Por Cesar Maia, na "Folha de S. Paulo", edição de sábado, 19
1. As primeiras medidas do governo Dilma em relação aos cortes nos gastos públicos, ao câmbio, aos juros e à política externa são apresentadas como herança recebida do governo Lula. São vistas como produto das distorções eleitorais relativas aos anos de 2009 e 2010. Por isso, sua abordagem cria no governo um certo constrangimento. Mas nada disso é problema. Ao contrário. Dilma aparece como mais centrada, mais racional e mais dedicada às questões administrativas, o que a eleva ao andar de cima do meio acadêmico, empresarial, jornalístico e político.
2. Com todos os desdobramentos relativos a essa herança, ela certamente não é o problema que Dilma e seu governo terão de enfrentar. Todas as pesquisas nos últimos anos, em relação às funções do governo, mostraram uma avaliação mais próxima do regular. Mas as mesmas pesquisas mostraram uma avaliação ótima de Lula. É como se o personagem que criou, inserido nas massas e confundido com elas, nada tivesse a ver com seu governo. Até o fato de a crise financeira de 2008/2009 não ter chegado aos países emergentes como chegou aos desenvolvidos foi percebido como efeito Lula.
3. Seus atos são sempre confundidos com seu populismo retórico. As inaugurações de pedras fundamentais eram percebidas como realizações, e a "caravana holiday" de seus comícios inaugurava nada, mas que -em outras partes do país, via satélite- era percebido como tudo.
4. Com o mensalão de 2005, Lula abandonou o uniforme de líder operário urbano e incorporou o jeito de líder retirante num populismo protorreligioso que tão bem se conhece Brasil afora, desde a segunda metade do século 19. Essa condição é que é a herança perversa. Nem Dilma nem nenhum outro nome cogitado no processo pré-eleitoral desde 2008 teria condições de parecer-se com o personagem criado e mitificado por Lula.
5. Todos sabem que o ano de 2011 será um ano de desconforto social, com a economia crescendo metade da de 2010, com inflação acima da meta, especialmente nos alimentos, e os juros mais altos. Há ainda a economia europeia desacelerada, a crise nos países árabes e seus reflexos etc e tal. Esse desconforto social se acentuará com a menor capacidade de compensação pelos Estados e municípios, maior desemprego, alguma reversão de expectativas e muito maior assanhamento dos políticos da base aliada e da oposição.
6. E o imaginário popular, tão acostumado ao estilo anterior, vai suspirar nas esquinas: "Ah, com Lula isso não estaria acontecendo". Nesse momento, a popularidade de Dilma despencará. E Lula correrá em seu auxílio, piorando a situação. Como disse Bertolt Brecht: "Infeliz a nação que precisa de heróis".
1. As primeiras medidas do governo Dilma em relação aos cortes nos gastos públicos, ao câmbio, aos juros e à política externa são apresentadas como herança recebida do governo Lula. São vistas como produto das distorções eleitorais relativas aos anos de 2009 e 2010. Por isso, sua abordagem cria no governo um certo constrangimento. Mas nada disso é problema. Ao contrário. Dilma aparece como mais centrada, mais racional e mais dedicada às questões administrativas, o que a eleva ao andar de cima do meio acadêmico, empresarial, jornalístico e político.
2. Com todos os desdobramentos relativos a essa herança, ela certamente não é o problema que Dilma e seu governo terão de enfrentar. Todas as pesquisas nos últimos anos, em relação às funções do governo, mostraram uma avaliação mais próxima do regular. Mas as mesmas pesquisas mostraram uma avaliação ótima de Lula. É como se o personagem que criou, inserido nas massas e confundido com elas, nada tivesse a ver com seu governo. Até o fato de a crise financeira de 2008/2009 não ter chegado aos países emergentes como chegou aos desenvolvidos foi percebido como efeito Lula.
3. Seus atos são sempre confundidos com seu populismo retórico. As inaugurações de pedras fundamentais eram percebidas como realizações, e a "caravana holiday" de seus comícios inaugurava nada, mas que -em outras partes do país, via satélite- era percebido como tudo.
4. Com o mensalão de 2005, Lula abandonou o uniforme de líder operário urbano e incorporou o jeito de líder retirante num populismo protorreligioso que tão bem se conhece Brasil afora, desde a segunda metade do século 19. Essa condição é que é a herança perversa. Nem Dilma nem nenhum outro nome cogitado no processo pré-eleitoral desde 2008 teria condições de parecer-se com o personagem criado e mitificado por Lula.
5. Todos sabem que o ano de 2011 será um ano de desconforto social, com a economia crescendo metade da de 2010, com inflação acima da meta, especialmente nos alimentos, e os juros mais altos. Há ainda a economia europeia desacelerada, a crise nos países árabes e seus reflexos etc e tal. Esse desconforto social se acentuará com a menor capacidade de compensação pelos Estados e municípios, maior desemprego, alguma reversão de expectativas e muito maior assanhamento dos políticos da base aliada e da oposição.
6. E o imaginário popular, tão acostumado ao estilo anterior, vai suspirar nas esquinas: "Ah, com Lula isso não estaria acontecendo". Nesse momento, a popularidade de Dilma despencará. E Lula correrá em seu auxílio, piorando a situação. Como disse Bertolt Brecht: "Infeliz a nação que precisa de heróis".
Um comentário:
Bem citado, Bertolt Brecht...deve ser por isto que estamos nos tornando cada vez mais um paizinho de quinta.
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