Por Reynaldo Rocha
Prezado ministro Celso de
Mello,
Permita-me chamá-lo como se
o senhor não fosse o que é, nem exerça a mais nobre função que um operador do
direito pode exercer.
Sei que o senhor jamais
falará sobre o aparelhamento em curso no Supremo Tribunal Federal. A dignidade
e honradez que o caracterizam não permitiria. Mas também sei que um jurista com
sua inteligência e seus conhecimentos enxerga o que está acontecendo.
Os bombeiros costumam dizer
que nenhum incêndio começa grande. É uma das tais verdades óbvias, mas é nelas
que reside a sabedoria inquestionável.
Alinho-me
às teses dos ministros Luiz Fux, Cármem Lúcia e Marco Aurélio. Mas quem sou eu
para sugerir uma nova leitura ao decano do STF? De qualquer forma, sou um
cidadão brasileiro. Com uma história minúscula na luta pela moralização deste
país, desde o combate à ditadura (quando o Poder Judiciário era a única
esperança) até os tristes tempos atuais.
Está em suas mãos - sem
exageros dramáticos ou concessões à pieguice - o futuro do Brasil. A nossa
esperança. Esperamos que o Supremo, que julgou com coragem, execute a pena com
a mesma coragem. Que consolide a percepção de JUSTIÇA que perdemos na caminhada
sempre conturbada. Por pedras e por atalhos. Desta vez, até agora não foi
assim.
Sou um ex-operador do
Direito. Abandonei a carreira jurídica, tenho me orgulho ao constatar que ela
nunca me abandonou. E aprendi que a noção de cidadania, o estado de direito, a
prestação jurisdicional e devido processo legal, entre tantos outros, são
conceitos essenciais.
O estudo do Direito, ao
menos das noções básicas, deveria ser obrigatório em todas as escolas do
Brasil. E o julgamento da Ação Penal 470 nos trouxe esse alento, essa sensação
de que enfim éramos protegidos por um tribunal de notáveis. Há pouco tempo,
discutia-se nas ruas os votos dos ministros. Tentava-se entender a Teoria do
Domínio dos Fatos. Buscava-se compreender os graus recursais. A convenção de
San José. A importância da Constituição.
É nisso que o povo
acredita. E no que os senhores fizeram (com as conhecidas oposições em
plenário) nesse processo. O incêndio começou com uma fagulha. Hoje, é
incontrolável. Como qualquer incêndio, decorrente de causas naturais ou
de ações criminosas, o fogo é o mesmo.
Sei que o senhor é
legalista. Eu sou também. Sou quando acordo, trabalho, respeito as leis,
obedeço igualmente àquelas com as quais não concordo e me submeto aos poderes
republicanos.
E tenho esperança. A
esperança de que nos falava Paulo Freire. A esperança de esperançar, não de
esperar. Cansamos de esperar. Esperar o futuro que nunca chega. Esperar a ética
retornando ao leito das decisões políticas. Esperar que a democracia seja
entendida como diferença e que estas não sejam demonizadas. Esperamos com a
certeza de esperançar.
Ministro Celso de Mello,
que o senhor fique ainda maior do que já é. Jamais escreveria algo semelhante a
outros ministro(a)s do STF.
Escrevo ao senhor sem saber
se serei lido. Não se trata de um desabafo. É um pedido de auxílio para
continuar acreditando que há um novo caminho.
Depende do senhor.
Respeitosamente,
Um brasileiro.
Fonte: Seção Feira Livre -Coluna do Augusto Nunes

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