Ruy Fabiano
Tão
chocante quanto o Mensalão são as reações que provoca por parte da alta cúpula
da República. Injuriar a mais alta Corte de Justiça do país - acusando-a de
fraude e manipulação - não é pouca coisa. Impressiona o silêncio desta.
A
prisão dos mensaleiros petistas, a despeito de todos esses protestos, demonstra
que alguma saúde institucional resta ao país. Nem tudo está dominado; se
estivesse, não estariam presos. E é essa a razão da revolta.
A
afirmação do ministro Luís Roberto Barroso, de que "o Mensalão foi um ponto
fora da curva", ainda que dita em contexto diverso e com desconfortável
espanto, confirmou-se.
A "curva" é a histórica impunidade, sobretudo em se tratando de gente poderosa.
Não é à toa que o PT continua protestando, inconformado por não dispor de meios
de reverter o processo. Está claro que não contava com tal desfecho.
Nada
mais blasfemas - e provocadoras - que as palavras dirigidas por Lula, Rui
Falcão e o próprio João Paulo Cunha (a que a condição de sentenciado não gerou
qualquer inibição) contra a Suprema Corte do país e a seu presidente, Joaquim
Barbosa.
Tudo
isso diante do silêncio eloquente da presidente da República, Dilma Rousseff.
Protestar
contra uma sentença é compreensível. Constitui o chamado "juris esperniandi". Mas o que a alta
cúpula do PT, na presença da presidente da República, fez, na noite de
quinta-feira passada, no 5º Congresso do partido, vai muito além disso.
Veja-se,
por exemplo, o que disse o seu presidente, Rui Falcão, a respeito da conduta
moral do STF:
-
É o típico caso da manipulação realimentando a mentira e da mentira
realimentando a manipulação. A história vai provar que nossos companheiros
foram condenados sem provas, em um processo nitidamente político, influenciado
pela mídia conservadora.
Ou
seja, o STF incorreu em crime - nada menos. Condenou inocentes, sem provas e
sem obedecer o devido processo legal. Em tais circunstâncias, haveria pleno
respaldo a um recurso aos tribunais internacionais, o que, no entanto, não se
dará pelo simples motivo de que nada do que foi dito ocorreu.
Os
autos da ação penal aí estão - mais de 50 mil páginas - para provar a
inocuidade do esperneio. Nenhum tribunal sério acataria recurso sem avaliá-los.
Daí porque não há recurso.
Lula,
que já abordou ministros do STF para adiar o julgamento - e chegou a ameaçar um
deles, Gilmar Mendes, com acusações que se mostraram improcedentes -, optou,
mais uma vez, por acusar a imprensa. Disse:
-
Se for comparar o emprego do Zé Dirceu no hotel com a quantidade de cocaína no
helicóptero, pelo menos houve uma desproporcionalidade na divulgação do
assunto.
Referia-se
à cocaína encontrada no helicóptero que pertence à família do senador Zezé
Perrella (PDT-MG), aliado do senador Aécio Neves, pré-candidato do PSDB à
Presidência da República.
Antes
de mais nada, é falso que a imprensa tenha sido indiferente ao tema, que ocupou
as manchetes dos jornais e telejornais por vários dias e está sendo objeto de
inquérito policial. Nem chegou à Justiça. Mesmo assim, o que têm o Mensalão e o
suspeito emprego oferecido ao ex-ministro José Dirceu – tão suspeito que ele se
viu instado a recusá-lo – com o caso da cocaína no helicóptero? Ou com o
chamado Mensalão de Minas?
Cada
caso é um caso e a Justiça não pode tratar a todos de uma só vez. O que não faz
sentido, nem moral, nem juridicamente, é tentar atenuar – ou mesmo absolver -
um crime recorrendo a outro, praticado por terceiros. O processo de Minas
chegou ao STF um ano depois do Mensalão. Será julgado provavelmente ano que
vem. Vejamos o que contém.
Aparentemente,
é coisa distinta do Mensalão, de proporções bem menores. Mas, sendo crime,
saberemos os seus detalhes e não há razão para qualquer condescendência.
O
que está em pauta, porém, neste momento, é o Mensalão, que o ministro Ayres
Britto considerou "crime contra a democracia", e cujos mentores seu colega
Celso de Mello classificou de "quadrilha de bandoleiros de estrada" e "marginais do poder".
Lula,
que já pediu perdão em público por aqueles atos, exibiu reiteradas vezes
frouxidão moral diante do tema. Prometeu investigá-lo quando deixasse a Presidência
(o que é espantoso, já que apenas no cargo disporia de autoridade e meios para
fazê-lo), mas depois passou a negá-lo e chegou a denunciá-lo como "tentativa de
golpe de Estado", em outra grave acusação ao STF, à Procuradoria da República e
à imprensa.
Mais
que a mutilação de sua imagem, o PT, para além do esperneio, exibe em público a
frustração de constatar que, apesar de todas as tentativas, ainda não tem o
poder total.
Fonte: "Blog do Noblat"
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