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segunda-feira, 3 de junho de 2013

"Não quero ser estraga-festa, mas Neymar enfrentará vários desafios difíceis para se consagrar no Barça"



Por Ricardo Setti

Que não fique nenhuma dúvida, amigas e amigos do blog: Neymar é um craque do futebol, um garoto bacana que tem tudo para dar certo em qualquer time do mundo. Apesar de sua pouca idade, 21 anos, o atacante nascido em Mogi das Cruzes (SP) vem demonstrando um bom grau de maturidade na construção de sua carreira, que vai talvez melhor extra-campo do que no próprio futebol, orientado pela empresa de Ronaldo Fenômeno.
Em poucos anos de futebol, a na flor da idade, Neymar já construiu uma imagem internacional - a ponto de até seu estilo de cabelo ser copiado por jogadores dos quatro cantos do mundo. Tão simpático, afável e brincalhão com os torcedores como é na vida real, muito à vontade nos comerciais que faz, o futebol e o marketing forjaram uma espécie de marca que outros grandes jogadores não conseguiram nem em muitos anos de carreira.
Agora, não nos iludamos: Neymar pode ter dificuldades de adaptação ao Barcelona e ao futebol europeu. Os adversários que encontrará, dentro da própria Espanha e, mais ainda, nas disputas internacionais do Barça, não permitirão que ele faça a grande maioria das jogadas com que costumava encantar no Santos.
Neymar precisará levar em conta, nas firulas, dribles, chapéus, jogadas de calcanhar e outras diabruras a que nos acostumamos aqui, uma série de fatores de que anda carente o futebol brasileiro: a grande velocidade com que se pratica o futebol na Europa, a exigência implacável dos técnicos de marcação no campo todo, a força física dos atletas que lá jogam, a insensibilidade absoluta dos árbitros ao jogo de corpo que, no Brasil, resulta em "cavação" de faltas e pênaltis - e por aí vai.
Especificamente no Barça - onde já se esboçou uma discussão sobre que número (lá chamado dorsal) levará, algo altamente simbólico na Espanha e em outros países da Europa -, a primeira questão é no lugar de quem Neymar vai entrar.
Sim, porque para o craque ex-Santos jogar, alguém vai ter que sair de um time azeitadíssimo, que, apesar de um leve declínio sofrido no último ano, vem ganhando tudo o que disputa desde 2008 e encantando o mundo com a beleza e eficiência de seu jogo coletivo, e a habilidade de vários de seus craques.
Entra Neymar no ataque - e David Villa, o maior artilheiro da seleção espanhola de todos os tempos, ídolo até das torcidas adversárias, ficará de vez no banco? (Excelente jogador, Villa sofreu uma fratura séria poucos meses depois de ser contratado ao Valencia, submeteu-se a uma longa e penosa recuperação e, desde que voltou ao time, não consegue do técnico Tito Vilanova, como ocorreu também com o treinador interino Jordi Roura, uma sequência de jogos suficiente para firmar-se de vez. Este não é um pequeno problema - Villa custou mais caro que Neymar: 60 milhões de euros.
Entra Neymar no ataque, e o Barça tira Pedro, o talismã que marca em todas as decisões, o garoto das Ilhas Canárias promovido pelo legendário técnico Pep Guardiola e que a torcida adora?
O Barça é um time magnífico, mas é uma equipe enjoada. Um percentual considerável de jogadores que não são catalães ou não foram formados na famosa "fábrica" de La Masia, seu centro de preparação de jogadores para o futuro, costumam encontrar problemas de adaptação e acabam indo embora. Não custa lembrar que nem monstros sagrados como Maradona ou Romário tiveram trajetória longa no Barça.
Mais recentemente, um centroavante fabuloso como o sueco-cigano Ibrahimovic acabou sendo vendido para a Itália com grande prejuízo para o clube - alto, forte, habilidoso e goleador, ele não conseguiu se sintonizar com o vestiário.
No Barça, Neymar vai precisar voltar para marcar, algo que pouco fazia no Santos, terá que suar muito em exercícios e dieta específicos para aumentar a massa muscular - sem isso, esqueça ser titular absoluto -, e deixar de lado sua tendência ao individualismo em prol do jogo coletivo. Sim, é verdade que o time joga muito em função de Messi, o melhor jogador do mundo, mas quem acompanha o Barça sabe o quanto Messi, de sua parte, se empenha em jogar para a equipe.
Um outro aspecto não pouco relevante nessa história toda será sua conduta fora de campo. O Barça é extremamente estrito com jogadores que adoram baladas noturnas, adotam atitudes extravagantes e se deixam seduzir pela enorme série de tentações trazidas pela celebridade. O clube ostenta uma tradição do que alguns chamariam de caretice, mas que vem dando certo desde sempre - e o jogador que sai da linha cedo ou tarde é espirrado. A censura aos boas-vidas costuma vir inclusive de colegas de equipe.
Os exemplos são incontáveis e, só para ficar em um recente, o excelente zagueiro Piqué, catalão de estirpe, ídolo da torcida e chamado "Piquenbauer" pelos que apostam que ele possui o estilo e chegará ao mesmo patamar do divino alemão Franz Beckenbauer, antes de acomodar-se e ter filho com a cantora colombiana Shakira frequentou mais as páginas de fofocas do que as de esporte - e amargou uma até então impensável reserva.
Tal como a maioria dos brasileiros, enxergo em Neymar qualidades suficientes para superar esses desafios, que não são fáceis.
Mas não custa lembrar que todos esses desafios - e alguns mais - o estarão esperando em Barcelona.
Fonte: "Blog Eicardo Setti"

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