Por Jolival Soares
Quando, no
século XVII, na Inglaterra, Francis Bacon funda a ciência experimental - empírica - o faz em atitude de absoluto desrespeito à mãe de todo conhecimento
humano que é a filosofia. Dizia-nos ele: a filosofia é coisa de jovens
desocupados conversando com velhos tagarelas!
Dos gregos, nós
os ocidentais recebemos a filosofia como o Direito dos Romanos. Toda a Paideia
grega está profundamente influenciada pela sua medicina que, à época, não era
só ciência, mas também arte - a arte dos esculápios (médicos). Podemos até nos
queixar dos gregos, pois os mesmos pensaram sobre quase tudo, porém não
experimentaram sobre quase nada. Afora a descoberta de Arquimedes, em sua
banheira, quando o mesmo percebe que a água que lhe cai e transborda de sua
banheira era proporcional à sua massa corporal submersa na água, exclama:
Eureka! (achei!), pouca coisa de natural descoberta empírica dos gregos se tem
notícia. Historiadores nos dizem que, na cabeça dos gregos daquela época, era
muito comum se pensar que, o que valia verdadeiramente a pena ser descoberto,
já havia sido nas civilizações do Egito, Babilônia, Caldeia e Assíria. Isto
existia como um verdadeiro arquétipo em suas cabeças. Outros ainda nos
acrescentariam que, pelo fato de cada cidadão grego livre (patrício) poder ter
até sete escravos, este conforto não lhes estimulavam a criar nada. O fato é
que, quando o governante dos dias de Arquimedes lhe pede que use seus
conhecimentos de física da natureza para produzir utensílios, instrumentos que
ajudassem o homem comum nos seus trabalhos, este se ofende porque achava ser um
sacrilégio colocar o saber, em forma de conhecimento, a serviço de coisas tão
insignificantes. É, pois, assim, a cabeça grega daqueles dias: busca-se o
saber, a sabedoria pela sabedoria, mas, completamente desvinculada de uma razão
de aplicabilidade prática. Resumindo, os gregos pensaram e refletiram
(filosofaram) sobre quase tudo e experimentaram sobre quase nada! Está nesta
origem - ontológica, a ciência que nasce sem uma consciência ética, ou seja,
temos e continuamos fazendo até os dias de hoje uma Ciência Sem Consciência,
cega, pois destituída de compromissos com os valores éticos mais elevados e
que, às vezes e sempre, é o que nos salva a vida - a vida de todos nós os
humanos. Não é sem motivos que o grande médico, fisiologista e pensador
francês, Alexis Carel, vem clamando desde 1930 quando brinda a humanidade com o
seu clássico "O Homem, Este Desconhecido". Tendo, pela curiosidade,
sido atraído para o mundo exterior a ele, faz notáveis progressos na
Astronomia, na Física, na Química, na Matemática e noutras províncias do saber
científico, que lhe levou a conquistar e dominar todo o seu meio-ambiente,
incluído aí não só do planeta terra como de outros, de forma avassaladora e,
contudo, permanece como um grande desconhecido para si mesmo! Veja-se: a
Psicologia - o seu primeiro Prêmio Nobel - não fez talvez ainda 200 anos.
A ciência
precisa de uma ciência, não pode viver sem valores éticos, pois se transforma
em uma ameaça terrível para a humanidade. Tanto é que a ciência, alimentando a
tecnociências, vem nos ajudando a viver mais e melhor com os progressos da
genética, da engenharia sanitária, da medicina, da nutrição, na produção de
novos fármacos e vacinas, prolongando assim nossas vidas no varejo e nos
matando no atacado. Nossos governos modernos possuem bombardeiros cirúrgicos em
aviões ou helicópteros, que matam palestinos e afegãos. Nossos aviões não
precisam nem mais de pilotos (Drones). No arsenal russo existe armazenada a
mistura do "super-vírus da varíola com o ebola africano", que, em
momentos soltos, por um bioterrorista, no metrô de Moscou, Berlim, Paris,
Londres, São Paulo ou Nova York, em minutos, pode matar milhares de pessoas. E
não há vacinas! No arsenal americano existem centenas de bombas de nêutrons,
para que? Elas destroem tudo o que é ser vivo, ou seja, animais e vegetais,
preservando tudo o que é material! Você sabe para que servem escolas, hospitais
e universidades, sem alunos ou pessoas doentes, para serem educados e tratados?
Uma grande e perversa lógica abjeta e inumana, que subverte valores, atribuindo
muito mais valor às coisas do que às pessoas que deveriam ser objeto de nossa
alteridade.
Vejam como é
nossa Ciência Sem Consciência: estamos hoje fazendo todas estas coisas, vivendo
diária e permanentemente debaixo da ameaça da nossa plena aniquilação. Deus nos
fez para isto? Ficaram os irmãos gregos nos devendo: experimentar, pensar, e
refletir sobre o experimento e avaliar se é bom ou ruim atribuir valor ético e
colocar em prática quando isto torna-se um bem para todos.
Não é
sintomático que Francis Bacon seja o primeiro a criar por toda a Inglaterra as
primeiras escolas técnicas, semeando a futura mão de obra barata para a
revolução industrial burguesa, com seus métodos de produção baseados na
exploração do homem pelo homem, desembocando no capitalismo selvagem que chegou
e encontra-se até hoje em nosso meio, produzindo riquezas e destruindo a maior
de todas: o nosso meio-ambiente? Mais tarde torna-se Ministro, vai preso por
corrupção - desvio de dinheiro público. Triste é este começo de nossa Ciência
Sem Consciência, a nós deixado por este senhor. Ah! quem nos dera se tivéssemos
recebido a ciência dos gregos, pois estes criaram o hábito de "pensar
refletindo" filosoficamente.
Hoje dizem
alguns filósofos que, a despeito de todo nosso progresso tecnológico humano,
apenas 3% das pessoas da humanidade pensam. 7% pensam que pensam e 90% pensam
que não precisam pensar. Temos que fazer enormes esforços para entrar no
primeiro grupo e estender sua base. De outra forma, nosso futuro estará
seriamente comprometido.
Jolival Soares, rotariano, é bioquímico e professor de
Bioética
Nenhum comentário:
Postar um comentário