Por Reinaldo Azevedo
Pois é… No dia 26, escrevi aqui um post em que perguntava quem
chantageia quem na relação entre o governo e o Congresso: são os deputados e
senadores que exigem benesses para dar seu voto, ou é o Planalto que só concede
a benesse se tiver o voto? Não se trata de um enigma do tipo "quem nasceu
primeiro, o ovo ou a galinha?" Sabem por que não? É a Presidência que dispõe na
caneta que abre o caixa. Pois bem: desta feita, a relação quase sempre perversa
entre o Executivo e o Legislativo assumiu ares de chantagem explícita. Ou, vá
lá, talvez o nome não seja bem esse: a presidente Dilma Rousseff e seus sábios
decidiram mesmo ir às compras. Botaram R$ 444,7 milhões na bolsa e foram ao
mercado da Câmara e do Senado para encher o carrinho de deputados e senadores.
Vocês sabem a que me refiro (ler post desta segunda). Na
sexta-feira, o governo editou um decreto ampliando em R$ 10,032 bilhões os
gastos de toda a máquina pública. Nesse total, estão R$ 444,7 milhões para
emendas individuais dos parlamentares - um naco novo de R$ 748 mil para cada um
dos 513 deputados e 81 senadores. Com esse aporte novo, cada um deles fechará o
ano com R$ 11,6 milhões para emendas individuais.
Até aí, vá lá… Nesta terça, o governo tentará votar mais uma vez o
projeto de lei que altera a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e que, na
prática, elimina qualquer meta fiscal do governo. Reitero: o texto, na forma
como o quer o Planalto, permite que se chegue a qualquer resultado, pouco
importando se é déficit ou superávit. A sessão conjunta de votação do
Congresso, reunindo Câmara e Senado, está marcada para as 18h. Trata-se de um
projeto inconstitucional porque viola o Artigo 165 da Carta.
Muito bem! Já seria indecoroso se, na véspera da votação, um
governo acenasse com a liberação de verba para emendas individuais. Parece que
já ficaria caracterizada uma relação de troca. Ocorre que o governo não quis
saber de ambiguidades: o decreto de Dilma que amplia a verba destinada a
deputados e senadores tem uma condição: a aprovação do projeto de lei que
altera a LDO.
Vocês entenderam tudo direitinho: se os senhores parlamentares
aprovarem o projeto e permitirem que o Planalto estupre a LDO e a Constituição,
então receberão os recursos; se, no entanto, o governo for derrotado, nada de
grana. E por que os parlamentares querem o dinheiro das emendas? Para que
possam aplicá-lo em suas respectivas bases, mantendo cativo o eleitorado.
Ao ridicularizar Luís Bonaparte (o sobrinho que seria a farsa de
Napoleão, o tio), Marx - que era um ótimo frasista e podia ser genial às vezes,
apesar de suas ideias malignas - faz uma ironia que cito com certa frequência.
Transcrevo: "Na sua qualidade de fatalista, ele [Luís Bonaparte] vivia e vive
ainda imbuído da convicção de que existem certas forças superiores às quais o
homem, e especialmente o soldado, não pode resistir. Entre essas forças estão,
antes e acima de tudo, os charutos e o champanhe, as fatias de peru e as
salsichas feitas com alho". Marx resume com essa imagem o que considerava a
farsa bonapartista de Luís - ou "Napoleão III de França", criando o emblema de
um tempo.
Adapto. Na sua qualidade de fatalista, Dilma vive imbuída da
convicção de que existem certas forças superiores às quais o homem, e
especialmente o deputado e o senador, não pode resistir. Entre essas forças
estão alguns carguinhos em estatais, a nomeação de apaniguados e R$ 748 mil.
Eis aí um governo que reivindica a autoridade moral para conduzir
uma reforma política. Vamos ver se deputados e senadores reagirão de pé ou
ficarão de joelhos, com o chapéu na mão.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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