Por Reinaldo Azevedo
O PT nem inventou a corrupção
nem a inaugurou no Brasil. Mas só o partido ousou, entre nós, transformá-la
numa categoria de pensamento e numa teoria do poder. E isso faz a diferença. O
partido é caudatário do relativismo moral da esquerda. Na democracia, sua
divisa pode ser assim sintetizada: "Aos amigos tudo, menos a lei; aos
inimigos, nada, nem a lei". Para ter futuro, é preciso ter memória.
Eliana Tranchesi foi presa
em 2005 e em 2009. Em 2008, foi a vez de Celso Pitta, surpreendido em casa, de
pijama. Daniel Dantas, no mesmo ano, foi exibido de algemas. Nos três casos, e
houve uma penca, equipes de TV acompanhavam os agentes federais. A parceria
violava direitos dos acusados. Quem se importava? Lula batia no peito:
"Nunca antes na história deste país se prendeu tanto". Era a PF em
ritmo de "Os Ricos Também Choram".
Ainda que condenados em
última instância, e não eram, o espetáculo teria sido ilegal. Ai de quem
ousasse apontar, como fez este escriba (os arquivos existem), o circo
fascistoide! Tornava-se alvo da fúria dos "espadachins da reputação
alheia", era acusado de defensor de endinheirados. Procurem um só
intelectual petista --como se isso existisse...-- que tenha escrito uma linha
contra os exageros do "Estado repressor". Ao contrário! Fez-se, por
exemplo, um quiproquó dos diabos contra a correta 11ª Súmula Vinculante do STF,
que disciplinou o uso de algemas. "A direita quer algemar só os
pobres!", urravam.
Até que chegou a hora de a
trinca de criminosos do PT pagar a pena na Papuda. Aí tudo mudou. O gozo
persecutório cedeu à retórica humanista e condoreira. Acusam a truculência de
Joaquim Barbosa e a espetacularização das prisões, mas não citam, porque não
há, uma só lei que tenha sido violada. Cadê o código, o artigo, o parágrafo, o
inciso, a alínea? Não vem nada.
Essa mentalidade tem
história. Num texto intitulado "A moral deles e a nossa", Trotsky
explica por que os bolcheviques podem, e devem!, cometer crimes, inaceitáveis
apenas para seus inimigos. Ele imagina um "moralista" a lhe indagar
se, na luta contra os capitalistas, todos os meios são admissíveis, inclusive
"a mentira, a conspiração, a traição e o assassinato".
E responde:
"Admissíveis e obrigatórios são todos os meios, e só eles, que unam o
proletariado revolucionário, que encham seu coração com uma inegociável
hostilidade à opressão, que lhe ensinem a desprezar a moral oficial e seus
democráticos arautos, que lhe deem consciência de sua missão e aumentem sua
coragem e sua abnegação. Donde se conclui que nem todos os meios são
admissíveis".
O texto é de 1938. Dois
anos depois, um agente de Stalin infiltrado em seu séquito meteu-lhe uma
picaretada no crânio. Sinistra e ironicamente, a exemplo de Robespierre, ele
havia escrito a justificativa (a)moral da própria morte. Vejam ali. Conspirar,
mentir, trair, matar... Vale tudo para "combater a opressão". Só não
é aceitável a infidelidade à causa. Pois é...
José Dirceu quer trabalhar.
O "consultor de empresas privadas" não precisa de dinheiro. Precisa é
de um hotel. Poderia fazer uma camiseta: "Não é pelos R$ 20 mil!".
Paulo de Abreu, que lhe ofereceu o, vá lá, emprego, ganhou, nesta semana, o
direito de transferir de Francisco Morato para a avenida Paulista antena da sua
Top TV, informou Júlia Borba nesta Folha. O governo tomou a decisão contra
parecer técnico da Anatel, com quem Abreu tem um contencioso razoável. Dizer o
quê? Lembrando adágio famoso, os petistas não aprenderam nada nem esqueceram
nada.
Aos amigos, tudo, menos a
lei. Aos inimigos, José Eduardo Cardozo e Cade. É a moral deles.
Fonte: “Folha de S. Paulo”,edição desta sexta-feira, 29
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