Por Ruth
de Aquino
É uma
vergonha e uma irresponsabilidade com o povo brasileiro a guerra entre classes
sociais que Lula vem fomentando. Uma guerra fictícia que só serve a objetivos
eleitoreiros. Os insultos grosseiros dirigidos a Dilma Rousseff na estreia da
Copa do Mundo, no Itaquerão, têm sido usados por Lula para atacar, mais uma
vez, a tal "elite branca" que ele adulou em 2002 como candidato à
Presidência.
Há 12
anos, Lula tentava cativar banqueiros, empresários e a classe média. Queria
afastar o medo de que um metalúrgico sindicalista no Planalto pudesse lançar o
Brasil no comunismo. Um medo infundado, porque Lula manteve a política
econômica de Fernando Henrique Cardoso e conservou a seu lado ministros-chave.
Lula prometia construir "um Brasil solidário e fraterno, um Brasil de todos".
Uma de suas bandeiras era a ética, a mudança na forma de fazer política, o
combate inclemente à corrupção.
Hoje, o que significa ser brasileiro e patriota? Quem faz greve, para o PT, é
oportunista, e as paralisações são políticas, visam derrubar Dilma. Os
estudantes que protestam por direitos como educação, saúde e transporte não
passam de garotos mimados, filhinhos de papai. Os médicos e professores que
exigem melhores salários e condições de trabalho são antipatriotas. Melhor
importar cubanos e pagar salários aviltantes porque o grosso vai para Fidel. Os
metroviários, os rodoviários tampouco são o povo brasileiro, porque, afinal,
tocaram o terror antes da Copa das Copas. Os sem-terra e sem-casa, que não viram
o governo do PT cumprir um décimo das promessas de habitação, não passam de uns
ingratos.
O maior
inimigo de Lula e Dilma, hoje em dia, é o que eles chamam de "elite branca".
Primeiro, pela cor da pele - Lula já deixou claro que brancos, na sua opinião,
são perniciosos e causam desastres internacionais na economia. Especialmente,
os de olhos azuis. Em segundo lugar, estudaram demais, leram demais, fizeram
mestrado, doutorado. Segundo Lula, isso estraga o caráter. As convicções de
Lula deveriam impedi-lo, moralmente, de aceitar e comemorar os títulos de doutor honoris causa de universidades no mundo
inteiro. Acadêmicos, professores universitários, cientistas não são,
definitivamente, "o povo brasileiro". Ricos, então... Esses deveriam ser
banidos. Não os ricos "públicos" - políticos, senadores, deputados,
sindicalistas, amigos do PT. O ódio é contra os ricos "privados". Esses são
mal-educados, xingam Dilma, em pleno estádio. O povo brasileiro não é assim. É
cordial e civilizado. E, quando sai quebrando tudo na rua, deixa de ser
brasileiro?
Temos
presenciado o exercício pobre, populista, ignorante, de tentar desviar a
insatisfação popular para uma guerra entre classes sociais e até entre grupos
étnicos. É o maniqueísmo do Poder. Trata-se de um recurso comum de governos
acuados, de qualquer coloração política. É bem verdade que, dentro do governo,
tem gente que se envergonha do "nós contra eles". Na quarta-feira, o ministro
Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, afirmou que não foi só a "elite branca" que xingou Dilma. "Não tinha só elite branca, não! Fui e voltei
de metrô. Tinha muito moleque gritando palavrão dentro do metrô que não tinha
nada a ver com elite branca. A coisa desceu! Esse cacete diário de que não
enfrentamos a corrupção, aparelhamos o Estado, somos um bando de aventureiros
que veio se locupletar, essa história pegou na classe média." A classe média no
Brasil tem renda familiar per capita de R$ 291 a R$ 1.019, segundo o
governo. Ela é centrista, conservadora e, hoje, insatisfeita com a inflação
crescente, o descontrole dos gastos públicos, o baixo nível dos serviços
públicos e a corrupção institucionalizada. Ela estava no estádio.
Nesses
momentos de retórica radical, vale entrar no túnel do tempo e reler o que o
candidato Lula escreveu há exatos 12 anos na "Carta ao povo brasileiro":
- O
Brasil quer mudar. Mudar para crescer, incluir, pacificar. Nosso povo constata
com pesar e indignação que a corrupção continua alta e, principalmente, a crise
social e a insegurança tornaram-se assustadoras. O país não pode insistir nesse
caminho. O povo brasileiro quer mudar para valer. Quer trilhar o caminho da
reforma tributária, que desonere a produção. Da reforma agrária que assegure a
paz no campo. Da redução de nossas carências energéticas e de nosso deficit habitacional.
Da reforma previdenciária. O novo modelo não poderá ser produto de decisões
unilaterais do governo. Acredito que o atual governo colocou o país novamente
em um impasse. A estabilidade, o controle das contas públicas e da inflação são
hoje um patrimônio de todos os brasileiros. Não são um bem exclusivo do atual
governo. Vamos ordenar as contas públicas e mantê-las sob controle.
Luiz
Inácio Lula da Silva, 22 de junho de 2002.
Fonte: Revista "Época"
Fonte: Revista "Época"
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