Por Reinaldo Azevedo
No dia em que Deus
distribuiu a habilidade política, Dilma Rousseff não entrou na fila. Estava
muito ocupada estudando o ciclo de reprodução da mosquita e a civilização
derivada da cultura da mandioca.
Quem foi a primeira
pessoa no governo que falou a palavra "impeachment" em público? Dilma! Quem
concedeu uma entrevista coletiva nesta sexta para assegurar que não renuncia?
Ora, Dilma!
Vale dizer: a presidente
está pensando em renunciar.
Ela afirmou uma coisa
óbvia e outra errada - como sempre, tenta a síntese de paradigmas que não se
cruzam.
A coisa óbvia: "A
renúncia é um ato voluntário". Concordo. Ninguém pode fazê-lo em lugar de
outro. Só uma antiga Constituição da Bolívia proibia o governante de cair fora
voluntariamente…
Agora a coisa errada: "Aqueles que querem a renúncia estão reconhecendo que não há uma base real para
pedir o impeachment". Trata-se de uma bobagem brutal. É como dizer que Nixon
renunciou em 1973 porque não corria o risco de cair…
Eu fui o primeiro na
imprensa a sugerir a renúncia apenas porque isso abreviaria o sofrimento do
povo brasileiro. Como de hábito, o raciocínio da presidente não faz o menor
sentido.
Mais uma vez, ela evocou
a memória da militante de um grupo terrorista para justificar o presente.
Indagada sobre uma suposta resignação diante do inevitável, afirmou: "Vocês
acham que eu tenho cara de estar resignada? Que eu tenho gênio de estar
resignada? Fui presa e torturada por minhas convicções. Não estou resignada
diante de nada, não tenho essa atitude diante da vida e acredito que é por isso
que represento o povo brasileiro".
Vamos pôr os pingos nos
is. Foi feita presidente pela segunda vez pela maioria relativa dos eleitores,
mas já não representa o povo brasileiro, que a quer fora do poder.
Mais: deveria ter dito
que foi torturada - o que é uma barbaridade em si - por suas convicções à
época. Ou acaba sugerindo que as mantém ainda hoje, o que seria lamentável, não
é mesmo?
De resto, naqueles
tempos, havia uma ditadura no Brasil da qual Dilma discordava. Ela queria outra
ditadura. Se renunciasse hoje, ela o faria numa democracia. E só seria levada a
tanto porque seu partido tentou conspurcar o regime democrático com convicções
cleptoditatoriais.
Num dado momento,
confrontada de novo com a questão da renúncia, disse achar a pergunta "ofensiva". Dilma chegou a esses fabulosos resultados no governo ofendendo-se
fácil com perguntas… Afinal, ela é a mulher das respostas, certo?
Finalmente, foi ambígua
sobre Lula ser ou não ministro. Tergiversou. Ou por outra: se ele quiser, ele
será. E assumirá o ministério que lhe der na telha.
Síntese: Lula já deu o
golpe. Ele está no comando, e ela é um títere de um sujeito acossado por seu
passado, do qual ela própria é mera derivação.
A gente só sugere
renúncia porque o governo já acabou. Mas que não renuncie, então. Que seja
impichada se lhe parece mais digno.
Fonte: http://veja.abril.com.br/
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