De Diogo Mainardi, na "Veja":
Entre no YouTube. Digite: Lula É Minha Anta. Vai aparecer uma vinheta de catorze segundos anunciando meu livro. Ela foi encomendada por minha editora. É tudo muito simples e direto. Da esquerda para a direita, uma anta vem trotando estupidamente. Ela é uma imagem do passado, regressiva, arcaica – foi desenhada por um naturalista francês do século XVII. Surge na tela um letreiro grandiloqüente: "Chantagem, corrupção, intrigas e muita polêmica". A essa altura, meu livro cai do céu, como as Tábuas da Lei no Monte Sinai. O letreiro diz: "Os escândalos que sacudiram o país pela ótica de Diogo Mainardi. Já nas livrarias e nas listas dos mais vendidos". Fim. Entre 15 e 19 de novembro, a vinheta foi exibida nas TVs dos aeroportos. Depois, inesperadamente, puf. Retiraram-na do ar. Tentei descobrir o motivo. Estou intrigado até agora. A empresa que administra a publicidade em Congonhas alegou que a Infraero proíbe qualquer tipo de propaganda de cunho político. Como é que é? Cunho político? No meu caso, trata-se simplesmente de propaganda de uma antologia de crônicas publicadas na maior revista do país. Não sou candidato a vereador. Não estamos em período eleitoral. Se a vinheta tivesse sido recusada logo de cara, quando foi apresentada pela primeira vez, me pareceria apenas um sinal de obtusidade. Um dos muitos sinais de obtusidade com os quais nos defrontamos todos os dias. Mas, sem querer espernear demais, o que aconteceu com meu livro foi bem pior: tem um cheirinho azedo de censura. Afinal, a vinheta foi veiculada regularmente por cinco dias. Até alguém tomar a iniciativa de proibi-la. Até alguém mandar cassá-la. Quem? A empresa que administra a publicidade nos aeroportos assumiu a culpa por veicular a propaganda "proibida". Falta saber de onde partiu a ordem para retirá-la do ar. Talvez de um funcionário da Infraero. Talvez de um membro de quinto escalão do governo. Isso eu nunca vou conseguir descobrir. Só posso fazer conjecturas, todas elas levemente persecutórias. O Brasil não é a Venezuela. Não estamos à beira de um golpe de estado. Em particular, Lula não é Hugo Chávez. Em vez de reprimir, como o saltimbanco bolivariano, Lula se especializou no conchavo, na barganha, na compra e venda. Além disso, de um ponto de vista puramente comercial, mais mesquinho, duvido que a ausência de publicidade nos aeroportos prejudique o desempenho do meu livro. Mas o episódio da vinheta publicitária tem um aspecto alarmante: é com esse tipo de mentalidade abrutalhada que se forma uma sociedade autoritária. O arbítrio não se manifesta apenas através dos gestos de seus tiranetes iletrados ou de seus pelegos rapinadores. Ele se manifesta também através da selvageria censória de seus sabujos e de seus peões. A liberdade, de um dia para o outro, pode fazer puf.
Entre no YouTube. Digite: Lula É Minha Anta. Vai aparecer uma vinheta de catorze segundos anunciando meu livro. Ela foi encomendada por minha editora. É tudo muito simples e direto. Da esquerda para a direita, uma anta vem trotando estupidamente. Ela é uma imagem do passado, regressiva, arcaica – foi desenhada por um naturalista francês do século XVII. Surge na tela um letreiro grandiloqüente: "Chantagem, corrupção, intrigas e muita polêmica". A essa altura, meu livro cai do céu, como as Tábuas da Lei no Monte Sinai. O letreiro diz: "Os escândalos que sacudiram o país pela ótica de Diogo Mainardi. Já nas livrarias e nas listas dos mais vendidos". Fim. Entre 15 e 19 de novembro, a vinheta foi exibida nas TVs dos aeroportos. Depois, inesperadamente, puf. Retiraram-na do ar. Tentei descobrir o motivo. Estou intrigado até agora. A empresa que administra a publicidade em Congonhas alegou que a Infraero proíbe qualquer tipo de propaganda de cunho político. Como é que é? Cunho político? No meu caso, trata-se simplesmente de propaganda de uma antologia de crônicas publicadas na maior revista do país. Não sou candidato a vereador. Não estamos em período eleitoral. Se a vinheta tivesse sido recusada logo de cara, quando foi apresentada pela primeira vez, me pareceria apenas um sinal de obtusidade. Um dos muitos sinais de obtusidade com os quais nos defrontamos todos os dias. Mas, sem querer espernear demais, o que aconteceu com meu livro foi bem pior: tem um cheirinho azedo de censura. Afinal, a vinheta foi veiculada regularmente por cinco dias. Até alguém tomar a iniciativa de proibi-la. Até alguém mandar cassá-la. Quem? A empresa que administra a publicidade nos aeroportos assumiu a culpa por veicular a propaganda "proibida". Falta saber de onde partiu a ordem para retirá-la do ar. Talvez de um funcionário da Infraero. Talvez de um membro de quinto escalão do governo. Isso eu nunca vou conseguir descobrir. Só posso fazer conjecturas, todas elas levemente persecutórias. O Brasil não é a Venezuela. Não estamos à beira de um golpe de estado. Em particular, Lula não é Hugo Chávez. Em vez de reprimir, como o saltimbanco bolivariano, Lula se especializou no conchavo, na barganha, na compra e venda. Além disso, de um ponto de vista puramente comercial, mais mesquinho, duvido que a ausência de publicidade nos aeroportos prejudique o desempenho do meu livro. Mas o episódio da vinheta publicitária tem um aspecto alarmante: é com esse tipo de mentalidade abrutalhada que se forma uma sociedade autoritária. O arbítrio não se manifesta apenas através dos gestos de seus tiranetes iletrados ou de seus pelegos rapinadores. Ele se manifesta também através da selvageria censória de seus sabujos e de seus peões. A liberdade, de um dia para o outro, pode fazer puf.
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