farra do crédito populista e os subsídios mascarados do
Tesouro jorrando dinheiro na praça e fustigando a inflação. Essas cenas
explícitas de administração perdulária só são visíveis para quem espiar pela
fresta da segunda casa depois da vírgula."
Texto primoroso, ironia fina. Fiuza não é só um bom cronista da
desordem mental que marcou o governo Dilma na economia. O nosso Suetônio
contemporâneo também é um agudo observador dos costumes destes tempos, em que
patrulheiros antediluvianos saem de iPad nas patas a vituperar contra o
capitalismo e o mercado. Enquanto, é claro, para lembrar Fernando Pessoa
desancando Rousseau, o bestalhão, "mordomos invisíveis administram-lhe a casa".
Faça um bem a si mesmo, leitor, e a seus amigos. Vá à livraria
mais próxima e compre "Não É a Mamãe", de Guilherme Fiuza. O silêncio covarde
com que o livro foi recebido por veículos de comunicação assustados, esperando
Godot, é a prova da sua importância política. Ler "Não É a Mamãe" é um ato de
resistência contra a empulhação.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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