Por Reinaldo Azevedo
O PT e o governo sofreram duas derrotas importantes
ontem. A primeira: Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, escolheu o
deputado Rodrigo Maia (Democratas-RJ) para presidir a comissão especial da reforma
política. O relator é o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI). A instalação da
comissão ocorreu na tarde desta terça-feira. Os petistas ficaram apenas com uma
das vice-presidências, assim como o PSDB, outro partido de oposição.
Pois é… O Velho do Restelo, um reacionário adorável
de "Os Lusíadas", de Camões, ao criticar o excesso de ambição dos portugueses,
lamentou na praia que acabou por lhe grudar no nome quando a esquadra estava
pronta para se lançar ao mar: "Ó glória de mandar, ó vã cobiça/ desta vaidade a
quem chamamos Fama!". Segundo o Velho, essa glória de mandar é "fonte de
desamparos e adultérios" e uma "sagaz consumidora conhecida/ de fazendas, de
reinos e de impérios!". Vale dizer: pode levar os homens à ruína. Os
portugueses, em todo caso, se deram bem. Mas os petistas quebraram a cara.
Em 2013, logo depois das jornadas de junho,
falou-se da necessidade de uma reforma. Dilma Rousseff lançou a sua tese
estúpida dos plebiscitos. O PT deu início à pregação do fim do financiamento
privado de campanha, ladainha já entoada depois do mensalão, como se essa fosse
a única origem da roubalheira. Na Câmara, o então presidente Henrique Eduardo
Alves (PMDB-RN) instituiu uma comissão para colher subsídios que resultassem
numa PEC - Proposta de Emenda Constitucional - para a reforma política. O representante
do PT no grupo e coordenador da comissão foi o então deputado Cândido
Vaccarezza, que não se reelegeu.
Muito bem. Nasceu, assim, a PEC 352/2013 - íntegra aqui -, que é, sim, um texto muito
razoável, embora eu discorde de muita coisa. O PT, acreditem, desautorizou
Vaccarezza e passou, nesse particular, a tratá-lo como adversário. Tudo porque
ele teve, diga-se, um comportamento correto na comissão, coligindo aquela que
era a vontade da maioria. De resto, uma emenda sempre pode sofrer alterações.
Quais são os pontos básicos da PEC 352?
- prevê o financiamento misto de campanha, com
recursos públicos, privados ou ambos;
–
remete para a lei o disciplinamento da doação das empresas;
–
estabelece que toda doação é feita para partidos, não para candidatos;
–
institui o voto facultativo;
–
extingue a reeleição;
–
partidos que se coligam nas eleições proporcionais são obrigados a manter o
bloco depois;
–
estabelece cláusula de barreira: só terão acesso a fundo partidário e tempo de
rádio e TV as legendas que obtiverem ao menos 5% dos votos nacionais, em pelo
menos um terço dos estados;
–
mantém o sistema proporcional, mas exige um mínimo de votos para o deputado ser
eleito;
–
submete a reforma a um referendo.
Pois bem. O PT não quer essa reforma de jeito
nenhum. Quer proibir a doação de empresas a campanhas - o que jogaria o
processo político na clandestinidade -, instituir o financiamento público (o
que o beneficiaria) e pretende que as mudanças sejam feitas por plebiscito. No
referendo, a população é consultada depois e diz se aceita ou não as
alterações.
Eu sou contra qualquer doação pública; defendo o
voto distrital, não o proporcional, e acho que não faz sentido restringir a
doações aos partidos. Mas que se vá para o debate, ora! A comissão especial é
composta de 34 membros e tem um prazo de 40 sessões para concluir o trabalho.
Muito bem! O PT decidiu sabotar o texto ainda na
Comissão de Constituição e Justiça. Eduardo Cunha, usando sua prerrogativa de
presidente, avocou para o plenário, aprovou o início da tramitação e decidiu
instituir a comissão. É que, em 2013, o PT ainda se via como o maior partido da
Terra e achava que podia impor a sua vontade na porrada. Quem veio a público,
então, para desautorizar Vaccarezza foi José Nobre (PT-CE), atual líder do
governo na Câmara.
Não sei que destino terá a reforma. Há coisas boas
ali, como o fim do voto obrigatório e o fim da reeleição para cargos
executivos. O melhor caminho, claro!, é submeter o texto a referendo, que é a
consulta posterior, não a plebiscitos. O texto carrega o nome de um petista, e
o partido poderia ter um papel maior no debate. Agora, foi arrastado pelo
furacão Cunha. Por quê? Em razão da glória de mandar, da vã cobiça. Segundo o
Velho do Restelo, ela já destruiu impérios. Não sei, não… Acho que pode
destruir também partidos…
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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