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sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

O relevante e o irrelevante no cinema

Perde-se muito da espontaneidade de uma obra de arte quando é preciso justificar uma função para ela. 


Josias Teófilo para a Crusoé:

Critica-se no cinema brasileiro a inexistência de filmes sobre temas e personagens importantes da nossa história.
Com efeito, não existe nenhum filme sobre Dom Pedro II, Carlos Gomes, Gilberto Freyre, ou sobre a Invasão Holandesa, a Guerra do Paraguai, e por aí vai.
Mas existe também o problema oposto: faltam filmes sobre temas banais ou irrelevantes, ou sobre temas absurdos.
Os dois tipos de problemas, na verdade, têm uma origem comum que é a falta de maturidade da indústria cinematográfica brasileira, que deveria ter uma diversidade muito maior de temas - relevantes e irrelevantes, banais e profundos, etc.
A cultura dos editais, implantada durante os governos do PT, criou a necessidade de dar uma justificativa social para cada projeto cultural.
Perde-se muito da espontaneidade de uma obra de arte quando é preciso justificar uma função para ela, ainda mais uma função social.
Escrevi que gostaria de fazer documentários sobre temas totalmente irrelevantes. Por exemplo, a história do karatê em João Pessoa, na Paraíba.
Ou a história do movimento punk em Belém do Pará.
Ou sobre filmagens de casamentos no Brasil nos anos 1970.
Ou sobre a história de algum sujeito que é um hare krishna solitário morando numa cidade do interior.
Teria que ser um projeto bem realizado, com pesquisa e um cuidado especial com imagens de arquivo, e o resultado poderia ser um filme bastante relevante sobre um tema irrelevante.
Espero um dia poder fazer projetos desse tipo - a dificuldade, evidentemente, é conseguir patrocinadores, estatais ou privados, para um projeto assim, por motivos óbvios.
O jornalismo padece do mesmo problema do cinema: estamos saturados do bombardeio de temas relevantes e urgentes.
Daí a importância do ensaio, da crônica e da coluna de opinião, para nos chamar atenção a coisas que não notaríamos normalmente – é por isso que gosto tanto das colunas de Alexandre Soares Silva aqui na Crusoé.
No audiovisual, é difícil fazer algo parecido como crônica ou ensaio porque tudo custa caro.
E para conseguir o dinheiro é preciso atrair patrocinadores, que são atraídos em geral pelos temas dos filmes. Não deveria ser assim.
Grandes filmes da história do cinema foram feitos sobre temas que não chamariam a nossa atenção normalmente.
O cineasta John Carpenter é especialista em fazer filmes assim: The Fog, por exemplo, trata de uma névoa assassina, Christine trata de um Plymonth Fury, o carro de 1956, que mata os próprios donos, Big Trouble in Little China trata da história de Jack Burton, um sujeito que ajuda o amigo chinês a resgatar no bairro chinês sua amada, uma chinesa de olhos verdes.
Se John Carpenter tivesse contado as ideias de filmes para mim eu teria dito para ele não fazê-los – os plots não parecem de jeito nenhum de filmes bem sucedidos, mas são.
No cinema documentário brasileiro temos bons exemplos de filmes com temas totalmente irrelevantes: João Moreira Salles fez um filme que parte das anotações do mordomo de sua família da genealogia de famílias nobres da Europa (Santiago, 2007), Eduardo Coutinho fez filmes sem tema algum, apenas entrevistando pessoas e vendo o que sairia dali – muita coisa boa saiu, sem a pretensão de grandes temas.
O contrário também tem acontecido: filmes com grandes temas, temas que tem “função social”, geralmente não despertam o interesse de ninguém – muitos nem chegam a serem exibidos, são feitos e vão para a gaveta, outros são feitos, passam em festival e nunca mais são vistos.

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