Por Alexandre Magno
Fernandes Moreira
Alguns eventos são
importantes não por si mesmos, mas pela carga simbólica que têm. Com diferença
de poucos dias, noticia-se a morte de um leão por um caçador e a venda de
órgãos de bebês abortados. O primeiro caso traz comoção internacional, tendo o
caçador sua reputação destruída e sendo obrigado a se esconder. Do segundo
caso, quase não se fala, causando indignação apenas em pequenos grupos
conservadores. Sim, para a elite bem pensante do mundo, a vida de um leão,
"símbolo de uma nação", vale mais do que a de um bebê.
No meu entender, o
significado é bastante claro: eticamente, a elite cultural passou a adotar
padrões não apenas anticristãos mas também pré-cristãos. A "adoração à mãe
natureza" conjugada com o sacrifício de crianças pode parecer representar
o auge da modernidade, mas é simplesmente o retorno a costumes pagãos de dois
milênios atrás.
A propósito, o
infanticídio, praticado na Roma pré-cristã, já voltou a ser defendido, mas
agora responde pelo curioso nome de "aborto pós nascimento".
*
Esses conservadores
são realmente uns estraga-prazeres, que teimam em ver diferenças onde o pessoal
bacana só vê igualdade. Sim, os conservadores discriminam. Mais cedo ou mais
tarde, o Supremo Tribunal Federal acabará declarando a inconstitucionalidade do
conservadorismo, pois a nossa "Constituição cidadã" proíbe
expressamente qualquer tipo de discriminação.
Para vocês terem uma
noção, circula nos meios mais intelectualizados do conservadorismo a odiosa
distinção entre cultura e entretenimento. De acordo com esses preconceituosos,
existe uma diferença fundamental entre a verdadeira cultura e o mero
entretenimento. Para eles, a primeira serviria para "elevar a alma" e
o segundo apenas como passatempo. No auge de seu discurso de ódio, chegam a
dizer que Beethoven é cultura enquanto MC Guimê seria apenas entretenimento.
Mais ainda: esses fascistas ainda têm o despudor de afirmar que Shakespeare é
melhor escritor do que Bruna Surfistinha!
No próximo
informativo do CCC (Comando de Caça aos Conservadores) será demonstrado que
eles são ainda mais perigosos do que parecem. Artistas sustentados pela Lei
Rouanet, uni-vos! Vocês não têm nada a perder além dos milhões de verba
estatal!
PS: tenho um vizinho
que faz uns sons engraçados com o sovaco. Será que ele conseguiria uns dois
milhões para fazer uma turnê?
*
Várias vezes, vi
pessoas que se consideram bastante bem informadas dizer: "conservador é
aquele que quer conservar as coisas como estão". Tudo bem que o nome
induza esse tipo de definição, mas isso apenas indica que a pessoa não tem a
mínima noção do que está falando.
Apesar do termo
"conservadorismo" estar cada vez mais em evidência no debate
político, ser conservador não diz respeito essencialmente a uma posição
política, mas a uma visão de mundo, a uma forma de perceber a realidade. O
assunto é complexo e por isso vou dar apenas uma amostra dessa visão de mundo.
O conservador percebe que a essência dos grandes problemas da humanidade não é
a política, a economia, a psicologia ou mesmo a biologia, mas a natureza
humana. Essa natureza é imperfeita e, em certo sentido, imutável. As reais
necessidades humanas permanecem as mesmas desde o início dos tempos. Por outro
lado, os defeitos e vícios da humanidade mantém-se basicamente os mesmos há
milênios.
Exatamente por isso,
os conservadores podem ser chamados de pessimistas, pois não acreditam que a
perfeição humana seja alcançável. Portanto, neste mundo, nada nos salvará de
nós mesmos. E nossa missão é descobrir como ter uma vida virtuosa mesmo no meio
de tantas imperfeições.
*
A transição da
infância para a fase adulta é ser marcada por uma radical mudança de percepção
do nosso papel no mundo. A criança é o sujeito de direitos por excelência, o
receptor das ações alheias. Já o adulto é focado no cumprimento de seus deveres
para consigo mesmo (sua missão pessoal) e para com os outros (sua contribuição
para o mundo); ele é o agente. Para o adulto, os direitos têm sentido apenas
como instrumentos do cumprimento de seus deveres. Para a criança, os direitos
são um fim em si mesmo. Nesse sentido, fica muito fácil identificar uma criança
em pele de adulto: basta verificar se a toda hora ele está reivindicando seus
direitos (reais ou imaginários, tanto faz). Também vale conferir se a toda hora
a pessoa faz o papel de vítima do mundo...
*
Hoje em dia, ser
comunista é quase tão constrangedor quanto ser petista. Nas raras vezes em que
a pessoa realmente se assume, quase sempre usa a estratégia da desvinculação do
passado: Lênin matou milhões mas não era comunista, Stalin matou milhões mas
também não era comunista, de Mao Tsé Tung nem se fala, então...
Porém, é muito fácil
reconhecer um comunista, pois ele tem uma maneira bastante típica de ver a
realidade em que as situações individuais são explicadas pela
"opressão". Nada é resultado de escolhas individuais ou mesmo do
ambiente cultural. Os ricos assim o são porque oprimem os pobres. Simples
assim.
Quando você encontrar
alguém assim pela frente, não tente convencê-lo do contrário: isso seria inútil
e desgastante. Apenas dê nome aos bois. Diga que a visão de mundo dele é a
mesma adotada por vários facínoras responsáveis pelas mortes de milhões de
pessoas. E o ouça constrangido tentar se justificar dizendo que não tem nada a
ver com isso e que defende um ideal que ainda não foi realizado...
*
Dá pra formar uma
vasta biblioteca apenas com os livros que criticam a concentração de poder no
Estado. Os argumentos variam desde questões morais até de eficiência econômica.
Porém, o mais convincente para mim talvez seja o menos utilizado e se refere ao
caráter das pessoas que tendem a ocupar o poder.
Uma pessoa saudável
moral e psicologicamente busca sua satisfação na vida por meio do trabalho e
dos relacionamentos pessoais. A obtenção de poder é um objetivo dessa pessoa
(afinal, ninguém em sã consciência quer ser fraco e impotente), mas nem de
longe é o que dá sentido a sua vida.
Por outro lado, as
pessoas cujo único grande objetivo na vida é a busca de mais poder (seja
político, econômico ou militar) muito provavelmente sofrem de graves
transtornos psicológicos. Já existem estudos indicando que o meio político tem
uma proporção consideravelmente maior de narcisistas do que a população em
geral.
Os narcisistas estão
absolutamente convencidos de que são melhores que todas as outras pessoas e que
por isso merecem ter mais benefícios que os demais e ter todas as atenções
voltadas para si. O meio político é perfeito para eles, pois tem incomparáveis
possibilidades de acesso a poder, benefícios e exposição na mídia. É difícil
imaginar outro campo em que a vaidade possa ser tão bem satisfeita quanto a
política.
Enfim, não podemos
nos iludir: a política atrai uma proporção muito maior de narcisistas do que de
altruístas, realmente preocupados com o bem-estar da população. Os melhores
entre nós raramente escolhem a política como profissão; pelo contrário, eles se
tornam "invisíveis" ao realizar, por exemplo, trabalhos voluntários
sem qualquer tipo de publicidade. Enquanto isso, os mais cínicos e vaidosos
tenderão a escolher a política e nós, cidadãos comuns, continuaremos a escolher
as pessoas mais vis para nos governar.
*
Com o Facebook,
identificar um mau-caráter ficou muito mais fácil. Basta ver se ele obedece à
"lógica da tribo", que funciona mais ou menos assim: "se é da
minha tribo, está sempre certo, se é de fora da minha tribo, está sempre
errado". Esse é o caso, por exemplo, da pessoa que colocou em si o rótulo
de esquerdista e passa a defender a todo custo os atos do governo (o contrário
também se aplica, ou seja, a pessoa se identifica como "de direita" e
passa a demonizar tudo o que o governo faz). Essa pessoa é indiferente ao certo
e ao errado, e ao verdadeiro e ao falso. Seu único objetivo é ter os aplausos
(para ser mais exato, as curtidas) daqueles que pertencem ao seu grupo. Sua
grande motivação, no fim das contas, é a satisfação de sua carência emocional.
Somente podemos
ultrapassar essa situação se deixarmos de lado as lealdades tribais e passarmos
a ser leais a princípios, que não dependem de grupos para serem aplicados.
Acreditem, isso não é nada fácil.
*
Um amigo meu,
engajado que só, estava postando há poucos dias sobre a "gordofobia".
Pois é, isso existe agora! Chega a ser pitoresca essa multiplicação de fobias,
você nunca sabe a próxima que surgirá.
A fórmula para criar
uma fobia é muito simples: escolha uma característica sua que não agrade a
todos (pense: você é careca, baixinho, narigudo, tem caspa, solta pum?) e
explique a impopularidade dessa característica por uma fobia que outros têm.
Daí, você descobrirá "carecofóbicos", "narigudofóbicos" e
até "baixinhofóbicos". E poderá culpá-los por todos os seus
problemas, principalmente por sua baixa autoestima e por não achar um rumo na
vida.
O próximo passo é
criar o dia, digamos, do "orgulho careca", organizar um movimento
social e conseguir uma verba estatal para a causa. Um detalhe importante: em
alguns momentos, você vai duvidar de si mesmo e achará tudo isso um absurdo.
Fique tranquilo. Você pode dissipar essa sensação lembrando-se que isso não
passa da carecofobia já introjetada em você.
*
Quase sempre, as
acusações de "discurso de ódio" são completamente falsas. A rigor,
esse discurso consiste na demanda pela restrição ou extinção dos direitos de
determinadas categorias de pessoas. O real discurso de ódio é de raríssima
ocorrência: é difícil conceber que um grupo político advogue a discriminação
jurídica contra determinado grupo de pessoas. Assim, a acusação de
"discurso de ódio" constitui rotineiramente um artifício para
criminalizar qualquer manifestação de pensamento contrária a determinada ideologia
ou mesmo a partido político.
Aliás, em nossa
hipersensível sociedade, discordar de alguém está sendo equiparado a odiá-lo.
(Sabe aquela pessoa "pavio curto", que sempre leva as divergências
para o lado pessoal? Pode ter se tornado o modelo do ser humano moderno.) E
para proteger essa hipersensibilidade, progressivamente abrimos mão de nossa
liberdade de expressão. Algumas pessoas precisam redescobrir que ninguém tem o
direito à concordância universal e que portanto a discussão e contestação livre
de idéias são absolutamente indispensáveis para qualquer país minimamente
democrático.
Alexandre Magno
Fernandes Moreira é advogado
Fonte: "Mídia Sem Máscara"
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