Por Reinaldo Azevedo
Rodrigo Janot, procurador-geral da República, enviou ao TSE
(Tribunal Superior Eleitoral) um parecer contrário à auditoria nas eleições,
conforme foi solicitado pelo PSDB. A íntegra do seu parecer está aqui. Em síntese, ele afirma que o pleito
encaminhado pelo PSDB não aponta indícios de fraudes e se limita a glosar casos
que circulam nas redes sociais. Ocorre que o Dr. Janot não parou nessa
consideração, que está no escopo de suas atribuições. No que foi além, pisou no
tomate, escorregou na maionese, viajou na batatinha, meteu os pés pelas mãos.
Já chego lá. Antes, quero destacar um caso flagrante de atropelo à lógica e ao
bom senso, contido no texto do procurador-geral.
Diz Janot num dado momento de seu parecer, prestem bem atenção,
depois de destacar que a gritaria nas redes é até compreensível:
"Não se pode, porém, justificar postura de um partido político do tamanho e da representatividade do requerente de, em se baseando unicamente em comentários formulados em redes sociais (…), instaurar um procedimento que, a par de não previsto em lei, pode comprometer a credibilidade do sistema eleitoral".
"Não se pode, porém, justificar postura de um partido político do tamanho e da representatividade do requerente de, em se baseando unicamente em comentários formulados em redes sociais (…), instaurar um procedimento que, a par de não previsto em lei, pode comprometer a credibilidade do sistema eleitoral".
Aí, doutor, eu estrilo. Pergunto: na sua opinião, a auditoria
compromete a credibilidade porque não está prevista em lei, é isso? Mas espere:
houvesse um caso flagrante de fraude, então a auditoria poderia ser feita,
ainda que sem prescrição legal? Ou mais: houvesse a prescrição legal, mas não o
indício de fraude, aí a credibilidade não seria arranhada? Eis, caros leitores,
um daqueles raciocínios quem nem errados conseguem ser. São apenas
não-raciocínios. Só para que fique evidente o absurdo da formulação do Dr.
Janot, faço um paralelo para evidenciar o absurdo: digamos que eu convocasse as
massas para matar tamanduás selvagens na Avenida Paulista. Doutor Janot diria: "a par de não haver tamanduás na Paulista, o convite fere a lei brasileira, que
protege os animais selvagens…" Entenderam?
Mas a pior parte de sua peça não é o atropelo à lógica. Reproduzo
e transcrevo parte de seu parecer.
Depois de censurar a radicalização nas redes sociais,
escreve o procurador:
"Como exemplo de acirramento, tem-se notícia amplamente veiculada na imprensa e nas redes sociais sobre a existência de uma 'petição virtual' requerendo o impeachment da presidente da República, que já contaria com milhares de assinaturas sem que se apontasse (sic) qualquer fato a Sua Excelência que pudesse conduzir a essa grave consequência"
"Como exemplo de acirramento, tem-se notícia amplamente veiculada na imprensa e nas redes sociais sobre a existência de uma 'petição virtual' requerendo o impeachment da presidente da República, que já contaria com milhares de assinaturas sem que se apontasse (sic) qualquer fato a Sua Excelência que pudesse conduzir a essa grave consequência"
A língua foi espancada. Onde ele escreveu "apontasse", creio ter querido
escrever "imputasse". Mas eu entendi. Lembro ao doutor que ele não foi
convidado a se manifestar sobre a petição e que os que a assinaram consideram
que a presidente Dilma sabia das irregularidades da Petrobras e nada fez. Ou o
doutor considera que essa imputação não é grave? Sei que as provas ainda não
existem. Mas essa é a convicção dos peticionários. E não cabe ao Estado
brasileiro, de que Janot é um dos representantes, dizer quais convicções são e
quais não são legítimas. Ou, agora, vamos ter de criar o "Manual do Bom
Peticionário", doutor?
Mas espantoso mesmo é o que vem a seguir, e confesso que tive de
fazer um grande esforço - não sei se alcancei - para não considerar um pouco de
má-fé. Escreve ele:
"Outro exemplo é o lamentável discurso de ódio presente em redes sociais contra os eleitores residentes na Região Nordeste do Brasil, aos quais teria sido atribuído o resultado verificado nas urnas no dia 26.10.2014"
"Outro exemplo é o lamentável discurso de ódio presente em redes sociais contra os eleitores residentes na Região Nordeste do Brasil, aos quais teria sido atribuído o resultado verificado nas urnas no dia 26.10.2014"
É lamentável o discurso do ódio? É, sim! Contra nordestinos,
contra paulistas, contra mineiros, contra quaisquer pessoas… Por que Janot saca
essa questão? O que isso tem a ver com a natureza do requerimento apresentado?
De resto, comparar um discurso de caráter discriminatório à convicção daqueles
que acham que Dilma tem de ser alvo de um processo de impeachment é um
escândalo! Num caso, trata-se de preconceito e desinformação; no outro, estão
pessoas inconformadas com a roubalheira já constatada na Petrobras.
Dr. Janot tem todo o direito de achar o pedido improcedente. Mas
não tem o direito de demonizar uma parcela do eleitorado brasileiro, que pode
apresentar ao Poder Público quantas petições quiser. Ao evocar a extemporânea
questão do "preconceito contra os nordestinos" nas redes sociais , o
procurador-geral da República procura associar os que protestam ao discurso do
ódio.
Se o fez sem querer, e um imprudente que pensa mal. Se o fez de
caso pensado, estamos diante de um exemplo flagrante de desonestidade
intelectual.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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