Editorial
O escândalo do
mensalão gera desdobramentos extraordinários desde a entrevista do então
deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) à "Folha de S. Paulo", em 2005, na qual ele
denunciou o esquema de compra literal de apoio político e parlamentar ao
governo Lula.
Beneficiário
daquela obra de engenharia financeira da baixa política projetada em altos
escalões do primeiro governo petista, Jefferson viria a ser um dos condenados
no processo que inicialmente arrolou 40 mensaleiros, um fato inédito na mais
que centenária história da República brasileira.
E o ineditismo não
parou por aí. Como nunca houve um banco de réus VIPs tão amplo, a história da
Justiça nacional não aconselhava qualquer otimismo quanto a condenações. Pois
aconteceu o oposto.
Apesar de todas as
possibilidades de recursos protelatórios permitidos pela legislação - à
disposição de alguns dos melhores e mais bem remunerados advogados do país -,
ilustres terminaram condenados à prisão, outro fato pouco visto na vida
pública. E neste sentido importa menos se o regime da pena é ou não de cárcere
fechado do que o veredicto que pune poderosos, importante por si.
Expedidos, durante
o feriadão da semana passada, os primeiros 12 mandados de prisão de mensaleiros
condenados por corrupção, o processo do mensalão passou a gerar
excentricidades. Como o primeiro escalão petista apanhado neste primeiro
arrastão judicial se autodeclarar "prisioneiro político".
Não passa de reação
risível, sob encomenda para militantes sectários, o ex-ministro José Dirceu, o
deputado e ex-presidente do PT José Genoíno e o tesoureiro petista Delúbio
Soares se considerarem "presos políticos" devido à sentença de um Supremo
Tribunal Federal composto, em sua maioria, por ministros indicados pelos
governos companheiros de Lula e Dilma Rousseff, e num processo que transcorre
há seis anos, com o exercício de amplos direitos de defesa.
Neste caso, Marcos
Valério também seria um perseguido do regime? Bizarro.
A reação dos
petistas, coreografada por gestos de punhos cerrados como revolucionários de
gibi, da primeira metade do século XX, denuncia uma faceta de uma certa
esquerda brasileira - a de viver do passado. Já inaceitáveis privilégios com
que os prisioneiros petistas têm sido tratados na Papuda, em Brasília,
denunciam outra faceta: a do Brasil arcaico, aristocrático até a medula, do "você sabe com quem está falando?".
Deste Brasil,
Dirceu, Genoíno e Delúbio também fazem parte. Eles são "mais iguais" que os
prisioneiros comuns - entre eles, cardíacos, com certeza - cujo sistema de
visita é espartano, em contraste com o regime de portas constantemente abertas
que tem valido para as personalidades petistas condenadas.
O velho Brasil das
elites - ironicamente tão enxovalhadas por facções do PT - está expresso em
cores fortes nos acontecimentos em torno das primeiras prisões de mensaleiros.
Fonte: "O Globo", edição desta terça-feira, 26
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