Por Reinaldo Azevedo
Ai, ai… Vamos lá, seguindo sempre a máxima de
Voltaire, segundo a qual o segredo de aborrecer é dizer tudo. Nesta segunda, as
candidatas Dilma Rousseff, do PT, e Marina Silva, do PSB, passaram o dia
tentando saber quem gostava menos de banqueiros e de bancos. Era o confronto de
dois discursos do fingimento.
O PT, a partir de 2003, viveu uma verdadeira lua de
mel com o setor - interrompida pelo atual governo - não por ideologia, mas por
incompetência mesmo. Dilma, é evidente, não tem moral para chamar Marina de "candidata dos bancos", moral que também falta a Marina para acusar Dilma de
beneficiária da "bolsa banqueiro".
A petista mandou seu recado aos companheiros do
mercado financeiro anunciando a demissão de Guido Mantega caso seja reeleita - de fato, demitido ele já está agora. E Marina, mais do que recado, mandou foi
uma equipe de emissários para "explicar" seu programa de governo a mais de 500
clientes do Bank of America Merrill Lynch (BofA). O encontro ocorreu anteontem,
dia 8, num hotel de São Paulo.
Esperem! Usei a palavra "emissários"? Em "marinês",
não é assim que se fala: eles são "vocalizadores". Fora falar aos "sagazes
brichotes", como os chamaria o poeta Gregório de Matos no século 17, os
seguintes "vocalizadores": Walter Feldman, João Paulo Capobianco; André Lara
Resende; Maurício Rands; Beto Albuquerque e Basileo Margarido.
Este blog teve acesso a uma síntese do que se disse
lá. Trata-se, sem dúvida, de um troço bem "sonhático", o neologismo com que
Marina pretende conciliar sonho e pragmatismo. Alguém quis saber sobre o
compromisso anunciado pela candidata com inflação e juros baixos. Coube a Lara
Resende responder. Inflação, disse, é um sintoma. E começará a ser atacada pela
parte fiscal para forçar a queda dos juros. Tá. E os preços administrados
represados? Ele respondeu que é um absurdo o estímulo aos combustíveis fósseis.
Os que o ouviram saíram de lá com a impressão de que ele defende um tarifaço de
cara para retomar a credibilidade…
Os "vocalizadores" de Marina também acham que o
câmbio está valorizado de maneira artificial, e se supõe, então, que a turma
pretenda trabalhar com um dólar mais fraco e um real mais forte. Não se sabe se
o mesmo discurso seria empregado com empresários do setor produtivo ligados à
exportação, por exemplo. Este tenderia a ficar assustado.
Os "sonháticos" acreditam que a reforma política é
a "mãe" de todas as reformas, mas pretendem começar com a tributária, que
simplifique a área, o que seria feito aos poucos, de forma fatiada. Eles também
declararam a sua adesão incondicional ao tripé macroeconômico: metas fiscais,
de inflação e câmbio flutuante.
No primeiro ano, eles dizem, a meta de inflação
poderia ser um pouco maior do que os 4,5%, mas sempre declinante. O
empresariado seria ainda convocado para uma espécie de mutirão da
infraestrutura, e a categoria deixaria de ser "tratada como bandida". Falou-se
até em rever a postura "perversa e autoritária" da Receita Federal. Ah, sim:
como eles gostam duma reunião, seria criado um "Conselho de Responsabilidade
Fiscal", com vários setores da sociedade.
E na política?
Bem, nessa área o bicho pega, e a coisa vai ficando
nebulosa, mas todos já estavam encantados com as promessas na área econômica. O
negócio é o seguinte: os "sonháticos" acreditam que a vitória de Marina vai
acarretar uma profunda reestruturação partidária no país. Não! Ela não estaria
preocupada nem com o PSB nem com a Rede. Apelaria, para usar uma expressão lá
empregada, a um "banco de reservas" do PT, do PSDB e de outros partidos. Querem
fazer uma reforma política com unificação das eleições, mandatos de cinco anos
e fim da reeleição para cargos executivos.
Comitê de Busca dos Homens de Bem
Afinal, eles asseguram, na "nova política", as ferramentas são as mesmas, mas o jeito é outro. Os "vocalizadores" indagaram por que não poderiam escolher os quadros pelo currículo, em vez de falar com o Sarney. Para isso, pretendem criar um tal "Comitê de Busca dos Homens de Bem", expressão que foi empregada pela própria Marina na sua visita a Minas, nesta segunda. Isso seria sair da "democracia 1.0 para a democracia 2.0".
Afinal, eles asseguram, na "nova política", as ferramentas são as mesmas, mas o jeito é outro. Os "vocalizadores" indagaram por que não poderiam escolher os quadros pelo currículo, em vez de falar com o Sarney. Para isso, pretendem criar um tal "Comitê de Busca dos Homens de Bem", expressão que foi empregada pela própria Marina na sua visita a Minas, nesta segunda. Isso seria sair da "democracia 1.0 para a democracia 2.0".
A turma quer fazer as reformas política,
tributária, fiscal, da Previdência e do Estado. Mas com que Congresso? Feldman
assegurou que diversos parlamentares já procuram os "marineiros" em nome dessa
relação programática e que será criada uma frente suprapartidária. Talvez não
se dando conta exatamente do que falava, Beto Albuquerque, o candidato a vice,
lembrou que o "baixo clero" sempre se aproxima de quem vence… Nem diga!
No mais, darão, sim, importância ao pré-sal;
saberão compatibilizar ambientalismo com agronegócio; pretendem fixar metas
para cada área; querem um Estado como protagonista da saúde, educação e
segurança - para o resto, contam a com a iniciativa privada -; educação pública
em tempo integral e melhoria do SUS, com correção das ineficiências. Nesse
paraíso, só ficam faltando, como se vê, a cobra e a maçã. Ou será que não?
Todos saíram de lá muito impressionados e achando
que Marina, se eleita, será "pró-business". Houve quem afirmasse que a conversa
lembra, assim, uma "Terceira Via" à moda Tony Blair: amigo dos mercados, mas
com um sotaque social.
É… Em 1997, Blair pôs fim a 18 anos de governo
conservador na Grã-Bretanha. Em 1995, na liderança do Partido Trabalhista, ele
fez mudar o conteúdo da famosa Cláusula IV, que havia sido redigida em 1917,
ano da Revolução Russa, e que compunha o programa do partido desde 1918. Se
vocês clicarem aqui, terão acesso às duas versões. A original
afirmava que os operários só seriam donos de seu trabalho e dele poderiam
usufruir plenamente com o fim da propriedade privada. Isso acabou.
Ou por outra: Blair mudou o programa do partido,
fortaleceu-o, disputou eleições e venceu. Do outro lado, estavam os
conservadores não menos fortes e organizados. O plano de Marina, como a gente
vê, também expressa uma conversão aos valores de mercado - e isso é bom! -, mas
os seus "vocalizadores" dizem que ela vai governar com os bons, apelando a um
Comitê de Busca dos Homens de Bem e apostando numa profunda reorganização
partidária. Pretende, assim, fazer aquela penca de reformas.
Eu, que sou apenas um ucraniano preocupado,
pergunto: alguém já combinou com os russos?
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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