Por Reinaldo Azevedo
Ai,
ai, ai, ai…
Leio
notinha no Estadão informando que a cantora Daniela Mercury, aquela que
anunciou que agora tem "esposa", vai desfilar com seu trio elétrico e cantar o
Hino Nacional da Parada Gay de São Paulo.
Até aí,
tudo certo! É compreensível que ela tenha se tornado um "ícone" - como se diz
hoje em dia nos cadernos de cultura até quando se escreve sobre falador de rap… - do movimento gay. Há quem diga que Daniela foi "supercorajosa" ao assumir a
sua homossexualidade e coisa e tal. Por mim, está tudo bem.
O que
é absolutamente inacreditável, escandaloso mesmo, é saber que o governo da
Bahia, do companheiro Jaques Wagner (PT), é que vai pagar o cachê da cantora:
R$ 120 mil.
Então
vamos ver. Daniela decide anunciar ao Brasil que é lésbica. Ninguém ficou
chocado, o que é bom. Ainda que isso só diga respeito a ela mesma, achou que
todos deveríamos participar de sua celebração. OK. O mínimo que a gente espera
dos heróis de qualquer causa é algum sacrifício ou renúncia, não é mesmo? Isso
é próprio da condição.
Não
existe heroísmo no estado de gozo permanente. Aliás, em termos, digamos,
psicanalíticos, esse gozo permanente seria a negação da civilização. Mas
deixemos de lado essas especulações agora. Daniela vai subir no palco, ser
ovacionada por sua coragem e… levar R$ 120 mil dos cofres públicos baianos.
Ou por
outra: o governo da Bahia estatizou o lesbianismo e fez de Daniela a sua
representante. O que deveria ser, então, um ato de resistência contra, sei lá,
os caretas, os conservadores, os reacionários, os cultores do tradicional "papai-e-mamãe" (em vez do "mamãe-e-mamãe" e "papai-e-papai"), vejam que
coisa!, se transforma em oficialismo dos mais reacionários - e agora entendo
que Daniela Mercury não tenha chamado a sua mulher de "mulher", mas de "esposa". Já contei aqui que, tão logo assumi um cargo de chefia num jornal,
aboli essa palavra. Eu jamais transaria com a minha "esposa". A gente transa
(Daniela também) é com mulher, certo?
Está
aí. Tenho escrito alguns textos sobre o caráter que o Bolsa Família vai
assumindo no Brasil. Dissemina-se a cultura de que a função do bom patriota é
esperar que o estado lhe forneça renda, moradia, emprego, roupa,
anticoncepcional, camisinha, pílula do dia seguinte, aborto. Até a homossexualidade,
como se nota, tem de ser estatizada - e lembro que a Parada Gay já conta com
farto financiamento público.
"Ah,
mas Daniela terá custos…" Pois que recorra à iniciativa privada se não tiver
como bancar a própria apresentação - ela poderia fazer esse sacrifício porque
isso é próprio dos heróis, reitero.
Notem
bem: ainda que a grana fosse paga para ela se apresentar na parada gay de
Salvador, já estaríamos diante de um completo absurdo. Sendo realizada a festa
fora da Bahia, aí já é um escracho. Ou ela virou agora embaixadora do
lesbianismo baiano?
O
Brasil é mesmo singular, é mesmo curioso - e há uma grande chance de que não dê
certo por isso. Antes mesmo de a homossexualidade ser encarada pela maioria dos
brasileiros como algo normal, corriqueiro, já virou uma espécie de crença do
Estado. E, no Brasil, isto já é uma tradição que sempre resulta em zerda,
o Estado tem a ambição de fundar a sociedade, em vez de a sociedade fundar o
Estado, que é o caminho normal . Se não me engano, Daniela tem uma música que
diz algo mais ou menos assim: "O canto desta cidade é meeeuuu!!!". Já
pode começar a cantar: "O cofre da Bahia é meeeuuu…"
O
Brasil ainda vai inventar o gay e a lésbica de crachá.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"