Por Reinaldo Azevedo
Consta que as relações entre a
presidente Dilma Rousseff e o marqueteiro João Santana já viveram dias
melhores. Não sei qual a razão da rusga. Mas cabe à presidente não ser ingrata.
Santana deu a melhor embalagem que podia a uma formidável coleção de
imposturas. A combinação desse profissional sem dúvida competente com o partido
poderia ser esta: "Eu contarei as mentiras de vocês de um modo que
parecerão verdades inquestionáveis". E deu certo para eles. E deu errado
para o país. Dilma obteve o segundo mandato.
A
Desaparecida do Cerrado voltou a dar as caras nesta terça na maior reunião
ministerial do mundo, realizada na Granja do Torto. Proibiu a presença de
assessores dos ministros. Faz sentido. Ou teria de fazer o encontro no estádio
Mané Garrincha. Parafraseio o "Poema de Sete Faces", de Drummond,
para a presidente de duas caras:
"Pra que tanto ministro, meu
Deus?, pergunta o meu coração.
O homem atrás do bigode
é o Mercadante"
Abro este texto falando de João
Santana. E volto a ele. Dilma deu uma recomendação clara a seus ministros no
discurso (íntegra aqui) que abriu a reunião, prestem atenção:
"Nós devemos enfrentar o
desconhecimento, a desinformação sempre e permanentemente. Vou repetir: sempre
e permanentemente. Nós não podemos permitir que a falsa versão se crie e se
alastre. Reajam aos boatos, travem a batalha da comunicação, levem a posição do
governo à opinião pública, a posição do ministério. Sejam claros, sejam
precisos, se façam entender. Nós não podemos deixar dúvidas."
Para uma turma viciada em marquetagem,
tudo se resolve mesmo numa batalha de comunicação. Entendo. Houve certa feita
um senhor que cravou uma frase realmente notável: "Um bom governo sem
propaganda dificilmente se sai melhor do que uma boa propaganda sem um bom
governo. Um tem que complementar o outro." Seu nome era Goebbels. O
discurso a que me refiro está aqui.
A
presidente que não quer que a falsa versão se alastre afirmou o seguinte:
"As medidas que estamos tomando e
que tomaremos, elas vão consolidar e ampliar um projeto vitorioso nas urnas por
quatro eleições consecutivas e que estão, essas medidas, ajudando a transformar
o Brasil. Como disse na cerimônia de posse, as mudanças que o país espera, que
o país precisa para os próximos quatro anos dependem muito da estabilidade e da
credibilidade da economia. Nós precisamos garantir a solidez dos nossos
indicadores econômicos."
Que "projeto" venceu nas
urnas? O da elevação de tarifas, o dos juros altos, o da mudança do seguro
desemprego, o da recessão? Já escrevi, reitero e não vou desistir de lembrar: a
petista acusava seus adversários de ter essas intenções. Afirmar que o que está
em curso é congruente com o que prometeu em campanha chega a ser ofensivo. A
menos que passemos a adotar a perspectiva do presente eterno, conformados em
ter o PT como nosso guia. Assim, ficaria definido que o partido estará sempre
no governo e que tudo o que fizer concorre para o bem porque, afinal, busca
fortalecer o… próprio partido. Os petistas resolveram, para nosso espanto,
piorar Gobbels: "Precisamos é de uma boa propaganda, não de um bom
governo".
A presidente que quer "enfrentar o
desconhecimento e a desinformação" atribui as dificuldades do país a
"dois choques": o externo e o interno. O primeiro seria marcado pelo
crescimento menor da China e pela estagnação de Europa e Japão, associados à
queda de preço das commodities. Poderia me alongar, mas serei breve: ela teria
de explicar por que a maioria dos países da América Latina, para ficar por
aqui, cresce mais do que o Brasil. Nas terras nativas, ela vê um choque de
alimentos derivado do regime de chuvas, que também traz impactos na água e na
energia. E pronto.
A líder que pede que se faça a guerra
de propaganda apresenta um diagnóstico que 10 entre 10 pessoas que já venceram
o "desconhecimento e a desinformação" - que lhe deram o segundo
mandato, note-se - sabem ser falso.
Leiam
a íntegra do discurso. Há muitas outras tolices, mas destaco mais uma. Referindo-se
ao escândalo do petrolão, afirmou:
"Temos que continuar apostando na
melhoria da governança da Petrobras, aliás, de todas as empresas privadas e das
empresas públicas em especial. Temos de apostar num modelo de partilha para o
pré-sal, temos de dar continuidade à vitoriosa política de conteúdo local.
Temos que continuar acreditando na mais brasileira das empresas, a Petrobras.
(…) E queria dizer para vocês que punir, que ser capaz de combater a corrupção
não significa, não pode significar a destruição de empresas privadas também. As
empresas têm de ser preservadas, as pessoas que foram culpadas é que têm que
ser punidas, não as empresas."
Trata-se de uma mentira assentada sobre
bobagens. A mentira: ninguém está perseguindo empresas, mas criminosos. A bobagem
(também falaciosa): a política de conteúdo nacional não é vitoriosa. Ao
contrário: ela está se revelando desastrosa. A própria Dilma está querendo
enfiar R$ 10 bilhões de dinheiro público no setor naval.
Para encerrar: Dilma resolveu refazer
as promessas de 2011: "Lançaremos um Programa de Desburocratização e
Simplificação das Ações de Governo. Já iniciamos também a definição de uma nova
carteira de investimentos em infraestrutura. Nós vamos ampliar tanto as
concessões como as autorizações de infraestrutura ao setor privado. Vamos
continuar com as concessões de rodovias, com as autorizações e concessões em
portos e ampliar as concessões de aeroportos. Realizaremos concessões em outras
áreas, como hidrovias e dragagem de portos".
Ou por outra: se fizer o que diz que
vai fazer, estará cumprindo em oito anos o que prometeu fazer em quatro. Os
tempos que vêm por aí não serão nada fáceis.
Fonte: "Blog Reinaldo
Azevedo"