Por Reinaldo Azevedo
A VEJA desta semana traz uma reportagem sobre a onda de violência em São
Paulo (ver post). Escrevo um artigo a respeito na revista com alguns dados que
chegam a ser espantosos. Explico: chega a ser espantoso que os números sejam
solenemente ignorados por setores consideráveis da imprensa. É preciso lidar
com fatos, não com impressões. Lendo o texto abaixo, vocês hão de se perguntar:
onde estão os outros cadáveres? Onde estão, afinal de contas, esses mortos sem
notícia?
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Impressão X realidade
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Impressão X realidade
A política de segurança pública de São Paulo está sendo fuzilada sem chance
de defesa, com requintes de covardia técnica, intelectual e política. Houve,
sim, um recrudescimento da criminalidade no estado, o que requer uma
intervenção especial do poder público. Mas daí a caracterizar a situação como
perda do controle vai a diferença que distingue a verdade da mentira. O alarde
não busca corrigir erros e vícios. Ao contrário. Ele ignora e esmaga as
virtudes de uma gestão que, nos últimos dez anos, merece mais elogios do que
críticas.
Não me ocupo de impressões, mas de dados; não me posiciono sobre utopias
redentoras, mas sobre fatos. E é fato que o estado de São Paulo, segundo o
Anuário Brasileiro de Segurança Pública, apresentou a mais baixas taxas de
crimes violentos letais intencionais (CVLI) do país em 2011 - 10,8 por 100 000
habitantes. Amapá aparece com 0,9, mas o dado está na categoria dos
não-confiáveis e não pode ser considerado. O CVLI leva em conta homicídios
dolosos, latrocínios e crimes de lesão corporal que resultem em morte.
Comparar é fazer justiça. O índice do Brasil como um todo é de 23,6 por 100
000. Em Alagoas, esse indicador alcança 76,3. No Espírito Santo, vai a 45,6. Em
Pernambuco, chega a 38,1. Sergipe tem 33,9. Na Bahia, o índice alcança 33,2 e
no Rio de Janeiro, 25,8. Sei que a informação parece desafiar o noticiário
televisivo - e desafia mesmo. O fato é que a probabilidade de um fluminense ter
sido vítima fatal de algum dos crimes medidos pelo CVLI no ano passado foi 138%
maior do que a de um paulista. Existe alguma contestação razoável a essas
estatísticas? Não.
Poderia eu ser acusado de estar usando números do ano passado para esconder
que, neste ano, São Paulo superou a média brasileira e também a do Rio em
crimes de morte? Não. No pior dia da atual onda de violência, houve 22
assassinatos em São Paulo. Um absurdo, sim, para o estado, mas não para o
Brasil. Só para pensar, anualizo esse número, multiplicando-o por 365 (o que é
um exercício de reductio ad absurdum, pois é impossível que qualquer
cidade do mundo, muito menos São Paulo, possa ter todos os dias do ano iguais
ao seu pior dia). Mas vamos seguir adiante.
Por esse cálculo, seriam, então, no fim do ano, computados 8 030 crimes de
morte. Considerando a mesma população levada em conta pelo Anuário, São Paulo
atingiria a assustadora taxa de 19,2 mortos por 100.000 habitantes. Repito, se
São Paulo atingisse todos os dias do ano a sua pior marca diária, a sua taxa de
homicídios ainda seria cerca de 26% menor do que as efetivamente atingidas pelo
Rio de Janeiro ou 42% menor do que as taxas da Bahia, por exemplo. Ao fim deste
texto, há os respectivos endereços eletrônicos do Anuário e do Mapa da
Violência. Eu os convido a consultá-los.
O Brasil é um país perigoso. Foram assassinadas, em 2011, perto de 50.000
pessoas - não há o número exato porque há estados que omitem dados. São Paulo
oferece menos risco do que o Brasil. Se a taxa nacional fosse igual à do
estado, cerca de 30.000 pessoas mortas de forma violenta estariam vivas hoje. Número
é argumento.
O Estado de São Paulo tende a fechar o ano com 10,77 mortos por 100.000
habitantes. Na cidade de São Paulo, o índice deve chegar a 11,3 por 100.000.
Isso significa que, no ano em que São Paulo foi mostrado na televisão como um
teatro de guerra urbana, o estado ainda figurará nas estatísticas confiáveis
como o mais seguro do Brasil.
É preciso olhar também a história. Segundo o Mapa da Violência (leia o
documento na íntegra clicando no link abaixo), houve 42,2 mortos por
100.000 habitantes no estado em 2000. Em 2010, 13,9 - menos 67%. Foi a maior
queda de criminalidade registrada no Brasil. A taxa recuou em apenas sete
unidades da federação. Subiu nas outras vinte. Muitas vezes brutalmente (303,2%
na Bahia; 269,3% no Maranhão; 252,9% no Pará).
A vida humana é assunto sério e não pode ficar entregue a chicanas
político-partidárias e ao terrorismo. Usar a criminalidade urbana como parte de
um projeto político para tomar o Palácio de Inverno - no caso, o dos
Bandeirantes - não é decente e merece o repúdio dos paulistas e de todos os
brasileiros de bem.
Clique aqui para
acessar o Anuário Brasileiro de Segurança Pública;
Clique aqui para acessar o Mapa da Violência
Clique aqui para acessar o Mapa da Violência
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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