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sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Pilatos e o Parque

Por Hugo Navarro

Lamenta, o jornalista Dimas Oliveira, que o blog do Parque da Cidade esteja esquecido há doze meses (sem renovar a programação), lamentando, também, que o Parque tenha sido abandonado pelo governo que no primeiro dia do Ano Novo terá o mandato encerrado.
O abandono do Parque, que leva o nome de Frei Monteiro, tem sido, encorreado a outros de igual tamanho, apontado como um dos maiores pecados da administração que chega ao fim, com julgamento de poucos gabos e muitas arguições, como alguém que deixa avenidas de "esperanças fechadas e escuras" a que a desgraça insistiu em acrescentar obséquios.
O Parque da Cidade é velha reivindicação defendida por nós, que pregamos, como Santo Antônio aos peixes, durante anos, a necessidade de se criar, nesta cidade, parque com oxigênio, vida natural, lazer e alguma tranquilidade para uso da população. Feira, a partir dos anos cinquenta, passou a crescer sem muito controle, transformando-se em forno crematório de cimento, tijolo, pedra, asfalto e cal, a todos torrar, impiedosamente, suprimindo o verde e a ventilação, quase a inviabilizar a existência humana, assumindo, ferrenhamente, a postura dos negócios e dos ganhos. Transformou-se, rapidamente, em espécie de fábrica de dinheiro em que todo metro de terreno é ferozmente disputado em sistema de capitalismo selvagem e o lucro é perseguido e disputado muito mais do que a salvação da alma eterna.
Prefeitos dos anos vinte, quando a cidade era acanhada, entalada em suas dificuldades, criaram espaços, verdadeiros respiradouros necessários à vida sadia da população. O progresso os destruiu. Exemplo é o antigo Parque Bernardino Bahia, que durante anos vicejou, resplandecente, ubérrimo, onde, no começo da primavera crianças das escolas e autoridades costumavam plantar árvores em solenidades a que não faltavam bandas de música e discursos. Hoje, vítima de comércio implacável em seus desígnios, está pavimentada a pedra, único recurso de que o poder público se valeu para livrá-la da ação predatória da vadiagem muitas vezes opulenta, mas sempre irresponsável e danosa.
José Ronaldo viu o estrangulamento da cidade, que vai crescendo e se tornando cada vez mais inóspita, principalmente com a febre do carro, fenômeno que já vitimou outros povos e que agora ataca a nossa população, dando, como resultado, que todo mundo tem carro mas praticamente não pode ir, de carro, a lugar algum, porque o trânsito se tornou extremamente moroso, não há espaços para estacionamento e os assaltantes agem como se estivessem na casa da sogra, e criou o Parque da Cidade, amplo espaço verde e tranquilo, com espelho d’água, palco para espetáculos e muitas árvores, lugar ideal para lazeres e reuniões de família, mas que entrou em decadência e caiu, por fim, no abandono.
O Parque, que chegou a funcionar tranquilamente durante algum tempo, devido ao grande número de frequentadores foi cercado de barracas. É incrível, e deveria chamar a atenção de psicólogos, sociólogos e outros estudiosos a vocação de Feira de Santana para a barraca de cachaça (mas, provavelmente, também de outras mercadorias igualmente procuradas), cobertas de lonas imundas, cheias de buracos, a anunciar vícios e contaminações de todos os quilates, mas que hoje dominam até o centro da cidade. Afastaram frequentadores do Parque, fugitivos, também, do grande número de ladrões que passaram a atacar pessoas até às portas daquele próprio do Município, que lavou as mãos, como Pilatos, só que o governador romano fez questão de dizer que lavava as mãos entre inocentes. Nem todos podem dizer a mesma coisa.
Artigo publicado na edição desta sexta-feira, 28, da "Folha do Norte"

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