Por Celso
Arnaldo Araújo
Dilma Rousseff não tem dado muita sorte na
Bahia: há duas semanas, seu já lendário "Comício de Cazajeiras" consagrou a
derrota da candidatura de Nelson Pelegrino à Prefeitura de Salvador. Mas este é
um momento mágico na relação entre o homem e o meio ambiente: em Malhada, a 900
quilômetros da capital, no castigadíssimo sertão baiano, a presidenta vai
transformar um discurso pífio em água abundante, na cerimônia de inauguração da
primeira etapa do sistema adutor da região de Guanambi - na verdade, mais uma inauguração
da promessa de acabar com a seca no nordeste.
O truque é velho, mas ainda funciona.
Encharcados pelos perdigotos errantes da discurseira presidencial, os baianos
ali presentes, e em seguida todos os nordestinos, já começaram a se imaginar
mergulhando em suas novas jacuzzis naturais.
E o milagre parece ainda maior quando se ouve
com boa vontade - e o espanto de sempre - este vídeo de 5min37s (Veja abaixo) com o Discurso
de Malhada: a estiagem do pensamento de Dilma chega a ser bíblica,
apocalíptica. Nenhum sertanejo sem água e letras jamais escutou uma fala tão
primitiva, arcaica e árida - e incompatível com as altas funções da animada
senhora que traz consigo uma enchente de prenúncios de vida farta e fértil.
Sem tempo sequer para se abrir um
guarda-chuva, começa o dilúvio de sandices:
"Eu queria dar bom dia pra todas as mulheres aqui. E também pros homens. Afinal de contas, afinal de contas, as mulheres são mães de todos os homens. Então tá todo mundo em casa".
"Eu queria dar bom dia pra todas as mulheres aqui. E também pros homens. Afinal de contas, afinal de contas, as mulheres são mães de todos os homens. Então tá todo mundo em casa".
Weslian Roriz disse isso? Ângela Bismarchi?
Não, foi a presidente da República - que, desde a campanha de 2010, encasquetou
com essa imagem tosca da transcendência feminina através da maternidade
masculina e a vem piorando de discurso em discurso: as mulheres, maravilha-se
ela, são as mães de todos os homens - como o são, aliás, de todos os seres
humanos. Ou seja: como nunca antes neste país, somos filhos de nossas mães. Uma
grande vitória da mulher: na herança maldita e machista de FHC, nós, os homens,
é que éramos pais de todas as mulheres.
É, mas esse negócio de DNA não é tão simples.
A presidente, meio mineira, meio gaúcha, nas proporções que lhe convêm, é um
cadinho de torrões natais:
- Porque eu tenho um pedaço de mim que é baiano.
Sobre essa estranha baianidade, mais não
disse nem lhe foi perguntado, mesmo porque o assunto em pauta vai além de
regionalismos: as vidas secas, neste país, estão com os dias contados, como
insistiu o retirante Lula, também conhecido como Dom Predo III, durante oito
anos.
- Pra nós agora, chegou a hora, junto com o Jaques Wagner, da gente (sic) resolver o problema da água de uma forma a garanti que as mulheres e os homens, as crianças, possam tomá café de manhã, tomá banho, tê uma água saudável.
- Pra nós agora, chegou a hora, junto com o Jaques Wagner, da gente (sic) resolver o problema da água de uma forma a garanti que as mulheres e os homens, as crianças, possam tomá café de manhã, tomá banho, tê uma água saudável.
No nordeste, o chamado "problema" da água
continua sendo sua inexistência. Mas isso agora será consertado, começando por
esta adutora baiana. E com um governo que se orgulha de suas secretarias de
promoção da igualdade racial, das mulheres e dos direitos humanos em geral, é
um alento saber que a nova água não fará discriminação de gênero e faixa etária
- conservadas, é claro, suas características organolépticas clássicas: incolor,
insípida e inodora. Melhor ainda: degustada no café da manhã, também poderá ser
usada para a higiene pessoal. Outra grande ideia do governo Dilma.
Mas, espere, não é só:
- E também nós queremos, e por isso que nós vamos lançar terça-feira o programa de irrigação, nós queremos usá a água pra aumentá o chamado ''di comer". Nós queremo aumentá a produção de alimentos.
- E também nós queremos, e por isso que nós vamos lançar terça-feira o programa de irrigação, nós queremos usá a água pra aumentá o chamado ''di comer". Nós queremo aumentá a produção de alimentos.
Claro: depois do "di beber", o "di comer" -
ou o "chamado di comer". Mas quem chama? É como se diz comida por aquelas
bandas? Ok, não importa. Sim, em se plantando, tudo dá - mas vá fazer isso sem
água: o governo Dilma descobriu, em boa hora, mais uma aplicação vital do
"precioso líquido". E, oba, vem aí mais um programa com a marca do governo
Dilma. Na terça-feira, tem discurso de inauguração de mais uma promessa.
Parece que, antes mesmo de achar água, Dilma
está se achando, de novo com essa velha história de acabar com a seca no
nordeste, enquanto os sertanejos e suas criações minguam e fritam como
torresmo, mortos de sede, numa escala como nunca antes neste país. Humilde,
nossa moça do tempo se rende à força da natureza:
- A gente sabe, dentro da nossa condição de seres humanos, que nós num controlamos o clima. Nós não controlamos o dia que chove, quando não chove, porque um ano chove mais do que o outro. Mas nós podemos garantir que a gente tenha instrumentos para que quando não chovê a gente tenha água istocada, que a gente tenha um açude, que a gente tenha uma adutora pra captá água de um rio volumoso, como é o São Francisco, e levá água pra população, de forma garantida, chova ou faça sol.
- A gente sabe, dentro da nossa condição de seres humanos, que nós num controlamos o clima. Nós não controlamos o dia que chove, quando não chove, porque um ano chove mais do que o outro. Mas nós podemos garantir que a gente tenha instrumentos para que quando não chovê a gente tenha água istocada, que a gente tenha um açude, que a gente tenha uma adutora pra captá água de um rio volumoso, como é o São Francisco, e levá água pra população, de forma garantida, chova ou faça sol.
Um dia, alguém que hoje tem grande
credibilidade transformou água em vinho. De palanque em palanque, de promessa
em promessa, a presidente anuncia, em conta-gotas, um milagre muito mais
difícil: transformar papel em água.
Daí a evocação de São Francisco? Por falar
nele, e a transposição? A enxurrada de desvios já foi transposta para a
polícia? As obras, abandonadas pelas empreiteiras conchavadas, serão retomadas,
sem caudalosos aditivos, chova ou faça sol?
Assista ao vídeo: http://youtu.be/9AA5HHbpcqY
Fonte: Direto no Ponto"
Um comentário:
Quanto dinheiro se perdeu nas obras da transposição do São Francisco e com enormes trechos abandonados em Pernambuco!! Uma vergonha, essa senhora vir a público, em época de campanha, dizer tantas mentiras!
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