Por Ricardo Setti
Ricardo Kotscho, 64 anos, repórter
extraordinário e homem de bem, amigo que conheço desde 1969 e com quem tive o
prazer enorme de trabalhar por longos anos, é amigo íntimo de Lula há décadas,
e colabora como assessor com o ex-presidente desde a campanha eleitoral de
1989, além de ter sido, durante parte do governo Lula, secretário de Imprensa
da Presidência.
Ele publicou hoje um artigo em que cobra
do amigo que venha a público falar do mensalão e do recente escândalo ocorrido
no escritório da Presidência em São Paulo em seu blog, Balaio do Kotscho -
atitude que só o engrandece como jornalista e como cidadão.
Não concordo com várias das assertivas e
premissas de Kotscho no texto abaixo, mas faço questão de publicá-lo pela
enorme importância que atribuo a essa manifestação de alguém que, de longe, é
das pessoas mais próximas e leais a Lula.
O título original do artigo é:
A hora da verdade para Lula e o PT
"Por que o bloguista inexplicavelmente não
conta nada sobre Rosemary e o possível envolvimento do ex-presidente Lula em
algumas operações ilícitas? Aonde está a sua imparcialidade de jornalista?",
pergunta o leitor Fernando Aleador, em comentário enviado às 04h57 desta
sexta-feira.
Tem toda razão o leitor.
Demorei para escrever e dar esta resposta
porque, para mim, estes últimos foram os dias mais difíceis da minha já longa
carreira, posto que os fatos envolvem não só velhos amigos meus, como é do
conhecimento público, mas um projeto político ao qual dediquei boa parte da
minha vida.
Simplesmente, não sabia mais o que dizer. Ao
mesmo tempo, não podia brigar com os fatos nem aderir à guerra de extermínio de
reputações e de desmonte da imagem do ex-presidente Lula e do PT que está em
curso nos últimos meses.
A propósito, escrevi no começo de novembro um
texto que se mostrou premonitório sob o título "O alvo agora é Lula na guerra
sem fim", quando o STF consumou a condenação dos ex-dirigentes do PT José
Dirceu, José Genoíno e Delúbio Soares.
De uma hora para outra, a começar pelo
julgamento do mensalão, até chegar às revelações da Operação Porto Seguro, o
que era um projeto vitorioso de resgate da cidadania reconhecido em todo o
mundo levou um tiro na testa e foi jogado na sarjeta das iniquidades.
"O que me intriga é saber por que agora, por
que assim e por que tamanha insistência. É claro que o esforço para acabar com
a corrupção é legítimo e louvável, mas não terminaram recentemente de sangrar o
PT até a entrada do necrotério? Quem estaria sedento por mais?", pergunta-se a
colunista Barbara Gancia, na edição de hoje da Folha, e são exatamente
estas as respostas que venho procurando para entender o que está acontecendo.
Talvez elas estejam na página A13 do mesmo
jornal, em que se lê: "FHC acusa Lula de confundir interesses públicos e
privados". Em discurso num evento promovido pelo PSDB no Jóquei Clube de São
Paulo, na quinta-feira, o ex-presidente pontificou, mesmo correndo o risco de
falar de corda em casa de enforcado:
"Uma coisa é o governo, a coisa pública,
outra coisa é a família. A confusão entre seu interesse de família ou seu
interesse pessoal com o interesse público leva à corrupção e é o cupim da
democracia".
Sem ter o que propor ao eleitorado, após
sofrer três derrotas consecutivas nas eleições presidenciais, e perder até
mesmo em São Paulo na última disputa municipal, o PSDB e seus aliados na mídia
e em outras instituições nacionais agora partem para o vale-tudo na tentativa
desesperada de eliminar por outros meios o adversário que não conseguem vencer
nas urnas.
Nada disso, porém, exime o ex-presidente Lula
e o PT de virem a público para dar explicações à sociedade porque não dá mais
para fazer de conta que nada está acontecendo e tudo se resume a uma luta
política, que é só dar tempo ao tempo.
A bonita história do partido, que foi
fundamental na redemocratização do país, e a dos milhões de militantes que
ajudaram a levar o PT ao poder merecem que seus líderes venham a público, não
só para responder a FHC e às denúncias sobre a Operação Porto Seguro publicadas
diariamente na imprensa, mas para reconhecer os erros cometidos e devolver a
esperança a quem acreditou em seu projeto político original, baseado na ética e
na igualdade de oportunidades para todos.
Chegou a hora da verdade para Lula e o PT.
É preciso ter a grandeza de vir a público
para tratar francamente tanto do caso do mensalão como do esquema de corrupção
denunciado pela Operação Porto Seguro, a partir do escritório da Presidência da
República em São Paulo, pois não podemos eternamente apenas culpar os
adversários pelos males que nos afligem. Isso não resolve.
Mais do que tudo, é urgente apontar novos
caminhos para o futuro, algo que a oposição não consegue, até porque não há
alternativas ao PT no horizonte partidário, para uma juventude que começa a
desacreditar da política e precisa de referências, como eu e minha geração
tivemos, na época da luta contra a ditadura.
Conquistamos a democracia e agora precisamos
todos zelar por ela.
Fonte: "Blog do Ricardo Setti"
Um comentário:
Acho que deveríamos fazer uma campanha "Você não é burro", prá incentivarmos o ex-presidente a deixar a covardia de lado e assumir seus êrros. Ser valente atrás de uma faixa presidencial, é mole, mas o diminui cada vez mais como pessoa.
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