O ano era 1970. O tempo era cinza, mais um ano de chumbo. Vigorava o
regime militar. O período era de autoritarismo. No Colégio Estadual de Feira de
Santana foi programada uma Feira de Ciências. Uma equipe foi formada por sete
alunos do 3º ano colegial (Científico), turno vespertino. A proposta era
apresentar um projeto futurista. Os jovens eram sonhadores, imaginavam um mundo
sem conflitos, sem desigualdades. Ouviam Os Mutantes, Gilberto Gil, Caetano
Veloso, The Beatles, Rolling Stones, por aí.
Wesley, Naldinho, Lino, Roberto, Dimas, Gracinha e Lomanto (Foto)
eram eles. A equipe levou o nome de 2001 - e estava a 30 anos do terceiro
milênio. "Cidade do Futuro", o nome do trabalho, uma maquete onde era
apresentada a cidade idealizada pelos sete, feita com materiais como até casca
de ovo, foi montado na residência de Gracinha, Maria das Graças Azevedo, na
Kalilândia. O grupo se reunia inclusive na parte da noite para discutir e
executar o projeto. Levaram dias. Roberto, Pedro Roberto Oliveira, que na época
trabalhava em escritório de arquitetura com desenho, liderava a equipe. Além da
maquete, cartazes explicavam como funcionava a "Cidade do Futuro", os
serviços de transporte, a alimentação. O trabalho foi montado em local nobre.
Enquanto os demais foram instalados nas salas de aula em todos os pavilhões, a
"Cidade do Futuro" foi destacada na sala dos professores.
Na cidade futurista dos jovens - a idéia era uma cidade universal - não
havia quartéis, não tinha sistema de defesa, de segurança. Eles acreditavam que
isso não seria problema no futuro. Esse detalhe incomodou e causou reboliço no
Colégio Estadual e nas forças que estavam do lado da ditadura e trouxe sérias
conseqüências para o professor de Biologia, José Coutinho Estrela (já
falecido). Por ter incentivado o projeto dos jovens sonhadores, ele prestou
depoimento e foi preso. As explicações simples e sinceras sobre a intenção do
projeto não tinham vez. A turma ficou atônita em ver sua criação ser
considerada como subversiva. O medo tomou conta de todos, apreensivos com o
quadro que se criou, tendo o trabalho sido impedido de ser mostrado em
Salvador, como programado anteriormente. A diretora do colégio, professora
Laura Folly, constrangida, teve que atender "ordens superiores".
Onde estão os projetistas da "Cidade do Futuro"? Não se tem
notícias de onde Wesley esteja. Nem de Gracinha Azevedo. Naldinho é Ednaldo
Alves de Souza, ex-gerente da Caixa Econômica Federal. Lino é o empresário José
Lino Carneiro, da Linu's Moda, que tem loja no Boulevard Shopping. Manoel
Lomanto é representante comercial. Pedro Roberto, artista plástico, que chegou
a gerente de Cenografia do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), faleceu há sete anos, em 1º de janeiro de 2006. E Dimas Oliveira é jornalista, que
escreveu esta matéria baseado em suas lembranças e na de outros integrantes da
Equipe 2001, que tinha até camisa, criada por Pedro Roberto, vestida no dia do
lançamento da Feira de Ciências.
Esta matéria foi publicada originalmente em edição especial do jornal
"Folha do Estado", em 16 de dezembro de 2000. Foi revista e ampliada.
Detalhe:
ninguém da equipe se considerou perseguido político e é beneficiário de
indenização deferida pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.
Nenhum comentário:
Postar um comentário