Por Percival Puggina
Nos anos 80 integrei um grupo de abnegados que promovia palestras sobre senso crítico, formação da consciência individual e formas de ação coletiva contra o estupro que setores da mídia promovem nos bons e consensuais valores da sociedade. Combatíamos quixotescamente, cientes de que enfrentávamos dragões com tesourinhas, dessas que se dá para crianças recortar papel. Sem fio nem ponta. Mas preservávamos, pelo menos, a orgulhosa sensação de estar fazendo algo contra o que víamos e, principalmente, contra o que antevíamos. Com o tempo, a vida se encarregou de dispersar os membros do grupo pelo país afora e nossos cursos pararam por falta de equipe.
Decorridas mais de duas décadas, quando me lembro daqueles anos, do que então era exibido em programas e novelas de tevê, e do que motivava nossa atividade cívica em defesa dos traditional values, colho a impressão de que se por um lado estávamos certos ao identificar os males que apontávamos, de outro subavaliávamos os rumos que as coisas iriam tomar na sociedade brasileira. Tudo degenerou muito mais, na telinha e na vidinha. De minha parte, desde então, não assisto mais novelas. Ostento o distintivo: sou um brasileiro que, em um quarto de século, não assistiu uma única novela. Mas tomo ciência, pelas conversas de casa, das vulgaridades, rolos e perversões que caracterizam as muitas histórias narradas nesses folhetins. Graças à persistência com que se vão degradando os enredos, ano após ano, o que antes chocava foi se tornando aceitável, comum (e, por isso, visto como "normal"). E o que hoje espanta, amanhã será insuficiente para causar sensação. Dizem os drogados que se passa o mesmo em relação às substâncias que utilizam. Já tem muita gente cheirando cinco novelas por dia e entrando em síndrome de abstinência quando acaba o BBB.
Pois bem, foi dentro dessa moldura que assisti, nos últimos dias, um comercial institucional da Rede Globo chamando atenção para a significativa função social que desempenha quando inclui temas de interesse social em suas novelas e minisséries. Em casa, me confirmam: isso tem ocorrido, mesmo, com a introdução de personagens e assuntos que suscitam atenção para o problema das drogas, de certas deficiências físicas e assim por diante. Valeu, pessoal da Globo! Obrigadão! A consciência social de vocês me leva às lágrimas.
Simultaneamente com esse bônus de conveniência pública, persiste contudo, derrubando a balança, a sistemática degradação dos valores, avançando, passo a passo, sobre quaisquer limites que se possa conceber. É inesgotável a imaginação dos roteiristas para promover o aviltamento moral. Assim, por exemplo, leio que "Passione", a novela recém concluída, reservou para o apogeu das últimas cenas os relatos de um sujeito bígamo, que engravidara simultaneamente as duas mulheres, e que, por proposta de uma delas, compôs com ambas um ajuste de convivência triangular consentido e permanente. Coisa do tipo segunda, quarta e sexta com uma e terça, quinta e sábado com outra. Domingo folga geral. Não surpreende, portanto, que já se organizem no país movimentos voltados para cobrar do Estado brasileiro a indispensável tutela jurídica de tais sem-vergonhices.
Mas só isso pareceu pouco a Sílvio de Abreu e seu folhetim. Era preciso avançar ainda mais na degeneração protagonizada por "Passione". Faltava um morango na cobertura. E o morango da depravação ficou reservado para as cenas grotescas de uma senhora octogenária que, posta aos amassos com um coetâneo - varão que receberia por esposo -, simultaneamente se requebrava e seduzia outro velhote de miolo mole. Tal vovozinha certamente encontrou inspiração dentro do círculo familiar do autor da história. Por isso, quero deixar bem claro a quem vive nos dizendo que "a gente se vê por aqui". Senhores, a gente não se vê nisso aí!
Fonte: "Mídia Sem Máscara"
Decorridas mais de duas décadas, quando me lembro daqueles anos, do que então era exibido em programas e novelas de tevê, e do que motivava nossa atividade cívica em defesa dos traditional values, colho a impressão de que se por um lado estávamos certos ao identificar os males que apontávamos, de outro subavaliávamos os rumos que as coisas iriam tomar na sociedade brasileira. Tudo degenerou muito mais, na telinha e na vidinha. De minha parte, desde então, não assisto mais novelas. Ostento o distintivo: sou um brasileiro que, em um quarto de século, não assistiu uma única novela. Mas tomo ciência, pelas conversas de casa, das vulgaridades, rolos e perversões que caracterizam as muitas histórias narradas nesses folhetins. Graças à persistência com que se vão degradando os enredos, ano após ano, o que antes chocava foi se tornando aceitável, comum (e, por isso, visto como "normal"). E o que hoje espanta, amanhã será insuficiente para causar sensação. Dizem os drogados que se passa o mesmo em relação às substâncias que utilizam. Já tem muita gente cheirando cinco novelas por dia e entrando em síndrome de abstinência quando acaba o BBB.
Pois bem, foi dentro dessa moldura que assisti, nos últimos dias, um comercial institucional da Rede Globo chamando atenção para a significativa função social que desempenha quando inclui temas de interesse social em suas novelas e minisséries. Em casa, me confirmam: isso tem ocorrido, mesmo, com a introdução de personagens e assuntos que suscitam atenção para o problema das drogas, de certas deficiências físicas e assim por diante. Valeu, pessoal da Globo! Obrigadão! A consciência social de vocês me leva às lágrimas.
Simultaneamente com esse bônus de conveniência pública, persiste contudo, derrubando a balança, a sistemática degradação dos valores, avançando, passo a passo, sobre quaisquer limites que se possa conceber. É inesgotável a imaginação dos roteiristas para promover o aviltamento moral. Assim, por exemplo, leio que "Passione", a novela recém concluída, reservou para o apogeu das últimas cenas os relatos de um sujeito bígamo, que engravidara simultaneamente as duas mulheres, e que, por proposta de uma delas, compôs com ambas um ajuste de convivência triangular consentido e permanente. Coisa do tipo segunda, quarta e sexta com uma e terça, quinta e sábado com outra. Domingo folga geral. Não surpreende, portanto, que já se organizem no país movimentos voltados para cobrar do Estado brasileiro a indispensável tutela jurídica de tais sem-vergonhices.
Mas só isso pareceu pouco a Sílvio de Abreu e seu folhetim. Era preciso avançar ainda mais na degeneração protagonizada por "Passione". Faltava um morango na cobertura. E o morango da depravação ficou reservado para as cenas grotescas de uma senhora octogenária que, posta aos amassos com um coetâneo - varão que receberia por esposo -, simultaneamente se requebrava e seduzia outro velhote de miolo mole. Tal vovozinha certamente encontrou inspiração dentro do círculo familiar do autor da história. Por isso, quero deixar bem claro a quem vive nos dizendo que "a gente se vê por aqui". Senhores, a gente não se vê nisso aí!
Fonte: "Mídia Sem Máscara"
Um comentário:
Não nego que vejo uma única novela, a das 21horas, na Globo, Dimas. Não tenho nenhuma preocupação em perder capítulos, nada disto, mas sempre que posso, a vejo. Não sou contra o que o autor do artigo disse, só esquecendo, êle, de que outros canais também têm essas mesmas cenas e maus exemplos como tem mostrado a Globo. Sei, porque gosto de pesquisar fora da Globo também.
Dimas, dia dêsses, eu estava assistindo aos últimos capítulos de "Passione" e cheguei a pensar e até a comentar em casa, sôbre os maus exemplos que alguns programas televisivos estão dando aos adolescentes e às crianças de um modo geral, como se tudo aquilo fôsse algo super normal e permitido.
Uma senhora de mais de noventa anos traindo o marido e sendo amante do motorista da casa e do jardineiro. Cada um dos bonitões da novela, levando todas as mulheres mais bonitas da novela prá cama. Um homem que tem tesão(e chamavam aquilo de amor) por duas mulheres ao mesmo tempo, ter um acÕrdo entre os três, sendo os dias pares prá uma, os dias ímpares prá outra e o domingo prá recarregar as baterias do "coitado", que tinha dois filhos com cada uma.
Outros exemplos assim e fico imaginando que a responsabilidade maior aí, é dos pais, já que a programação é livre prá qualquer horário. Se eu tivesse uma criança em casa, certamente que ela não veria uma novela dessas, em qualquer canal de TV.
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