Por Reinaldo Azevedo
O conteúdo da fala da presidente Dilma Rousseff na
entrevista - chamada "sabatina" sei lá por quê - concedida ao Estadão nesta
segunda não faz sentido. Entre muitas outras razões porque afronta a lógica. Eu
sei que a presidente não chega a ser, assim, um Cícero da retórica, mas o fato
é que as palavras fazem sentido mesmo para ela. Leiam o que disse sobre a
roubalheira na Petrobras: "Se houve alguma coisa, e tudo indica que houve, eu
posso te garantir que todas, vamos dizer assim, as sangrias que eventualmente
pudessem existir estão estancadas".
Como é que a presidente pode dar por resolvido um
problema cuja existência ela assegurou ignorar e, ainda hoje, diz não ter a
certeza se existiu? Vou empregar a mesmíssima estrutura a que ela recorreu para
demonstrar o absurdo da fala: "Leitores, se houve alguns marcianos
tentando ocupar a Terra, e tudo indica que houve, eu posso lhes assegurar que
todas, vamos dizer assim, as ameaças que eventualmente pudessem existir estão
eliminadas".
Pergunto: vocês confiariam em mim?
E, assim, vocês podem ir mudando o conteúdo da fala
a seu bel-prazer. Sempre fará sentido e nunca fará sentido. Sabe o que isso
quer dizer? Nada! Mas podemos avançar um pouco mais. Até agora, quem começou a
investigar só um pouquinho da caixa-preta da Petrobras foi a Polícia Federal.
Dilma disse ter estancado a sangria. Cadê os demitidos? Onde estão os punidos?
Uma sangria, para ser estancada, tem de ter existido. Cadê o resultado da
apuração? A Petrobras é uma empresa mista, com ações na Bolsa. O que ela está
escondendo dos acionistas? Não por acaso, ontem, as ações ON da estatal caíram
4,79%, e as PN, 4,91%. Chega a ser espantoso que uma presidente da República
faça raciocínio tão especioso.
Segundo Paulo Roberto Costa, a compra da refinaria
de Pasadena rendeu ganhos à máfia e fez parte do esquema que acabou
privilegiando os partidos políticos. Muito bem! Dilma afirmou que o conselho
tomou decisões sobre a refinaria ancorado em informações falhas, deficientes,
imprecisas. Certo. Revelado o desastre, já na Presidência da República, ela fez
o quê? Nomeou Nestor Cerveró, considerado o principal responsável pela
aquisição da empresa americana, para a direção financeira da BR Distribuidora.
Não, senhores! Ninguém está querendo 'culpar' Dilma
Rousseff só porque ela é presidente da República. Ou porque, antes, ocupava a
presidência do Conselho da empresa. Ou porque, desde 2003, era tida como a
grande chefe do setor energético. Não se trata de um processo de
responsabilização objetiva. Estamos a falar de outra coisa: chama-se
responsabilidade política, presidente! A sua inação ao longo desse tempo dá
testemunho, quando menos, da inapetência para o cargo que ocupa.
De resto, não dá para ignorar a pesada máquina
oficial mobilizada para impedir qualquer forma de investigação - máquina esta
que não poupou o Congresso ou o TCU. Diante das evidências escancaradas de
malfeitos na empresa, a presidente preferiu ficar lançando suspeitas sobre
fatos passados - e voltou a fazê-lo na entrevista ao Estadão. Falou de novo
sobre o afundamento da plataforma P-36, da Petrobras: "Você acha que é
tranquilo uma plataforma que custa US$ 1,5 bi afundar? E ninguém investigar? A
plataforma de US$ 1,5 bi, quero lembrar, é duas vezes Pasadena."
Bem, se a conta fosse essa, lembro que só o custo
adicional da refinaria de Abreu e Lima - foi orçada em US$ 2,5 bilhões e já
está em US$ 18 bilhões - corresponde a dez plataformas. Mas a questão,
obviamente, não é essa. Dilma vive sugerindo que um grande crime aconteceu em
março de 2001. É mesmo? Então o PT está no poder há 12 anos; Dilma foi ministra
das Minas e Energia, gerontona da infraestrutura e presidente do conselho da
Petrobras e não fez nada? Das duas uma: a) ou crime houve, e ela prevaricou; b)
ou crime não houve, e ela fala só com o ânimo de atacar gratuitamente o governo
FHC. Adivinhem qual é a resposta.
A presidente, não a candidata, está agora obrigada
a vir a público para esclarecer onde estavam "as sangrias" (sic) da Petrobras,
quais foram as medidas que ela tomou e que tipo de punição aplicou aos
responsáveis. Ou ela nos explica, ou seremos obrigados a concluir que falou o
que lhe deu na telha, sem nenhum compromisso com os fatos. E isso é muito ruim
para quem comanda o país.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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