Por Reinaldo Azevedo
Olhem, caras e caros, não vou entrar no
mérito se houve ou não estupro coletivo de uma adolescente de 16 anos no
Complexo de Favelas São José Operário, na Zona Oeste do Rio. Até porque, a esta
altura, ainda que as provas gritassem o contrário, seria proibido chegar a uma
conclusão diferente daquela a que já chegaram a imprensa, a militância de
gênero e a histeria politicamente correta. O vídeo sugere que um grupo de homens
manipula o corpo de uma mulher que não parece ter controle de si. Para a Lei
12.015, de 2009, basta. É estupro. Que os culpados sejam punidos. Mas não dá
para aceitar a punição, ainda que moral e simbólica, dos não culpados: todos os
outros homens. Explico.
Alheios
a quaisquer circunstâncias e mesmo a algumas inconsistências da narrativa, os
grupos militantes saíram tonitruando por aí que a ocorrência - que ainda
precisa ser apurada - era mais uma manifestação de uma certa cultura do estupro
que existiria no Brasil.
A
ministra Cármen Lúcia, do STF, em nota, chegou a escrever: "Repito: a nós
mulheres não cabe perguntar quem é a vítima: é cada uma e todas nós". É o tipo
de texto perigoso. Porque, de algum modo, joga todos os homens do outro lado da
linha. Ainda que a ministra tenha dito que a ocorrência avilta todos os
humanos, é evidente que se dá um peso especial à questão de gênero.
Ocorre
que esta acaba mais mascarando do que desvelando a realidade. Digam-me aqui:
sob o controle do narcotráfico, os direitos das mulheres são os únicos
agravados no Complexo de Favelas São José Operário? A resposta, obviamente, é
não! Por lá, não se respeita é direito nenhum. Afirmar que tal ocorrência
revela a existência no país de uma cultura do estupro é de uma estupidez
inominável. Até parece que há uma naturalização de tal crime no país e que sua
gravidade não está devidamente assentada na consciência da maioria dos
brasileiros. Então vamos pensar um pouco.
As
notificações de estupro cresceram enormemente depois de 2009, o que coincide
com a aprovação da Lei 12.015, uma pérola da militância feminista. Considera-se
estupro não apenas a violência caracterizada como tal como qualquer ato
libidinoso não consentido. É evidente que se trata de um desserviço à verdade e
às próprias mulheres. Afinal, isso serve para mascarar as circunstâncias em que
os estupradores de fato agem. Mas deixo isso de lado agora.
Por
ano, com a nova lei, os estupros saltaram para algo em torno de 47 mil no país.
É claro que é um número absurdo, ainda que parte das notificações seja
constituída dos tais atos libidinosos. Mas será isso, então, a evidência da "cultura do estupro"?
Venham
cá: há, em média, 53 mil assassinatos por ano no Brasil, mais de 80% das
vítimas são homens. Será que se pode falar que há, também, em nosso país, uma "cultura do assassinato de homens"?
Para
que o evento do Complexo de Favelas São José Operário pudesse ser expressão de
uma cultura, forçoso seria que, no Brasil, mulheres não pudessem, em regra,
ficar em ambientes masculinos, pouco importando variáveis outras - econômicas,
sociais, culturais - sem que corressem o risco de ser estupradas. E isso me
parece escandalosamente falso. Como é falso afirmar que a taxa de homicídios de
Moema é igual à do Capão Redondo porque, afinal, há no Brasil uma "cultura do
assassinato".
Assim
como as variáveis socioeconômicas interferem na ocorrência dos demais crimes - são maiores onde vigora a lei do cão; onde falta o estado necessário -, é
evidente que também deixam o seu viés nesse tipo de ocorrência. Ou o tal
estupro coletivo não se deu num ambiente em que se misturam droga,
narcotráfico, escolhas individuais perigosas e ausência de estado de direito?
Repudio
essa bobagem de cultura de estupro porque isso tende a mascarar as duas
questões que realmente contam: 1) as condições socioeconômico-culturais em que
um episódio como aquele se torna possível; 2) as responsabilidades individuais.
Tendo havido estupro, foram aqueles rapazes os estupradores. Os demais homens
não têm nada com isso.
Que
se apure tudo. A história dos 33 estupradores me parece, em princípio,
fantasiosa. Não cabiam tantos naquele quarto. Não me parece que a vítima
estivesse em condições de ser precisa para enumerar as personagens de um
eventual revezamento. Indago: e se, no grupo, de cinco, 10 ou 30, houver
menores? A militância de gênero abre mão de uma punição mais severa em nome do
Estatuto da Criança e do Adolescente, que, obviamente, protege também os
estupradores?
E
notem: nesse caso, sou adepto da frase "meu corpo, minhas regras". É evidente
que uma mulher tem o direito de dizer "não" em qualquer circunstância, e isso
inclui interromper o ato caso tenha mudado de ideia. Não há razão que
justifique o sexo forçado. Ponto. Ainda que a tal garota, como se especula,
tivesse aceitado fazer sexo com dois ou três, isso não daria a outros a licença
de participar se isso não fosse da sua vontade. Eu escrevo para indivíduos, não
para militantes.
Todos
sairíamos ganhando enormemente se houvesse mais respeito pelas vítimas, em vez
de transformá-las em estandartes e em símbolos de luta. Acho isso de um
oportunismo asqueroso. Um grupo de pessoas que foi protestar em frente ao
Supremo - e, até agora, não entendi por quê - e aproveitou para gritar palavras
de ordem contra… Michel Temer. O que uma coisa tem a ver com outra? Ora,
afinal, este é o país que depôs uma mulher, não é? Não faltará quem veja nisso
também uma metáfora do estupro - no caso, estupro político. Ainda que tal
evento tenha vindo na esteira da maior roubalheira jamais praticada no
país. E é evidente que seria um erro afirmar que Dilma nos conduziu ao desastre
porque é mulher.
As
militâncias dos grupelhos nunca estão interessadas pelos que sofrem. Estes só
têm importância se as ocorrências puderem ajudar a causa da "libertação". Qual
libertação? Qualquer uma, desde que seja contra o statu quo. Cresceu
enormemente o número de estupros na Alemanha com a chegada dos imigrantes
islâmicos. A imprensa de esquerda escondeu as ocorrências porque, concluiu-se,
isso poderia gerar uma onda de preconceitos.
Por
que digo isso? O que estou evidenciando é que a questão do estupro pode ser "esquentada" ou "esfriada" a depender da intenção política que se tenha e da
eficiência do ativismo dos grupos que decidem fazer uma coisa ou fazer outra.
Que
os culpados sejam punidos segundo os rigores da lei. Mas vamos parar com essa
conversa estúpida de que este é um país de potenciais estupradores. A ser
assim, também é um país de potenciais homicidas.
Ah,
sim: se a polícia conseguir, conviria ao menos investigar o que se deu naquele
dia. É o que se deve fazer quando acontece qualquer crime.
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"