Assistindo
a uma sessão cinematográfica o homem não pôde pôr o braço nos ombros da mulher (mesmo
que esta seja sua, esposa)
Em Araçatuba, um cidadão
impetrou uma ordem de habeas-corpus singular. Pois, segundo afirmou, estava
ameaçado com sua liberdade física por ato da autoridade policial daquela cidade,
que proibira a permanência, nos cinemas locais, durante a projeção, de casais
enlaçados. Acrescentou o impetrante que com isso ficara ele impedido de
assistir às sessões de cinema como era seu costume. Isto é com o braço nos
ombros de sua própria esposa, ou, até mesmo, no espaldar da cadeira.
O juiz da comarca julgou
prejudicado o pedido que o impetrante e paciente lhe dirigira, não só à vista
das informações prestadas pela autoridade policial, como por considerar o
decidido em outro processo. Dessa decisão recorreu o impetrante para o Tribunal
da Alçada. Declarando, inicialmente, que o juiz incorrera num defeito de
técnica ao negar a ordem, quando deveria ter considerado prejudicado o pedido,
o Tribunal, no seu acórdão, relatado pelo juiz Oliveira Noronha, tomando
conhecimento do recurso, apreciou o caso em todos os seus aspectos, para
concluir que falecia razão ao impetrante. Não era isenta de críticas - observou
o relator - a assertiva de que constitui cerceamento à liberdade física proibir
que um cidadão fique à vontade, como lhe convenha, em locais frequentados pelo
público, desde que isso não constitua um ilícito penal. Mas o frequentador de casas
de diversões é obrigado a observar os regulamentos de tais estabelecimentos,
estando, por outro lado, sujeito à fiscalização policial. Assim. não era
possível que. para ficar à vontade, pudesse o espectador fumar, despojar-se de
seus sapatos, de seu paletó, de sua gravata. sentar-se de maneira inconveniente
etc. etc. E não se poderia negar também à polícia o direito de fiscalizar,
impor ordem e respeito em lugares frequentados pelo público, coibindo abusos e
fazendo respeitar os regulamentos das próprias empresas particulares que
exploram casas de diversões. O acórdão acentuou ainda que não era de se cogitar
se certas atitudes são morais. amorais ou imorais: são apenas proibidas a bem
da ordem pública, no interesse de todos, para evitar abusos, inconveniências.
atritos e reclamações. Aliás, os proprietários das casas de diversões da cidade
não se haviam insurgido contra a determinação da autoridade policial:
aceitaram-na e, assim, adotando-a, parecia evidente que aquele que assistisse
às sessões estava também obrigado a observá-la. E a medida, abrangendo todos os
espectadores, tinha por finalidade evitar inconvenientes e abusos como
assinalara a autoridade policial em suas informações ao juiz. A rigor disse
finalmente o acórdão - seria o caso de não se ter tomado conhecimento do pedido
em primeira instância. Porque a suposta coação de que se dizia ameaçado o
paciente, não afetava diretamente o seu direito de locomoção. E nem teria
cabimento conceder-se habeas-corpus para alguém deixar de observar regulamentos
de empresas particulares, impondo ao público certas condições para a permanência
no recinto de exibições.
Fonte: "Cine-Repórter", edição de 3 de janeiro de 1959
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