Por Reinaldo Azevedo
Em dezenas de artigos neste blog e na minha coluna na Folha de sexta, acusei a omissão da
imprensa e dos jornalistas, que não revelam a seu leitores, telespectadores ou
ouvintes que são obrigados a se esconder nas manifestações. Um colete com a
palavra "Imprensa" não seria uma boa ideia porque, em vez de proteger o
jornalista, a vestimenta o exporia a riscos ainda maiores. Pode até ter a sua
eficácia na Síria, não nas ruas de São Paulo ou do Rio. E a omissão continua.
Por enquanto ao menos, homenagens à parte, no que concerne à reação dos
profissionais de imprensa, Santiago Andrade morreu em vão. Aliás, note-se, em
vez da justa indignação, começou foi o coro dos hipócritas do "deixa disso". Há
até alguns e algumas bacanas sugerindo que os jornalistas precisam evitar a
reação "corporativista". E assim é, vocês já perceberam, porque os assassinos
de Santiago são dois manifestantes. Imaginem o escarcéu que se faria - e com
razão, noto - se tivesse sido morto pela Polícia Militar.
Aliás, reações, estas sim, corporativistas, vimos e
ainda vemos quando se trata de apontar o dedo contra as forças se segurança. É
possível que um ou outro policiais tenham atirado balas de borracha contra
jornalistas porque jornalistas - e, ficando evidenciado, têm de ser
punidos porque o artefato deixa de ser dissuasivo para se transformar em arma
de ataque. No mais das vezes, no entanto, jornalistas
foram feridos no fogo cruzado. Infelizmente, a tal bala ainda é incapaz de
distinguir profissões. Como os coleguinhas estão sempre fazendo a cobertura do
ponto de vista do "manifestante", nunca da polícia, a chance de ser atingido é
grande. "Ah, está justificando!" Não estou. Digo como são as coisas.
Vejo associações de empresas e de jornalistas
cobrando "garantias" à polícia. Quais garantias? O instrumento mais eficaz,
nesses casos, é haver a clara identificação dos profissionais de imprensa. Ou
deem outro! Mas assim não pode ser porque eles estão com medo - e com razão. No
Rio, no dia 13 de junho, policiais foram literalmente linchados. Então a coisa
não começou agora, certo? Um grupo foi sitiado na Assembleia, com vândalos
dispostos a botar fogo no prédio. Em São Paulo, um coronel da Polícia Militar
teve a clavícula quebrada e poderia ter sido morto não fosse a intervenção de
homens do serviço reservado. E o coronel estava lá para negociar. Imaginem se
esses canalhas cercam um repórter de TV cuja cara é conhecida. Um carro da TV
Record foi incendiado - apesar disso, um gigante moral como Paulo Henrique
Amorim usa seus dotes momescos para fazer graça com a violência, tripudiando
sobre o cadáver de um colega de sua ex-profissão.
Por que a Globo, a Band ou a Record não mandam para
as ruas, com a devida identificação no microfone e nas câmeras, seus
profissionais conhecidos, justamente os mais experientes e, em tese ao menos,
mais aptos a coberturas com esse grau de complexidade? Porque seriam linchados!
Ainda que as empresas fossem irresponsáveis o bastante para convocá-los, eles
não iriam. Se conhecerem alguns, perguntem a eles se teriam coragem de
enfrentar a parada. Não são doidos. Aliás, os repórteres de TV que me leem
agora sabem que falo a verdade. As TVs estão recorrendo a estratégias
editoriais: o jornalismo atua de modo clandestino, colhendo imagens. Depois, os
mais experientes se encarregam de "amarrar" uma reportagem final. E ninguém
está se escondendo da polícia. É vergonhoso que isso não tenha sido denunciado
ainda:
a: pelas emissoras;
b: pelas associações profissionais de jornalistas;
c: pelas associações profissionais das empresas de comunicação;
d: pela Ordem dos Advogados do Brasil. Esta, então, por intermédio de sua seção no Rio, está, na prática, justificando a violência, como já demonstrei aqui. A atuação da entidade nesse particular tem sido vergonhosa.
a: pelas emissoras;
b: pelas associações profissionais de jornalistas;
c: pelas associações profissionais das empresas de comunicação;
d: pela Ordem dos Advogados do Brasil. Esta, então, por intermédio de sua seção no Rio, está, na prática, justificando a violência, como já demonstrei aqui. A atuação da entidade nesse particular tem sido vergonhosa.
Tim Lopes, sim!, mas pior
Mesmo assim, apesar de todas as evidências de que os jornalistas estão sendo caçados nas ruas, prevalecem o silêncio e a reação, esta sim hipócrita, de culpar os dois lados. Por quê? Porque estão todos com medo dos milicianos organizados das redes sociais.
Mesmo assim, apesar de todas as evidências de que os jornalistas estão sendo caçados nas ruas, prevalecem o silêncio e a reação, esta sim hipócrita, de culpar os dois lados. Por quê? Porque estão todos com medo dos milicianos organizados das redes sociais.
Leio um texto em que se sustenta que Santiago
Andrade não pode ser comparada a Tim Lopes porque, nesse caso, os traficantes
sabiam quem estavam matando e se tratou de um agressão explícita à liberdade de
imprensa. Já a dupla que atacou Santiago, bem, o rojão não estava destinado a
ele; teria havido um acidente. A consideração é de uma imoralidade asquerosa. É
claro que não era "para ele". Como confessou um dos agressores, o objetivo era
atingir os policiais. E que se note: fosse o morto um fardado, a reação teria
sido ainda mais discreta.
Certas ocorrências, ainda que infinitamente menores
do que emblemas de tragédias humanitárias, trazem a memória pura da
indignidade. Hitler matou seis milhões de judeus. E encontrou um lugar justo na
história, sendo cultuado não mais do que por meia dúzia de lunáticos. Stálin
responde pela morte de uns 40 milhões na União Soviética - quase nunca, mas
também, matava alguém por pertencer a este ou àquele grupos. A vocação homicida
do Bigodão era menos seletiva do que a do Bigodinho. É evidente que o
Holocausto judeu merece um lugar único na história porque o ódio a uma etnia, a
um grupo social, a um povo reveste-se de particular gravidade. Hitler matava
judeus porque eram judeus. Mas como explicar que partidos comunistas mundo
afora e esquerdistas em penca ainda hoje cultivem a memória de Stálin - e, mais
genericamente, do socialismo - como um reformador?
A sobrevivência, diga-se, das ideias de esquerda
decorre, em grande parte, desse dar de ombros para os crimes cometidos pelos
socialistas. Admite-se, em larga medida, que a violência é um instrumento
aceitável da luta política, daí um certo Marcelo Chalreo, presidente da
Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, ter citado alegremente numa nota - num
daqueles momentos em que a ignorância se cruza com a truculência - que "a
violência é a parteira da história". Não se enganem: se as organizações
judaicas não fossem tão vigilantes e não se empenhassem, ainda hoje, em lembrar
quem foi Hitler e o que foi o nazismo, também essa besta-fera já teria sido
reciclada para consumo. Afinal, se "a violência é a parteira da história",
então tudo é permitido. Os canalhas intelectuais que acusam os judeus de
alimentar "a indústria do holocausto" deveriam atentar para o mal que fizeram
os liberais por não terem alimentado a "indústria do morticínio socialista".
O caso Santiago Andrade, na verdade, é mais grave
do que o de Tim Lopes. Sim, os traficantes sabiam quem estavam matando. Mas
notem: Tim estava infiltrado no "movimento", numa operação que sabia de
altíssimo risco, para fazer a denúncia por dentro. Fosse um policial ou
religioso, uma vez descoberto, teria morrido do mesmo jeito. É tolice achar que
o assassinaram porque era um jornalista. Os facínoras que o mataram não estavam
se manifestando contra a liberdade de imprensa. Só não queriam ser denunciados.
Duvido que Elias Maluco já tenha pensado a respeito da liberdade de informação
ou que chame o jornalismo de "mídia conservadora", com esgar de nojo. Ele
habita outro planeta.
Nestes dias, a coisa é bem diferente. Fato: a
dupla não tentou matar Santiago - o artefato era para a polícia… Mas Santiago
pertencia a uma categoria que não pode se identificar e mostrar a cara porque
grupos organizados, que odeiam o jornalismo livre, que se manifestam abertamente
contra a liberdade de imprensa, não permitem.
Vagabundos financiados
Entrem nas páginas dos black blocs e afins na Internet para ver o que eles pensam da imprensa, que acusam de "distorcer" as reais intenções do seu glorioso "movimento". A tal "Sininho", que apareceu como animadora de torcida de depredadores, chamou de "carniceiros" os cinegrafistas que, trabalhando, cobriam o depoimento de Fábio Raposo, um dos assassinos de Santiago. Um de seus amigos apontou o dedo para eles: "Vocês serão os próximos". Levou uma "camerada" na cabeça de um dos cinegrafistas - um gesto que mereceu o meu aplauso. Simples assim.
Entrem nas páginas dos black blocs e afins na Internet para ver o que eles pensam da imprensa, que acusam de "distorcer" as reais intenções do seu glorioso "movimento". A tal "Sininho", que apareceu como animadora de torcida de depredadores, chamou de "carniceiros" os cinegrafistas que, trabalhando, cobriam o depoimento de Fábio Raposo, um dos assassinos de Santiago. Um de seus amigos apontou o dedo para eles: "Vocês serão os próximos". Levou uma "camerada" na cabeça de um dos cinegrafistas - um gesto que mereceu o meu aplauso. Simples assim.
Façam um exercício: comparem o que os
black blocs e outros violentos dizem do jornalismo livre com o que vai em
páginas do subjornalismo governista-petista, financiadas pelo governo federal e
por estatais. O texto é o mesmo. As acusações são as mesmas. A mesma é a
vocação persecutória. O que os facinorosos que matam pessoas pensam do
jornalismo não é diferente da pregação de Franklin Martins. Não é diferente do
que dizem os documentos da Executiva Nacional do PT.
Em razão de tudo o que expus até aqui, escrevi
assim na minha coluna de sexta na Folha:
(…)
Eu acuso Franklin Martins de ser o chefe de uma milícia oportunista contra a imprensa livre.
Eu acuso o governo federal e as estatais, que financiam páginas e veículos que pregam o ódio ao jornalismo independente, de ser corresponsáveis por essa morte.
Eu acuso o ministro José Eduardo Cardozo de ser, querendo ou não, na prática, um dos incitadores da desordem.
Eu acuso o ministro Gilberto Carvalho de especular com o confronto de todos contra todos.
Eu acuso jornalistas de praticar a sujeição voluntária porque se calam sobre o fato de que são caçados nas ruas pelos ditos "ativistas" e obrigados a trabalhar clandestinamente.
Eu acuso empresas e jornalistas de se render a milicianos das redes sociais e de se preocupar mais com "o que elas vão dizer de nós" do que com o que "nós temos de dizer a elas".
Eu acuso uns e outros de se deixar pautar por dinossauros com um iPad nas patas.
(…)
(…)
Eu acuso Franklin Martins de ser o chefe de uma milícia oportunista contra a imprensa livre.
Eu acuso o governo federal e as estatais, que financiam páginas e veículos que pregam o ódio ao jornalismo independente, de ser corresponsáveis por essa morte.
Eu acuso o ministro José Eduardo Cardozo de ser, querendo ou não, na prática, um dos incitadores da desordem.
Eu acuso o ministro Gilberto Carvalho de especular com o confronto de todos contra todos.
Eu acuso jornalistas de praticar a sujeição voluntária porque se calam sobre o fato de que são caçados nas ruas pelos ditos "ativistas" e obrigados a trabalhar clandestinamente.
Eu acuso empresas e jornalistas de se render a milicianos das redes sociais e de se preocupar mais com "o que elas vão dizer de nós" do que com o que "nós temos de dizer a elas".
Eu acuso uns e outros de se deixar pautar por dinossauros com um iPad nas patas.
(…)
A lei anterrorismo
O Brasil não tem uma lei antiterrorismo. Não posso afirmar com absoluta certeza porque não fiz o levantamento em todos os países do mundo, mas certamente é dos poucos a ter esse vazio legal. O Chile tem. A Colômbia tem. Os EUA têm. A Alemanha, a França, a Itália e Inglaterra têm. Ah, sim, a Venezuela, Cuba e China também - nesses três casos, diga-se, tão apreciados pelas nossas esquerdas, basta defender a democracia para ser enquadrado como terrorista.
O Brasil não tem uma lei antiterrorismo. Não posso afirmar com absoluta certeza porque não fiz o levantamento em todos os países do mundo, mas certamente é dos poucos a ter esse vazio legal. O Chile tem. A Colômbia tem. Os EUA têm. A Alemanha, a França, a Itália e Inglaterra têm. Ah, sim, a Venezuela, Cuba e China também - nesses três casos, diga-se, tão apreciados pelas nossas esquerdas, basta defender a democracia para ser enquadrado como terrorista.
Setores da imprensa brasileira já detonaram o
Projeto de Lei do Senado nº 499 SEM LER. A íntegra está aqui.
Como é óbvio, não pune manifestantes ou tolhe a liberdade de expressão. Pune
com severidade quem infunde terror em massa e quem ataca instalações e bens
públicos, incluindo meios de transporte, pondo em risco a segurança de milhares
de pessoas. Aliás, a Lei de Segurança Nacional, a 7.170, que está em vigor, poderia já ter
mandado para a cadeia alguns dos bandidos que estão por aí aterrorizando as
pessoas.
A esquerda do PT saiu gritando contra o Projeto de
Lei do Senado. Imediatamente, algumas vozes do jornalismo resolveram fazer eco
à gritaria. Confunde-se a violência terrorista com simples distúrbios;
confunde-se a repressão ao terror com o cerceamento à liberdade de expressão, o
que é, obviamente, um absurdo.
É evidente que o estado brasileiro não pode definir
O QUE SE PODE FAZER NUMA MANIFESTAÇÃO, O QUE SE PODE DIZER, O QUE SE PODE
REIVINDICAR. Mas o estado tem legitimidade para definir, sim, O QUE NÃO SE PODE
FAZER: explodir bombas, recorrer a coquetéis molotov, incendiar ônibus,
infundir terror nas ruas e em aparelhos públicos, o que pode pôr em risco a
segurança de milhares.
Só a mais escancarada má-fé ou a burrice mais
saliente podem confundir o ataque a direitos fundamentais de todos os
indivíduos como um pressuposto da liberdade de manifestação de alguns
indivíduos. Não se trata de ser "progressista" ou "reacionário", mas de admitir
ou não o crime como instrumento de luta política.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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