Por Reinaldo Azevedo
Há uma coisa curiosa no Brasil: não temos partidos conservadores, não temos comentaristas conservadores na TV, quase não temos jornalistas conservadores. Por alguma razão que se quer metafísica - mas que, obviamente, faz parte da guerra de valores -, considera-se que o centro é a esquerda; vale dizer: a esquerda é o ponto de referência, aquele onde estariam a neutralidade e a isenção. Assim, o não-esquerdista, para começo de conversa, se torna necessariamente “de direita”, ainda que não seja, e um eventual direitista - da direita democrática, do tipo que só aceita o poder instituído por eleições livres, onde prevalece o estado de direito - se torna, então, um anátema, um maldito, um ser tomado por alguma grave deformidade moral.
O Portal G1 de sexta-feira, 4, trazia um texto com o seguinte título e destaque na homepage (ainda lá enquanto escrevo): "Comentarista da Fox News chama Dilma de 'ex-comunista e ex-terrorista'". Pois bem, o texto era o que segue. Peço que vocês o leiam. Volto em seguida:
*
O comentarista conservador Glenn Beck chamou a presidente Dilma Rousseff de "ex-comunista e ex-terrorista" em seu programa desta quinta-feira (3) na emissora Fox News, dos Estados Unidos. A Secretaria de Imprensa da Presidência da República informou que não iria se manifestar sobre as declarações do apresentador norte-americano. Beck fez a afirmação no contexto de um comentário sobre a atual crise política no Egito. "Vocês lembram quando eu falei a vocês sobre o Brasil. Eles elegeram uma ex-comunista e ex-terrorista, que esteve na prisão por um tempo", afirmou o comentarista.
Segundo Beck, "os comunistas acham que as pessoas do Brasil são estúpidas. Eles acabaram de anunciar e votar ontem [2] uma emenda sobre a busca da felicidade como objetivo a ser alcançado". A proposta de emenda constitucional apelidada de PEC da Felicidade, de autoria do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado em novembro passado. Para alterar a Constituição, no entanto, tem de ser aprovada por três quintos dos senadores (49 votos) e três quintos dos deputados (308 votos) em duas votações em cada casa legislativa.
Beck disse que a busca da felicidade do projeto brasileiro foi inspirada pelo texto da declaração de independência dos Estados Unidos. "A mídia saudou como democracia". "Ohh, não é formidável? É praticamente Thomas Jefferson", disse, em referência ao terceiro presidente norte-americano, autor de grande parte do texto da declaração.
O apresentador afirma que a ideia de felicidade expressa no projeto brasileiro poderia ser entendida como "a garantia de renda, moradia, empregos", mas que esses mesmos objetivos estavam expressos na antiga constituição soviética. "Você lê que a felicidade nessa nova emenda à Constituição significa a garantia de renda, moradia, empregos, uau! [...]. Eu li a constituição comunista soviética, que garante direitos a trabalho, descanso, lazer, proteção à saúde, cuidados aos idosos, aos doentes, moradia, educação, benefícios culturais. Quase como a busca pela felicidade, de uma forma distorcida", declarou.
Então, Beck passa a criticar a proposta brasileira, o comunismo e as manifestações no Egito pela queda do ditador Hosni Mubarak.
"Você vê o que eles fizeram. Ele estão pegando ideias horríveis do comunismo. Assistência não produz nada a não ser miséria, pobreza e o massacre de dezenas de milhões de pessoas, centenas de milhões globalmente, embaladas em democracia, república, Thomas Jefferson. Eles pensam que você é retardado. Isso não é uma revolução no Egito. Isso é uma revolução socialista islâmica no Egito. Não tem nada a ver com democracia", afirmou.
Cristovam Buarque
Autor da PEC 19/10, que ficou conhecida como PEC da Felicidade, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) criticou a forma como a proposta foi tratada pelo comentarista. "Essa Fox é uma idiota completa. Quem olha com cuidado a proposta vê que não é nada disso", afirmou o senador. Buarque disse que se inspirou na Constituição Americana para elaborar a proposta que, segundo ele, prevê que saúde, educação e segurança sejam direitos sociais essenciais para a busca da felicidade. "Para se ter felicidade, não basta apenas ter os direitos. Na visão capitalista estúpida da Fox, basta ter US$ 40 mil dólares por mês para ser feliz", criticou o senador.
Diante das polêmicas, Buarque afirmou que está estudando a possibilidade de substituir a atual PEC que já está em tramitação no Senado - e que já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça - por outra, a fim de que o apelido de PEC da Felicidade seja modificado. Segundo ele, a denominação foi algo que surgiu na mídia, e que acabou tornando a proposta como algo negativo.
"Acho que vamos ter de tirar essa PEC e começar de novo. Eu fico com uma imagem péssima se colocar a tal PEC da Felicidade na Constituição. Eu estou estudando substituir esta PEC por outra chamada PEC da Humanização dos Direitos Sociais", disse. O senador ainda afirmou que, enquanto o apelido da PEC se mantiver, ele fará o possível que não seja votada. "Eu vou fazer o possível para que não vá para a pauta do dia para evitar novos transtornos", disse
Voltei
Vamos começar do começo. Glenn Beck é considerado uma besta-fera pelos politicamente corretos dos EUA e pelo Partido Democrata. É dono de algumas grandes tiradas. Nem sempre dá para concordar. Mas, às vezes, eu discordo de uma coisa ou outra até do próprio Cristo - provavelmente por obtusidade minha, mas é assim. Beck costuma chamar as coisas pelo nome, o que é um mérito, mesmo quando está errado. Noto que o G1 houve por bem destacar que o comentarista da Fox chamou Dilma Rousseff de "ex-comunista e ex-terrorista". É mesmo?
E ela não era? Que tenha sido comunista, eis algo absolutamente inegável, incontestável, factual, jamais negado por ela própria e, obviamente, pelos comunistas, que consideram isso um valor, uma qualidade, algo que devemos apreciar. Assim, o que se atribui a Beck com ar de certo escândalo é não mais do que referencial. E o mesmo se diga quanto à outra caracterização. Beck não disse que Dilma é terrorista ainda hoje - e ela efetivamente não é. Mas ela foi, já que participou de organizações que praticavam atos terroristas. Quanto ao resto…
Essa tal felicidade
Já escrevi sobre essa tal PEC da felicidade no dia 10 de novembro do ano passado. Trata-se de uma bobagem monumental do senador Cristovam Buarque. Atribuir uma inspiração soviética no sentido de que ele tinha em mente aquele modelo quando redigiu seu texto é certamente impreciso, tanto quanto é absolutamente verdadeiro que a União Soviética escreveu a mais generosa das Constituições - embora tenha implementado um regime de horror. Sob a inspiração de tantos "direitos", morreram uns 40 milhões de pessoas. Alguns dirão que isso ainda foi pouco se o preço era fazer o novo homem.
Quanto ao Egito, eu jamais diria que se trata de "uma revolução socialista islâmica" porque inexiste socialismo islâmico. O islamismo é incompatível com as esquerdas - que, não obstante, passaram a incensá-lo porque considerado um aliado estratégico contra os EUA. Mas essa bobagem de Beck não é maior do que sustentar que se trata de um movimento espontâneo, de que as armas foram o Facebook e o Twitter.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
O Portal G1 de sexta-feira, 4, trazia um texto com o seguinte título e destaque na homepage (ainda lá enquanto escrevo): "Comentarista da Fox News chama Dilma de 'ex-comunista e ex-terrorista'". Pois bem, o texto era o que segue. Peço que vocês o leiam. Volto em seguida:
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O comentarista conservador Glenn Beck chamou a presidente Dilma Rousseff de "ex-comunista e ex-terrorista" em seu programa desta quinta-feira (3) na emissora Fox News, dos Estados Unidos. A Secretaria de Imprensa da Presidência da República informou que não iria se manifestar sobre as declarações do apresentador norte-americano. Beck fez a afirmação no contexto de um comentário sobre a atual crise política no Egito. "Vocês lembram quando eu falei a vocês sobre o Brasil. Eles elegeram uma ex-comunista e ex-terrorista, que esteve na prisão por um tempo", afirmou o comentarista.
Segundo Beck, "os comunistas acham que as pessoas do Brasil são estúpidas. Eles acabaram de anunciar e votar ontem [2] uma emenda sobre a busca da felicidade como objetivo a ser alcançado". A proposta de emenda constitucional apelidada de PEC da Felicidade, de autoria do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado em novembro passado. Para alterar a Constituição, no entanto, tem de ser aprovada por três quintos dos senadores (49 votos) e três quintos dos deputados (308 votos) em duas votações em cada casa legislativa.
Beck disse que a busca da felicidade do projeto brasileiro foi inspirada pelo texto da declaração de independência dos Estados Unidos. "A mídia saudou como democracia". "Ohh, não é formidável? É praticamente Thomas Jefferson", disse, em referência ao terceiro presidente norte-americano, autor de grande parte do texto da declaração.
O apresentador afirma que a ideia de felicidade expressa no projeto brasileiro poderia ser entendida como "a garantia de renda, moradia, empregos", mas que esses mesmos objetivos estavam expressos na antiga constituição soviética. "Você lê que a felicidade nessa nova emenda à Constituição significa a garantia de renda, moradia, empregos, uau! [...]. Eu li a constituição comunista soviética, que garante direitos a trabalho, descanso, lazer, proteção à saúde, cuidados aos idosos, aos doentes, moradia, educação, benefícios culturais. Quase como a busca pela felicidade, de uma forma distorcida", declarou.
Então, Beck passa a criticar a proposta brasileira, o comunismo e as manifestações no Egito pela queda do ditador Hosni Mubarak.
"Você vê o que eles fizeram. Ele estão pegando ideias horríveis do comunismo. Assistência não produz nada a não ser miséria, pobreza e o massacre de dezenas de milhões de pessoas, centenas de milhões globalmente, embaladas em democracia, república, Thomas Jefferson. Eles pensam que você é retardado. Isso não é uma revolução no Egito. Isso é uma revolução socialista islâmica no Egito. Não tem nada a ver com democracia", afirmou.
Cristovam Buarque
Autor da PEC 19/10, que ficou conhecida como PEC da Felicidade, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) criticou a forma como a proposta foi tratada pelo comentarista. "Essa Fox é uma idiota completa. Quem olha com cuidado a proposta vê que não é nada disso", afirmou o senador. Buarque disse que se inspirou na Constituição Americana para elaborar a proposta que, segundo ele, prevê que saúde, educação e segurança sejam direitos sociais essenciais para a busca da felicidade. "Para se ter felicidade, não basta apenas ter os direitos. Na visão capitalista estúpida da Fox, basta ter US$ 40 mil dólares por mês para ser feliz", criticou o senador.
Diante das polêmicas, Buarque afirmou que está estudando a possibilidade de substituir a atual PEC que já está em tramitação no Senado - e que já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça - por outra, a fim de que o apelido de PEC da Felicidade seja modificado. Segundo ele, a denominação foi algo que surgiu na mídia, e que acabou tornando a proposta como algo negativo.
"Acho que vamos ter de tirar essa PEC e começar de novo. Eu fico com uma imagem péssima se colocar a tal PEC da Felicidade na Constituição. Eu estou estudando substituir esta PEC por outra chamada PEC da Humanização dos Direitos Sociais", disse. O senador ainda afirmou que, enquanto o apelido da PEC se mantiver, ele fará o possível que não seja votada. "Eu vou fazer o possível para que não vá para a pauta do dia para evitar novos transtornos", disse
Voltei
Vamos começar do começo. Glenn Beck é considerado uma besta-fera pelos politicamente corretos dos EUA e pelo Partido Democrata. É dono de algumas grandes tiradas. Nem sempre dá para concordar. Mas, às vezes, eu discordo de uma coisa ou outra até do próprio Cristo - provavelmente por obtusidade minha, mas é assim. Beck costuma chamar as coisas pelo nome, o que é um mérito, mesmo quando está errado. Noto que o G1 houve por bem destacar que o comentarista da Fox chamou Dilma Rousseff de "ex-comunista e ex-terrorista". É mesmo?
E ela não era? Que tenha sido comunista, eis algo absolutamente inegável, incontestável, factual, jamais negado por ela própria e, obviamente, pelos comunistas, que consideram isso um valor, uma qualidade, algo que devemos apreciar. Assim, o que se atribui a Beck com ar de certo escândalo é não mais do que referencial. E o mesmo se diga quanto à outra caracterização. Beck não disse que Dilma é terrorista ainda hoje - e ela efetivamente não é. Mas ela foi, já que participou de organizações que praticavam atos terroristas. Quanto ao resto…
Essa tal felicidade
Já escrevi sobre essa tal PEC da felicidade no dia 10 de novembro do ano passado. Trata-se de uma bobagem monumental do senador Cristovam Buarque. Atribuir uma inspiração soviética no sentido de que ele tinha em mente aquele modelo quando redigiu seu texto é certamente impreciso, tanto quanto é absolutamente verdadeiro que a União Soviética escreveu a mais generosa das Constituições - embora tenha implementado um regime de horror. Sob a inspiração de tantos "direitos", morreram uns 40 milhões de pessoas. Alguns dirão que isso ainda foi pouco se o preço era fazer o novo homem.
Quanto ao Egito, eu jamais diria que se trata de "uma revolução socialista islâmica" porque inexiste socialismo islâmico. O islamismo é incompatível com as esquerdas - que, não obstante, passaram a incensá-lo porque considerado um aliado estratégico contra os EUA. Mas essa bobagem de Beck não é maior do que sustentar que se trata de um movimento espontâneo, de que as armas foram o Facebook e o Twitter.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
Um comentário:
Também nuna entendi no que a tal PEC da Felicidade faria diferença na vida das pessoas. Cristovam Buarque se deu mal nessa. E até o petista Suplicy, na carona, escreveu um livro, se não me engano, falando do mesmo assunto, distribuição de renda e por aí. Todos êles devem ter ído na mesma fonte...e não vejo nada de mais em Beck a rotular de ex-isto e ex-aquilo. se ela realmente foi terrorista, guerrilheira,etc. Melhor deixar quieto, porque, como dizem, M quanto mais mexe, mais...
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