Foto: Agência Brasil
Por Ricardo Setti
Com a habitual franqueza, o empresário Jorge
Gerdau - exemplo de empreendedor bem-sucedido, cujo império siderúrgico
embasado no Brasil já se estende por vários Estados americanos - decretou: o
país, disse em entrevista à 'Folha de S. Paulo' e ao UOL, precisa apenas de "meia
dúzia de ministérios", e não dos 39 que respondem à presidente Dilma Rousseff.
Mais contundente, continuou ele, com a
autoridade de quem está à frente, voluntariamente, da Câmara de Políticas de
Gestão da presidente: "Quando a burrice, ou a loucura, ou a
irresponsabilidade vai muito longe, de repente, sai um saneamento.
Provavelmente estamos no limite desse período. (…) Eu já dei um toque na
presidenta".
Pois aí estamos. Com a recente criação da
Secretaria da Micro e da Pequena Empresa, cujo futuro titular terá status de
ministro, a presidente dispõe de um Ministério colossal, absurdo, gigantesco,
talvez o maior Ministério de qualquer país do planeta, excetuadas eventualmente
repúblicas corruptas da África, e com certeza o mais numeroso da história
"deztepaiz".
Mostrengo disforme e disfuncional
Não se trata apenas de
um Ministério imenso. Pior que isso, a menos que ocorra o que prevê Gerdau, ele
parece "imexível", como diria um ex-ministro de triste memória: o ex-presidento
Lula engordou enormemente a cúpula do governo em Brasília para melhor aquinhoar
os chamados "partidos da base aliada" no Congresso - a conhecida salada que vai
do PC do B ao malufismo, passando por fisiológicos do PMDB e siglas controladas
por igrejas evangélicas -, Dilma seguiu adiante e agora é um problemaço
político mexer nesse monstrengo disforme e disfuncional.
O Ministério de Dilma,
como o do ex-presidento (que tinha 37 ministros), lembra a Hidra de
Lerna da mitologia grega. A Hidra aparece no âmbito dos 12 trabalhos de
Hércules, o semideus filho (adulterino) de Zeus, o rei dos deuses do Olimpo,
com a mulher do rei de Tebas.
Não cabe neste espaço recordar relembrar a
complicada história que levou Hércules, em busca de expiação e da imortalidade,
a haver-se com uma dúzia de tarefas impossíveis. O fato é que já o segundo
trabalho hercúleo consistia em enfrentar a Hidra, monstro aquático de nove
cabeças, uma delas imortal.
O desafio era realmente para semideuses: para
cada cabeça que o herói conseguia cortar, nasciam mais tantas quantas faltavam
para decepar. Hércules, naturalmente, triunfou. Nem a cabeça imortal sobrou.
Se fosse uma empresa, o dono ficaria
louco
Não é que a presidente não saiba do problema.
E não foi preciso o "toque" de Gerdau. Ela conhece perfeitamente o tamanho da
encrenca.
Nos cinco anos em que pilotou a Casa Civil e
nos quase quatro em que coordenou o tão falado Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC), a hoje presidente manteve incontáveis encontros e reuniões
de trabalho com empresários e executivos de grandes empresas, em vários casos
de empresas multinacionais de dimensões gigantescas.
Portanto, a presidente, que é economista, nem
precisaria perguntar a um desses seus freqüentes interlocutores se existiria,
em suas companhias, alguma chance de dar certo o trato direto com 39 diretores.
Com certeza ouviria, como resposta, que lidar
com 39 direct reports é um absurdo que fatalmente conduz a empresa a
se tornar empresa burocratizada, hipopotâmica, aparvalhada - sem contar que o
CEO, presidente ou dono provavelmente ficaria louco.
Pois um dos segredos do que hoje se considera
uma boa governança empresarial consiste, justamente, por meio da delegação e
outras formas de gestão, em diminuir o quanto possível o número de
interlocutores obrigatórios de cada gestor em seu respectivo nível.
No 1º ano de mandato de Lula, a ministra só despachou uma vez com o presidentoO então presidento Lula acotovelou o máximo de partidos políticos possível no Ministério, em nome da "governabilidade". Com isso, deixou inteiramente de lado qualquer busca de eficiência da máquina - no caso, a mais numerosa desde a Independência, em 1822. Nem nossos dois imperadores, D. Pedro I e D. Pedro II, dispuseram de tamanho séquito administrativo.
A multidão de gente elevada à categoria de ministros é tal que alguns raramente despacharam a sós com o presidento. Basta fazer as contas: levando-se em consideração as numerosas viagens ao exterior e os muitíssimos périplos pelo país, Lula, durante seus oito anos de mandato, passou cerca de um terço de cada ano, ou pouco mais que isso, em Brasília.
Digamos que tenham sido 100, ou até 120 dias
úteis por ano. Mesmo que despachasse diariamente com um ministro diferente - o
que não ocorreu com Lula -, eles passariam mais de três meses sem contato com o
ou a presidente. Não foi por outra razão que, no primeiro ano do primeiro
lulalato, 2003, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, mesmo sendo na época
politicamente muito próxima a Lula, só despachou com ele uma única vez.
Dilma viaja menos. Ainda assim, é impossível
avistar-se com os ministros tête-à-tête com uma frequência minimamente
desejável.
Como todos sabemos, Lula sempre gostou de se
comparar a presidentes com marca de realizadores, como Getúlio Vargas ou
Juscelino Kubitschek. Nunca mencionou, contudo, nem de longe, comparações com o
tamanho dos respectivos times.
Getúlio e JK tiveram um máximo de 11
ministros
Não obstante os tempos obviamente sejam
outros, e mais complexos, Getúlio, em seus quatro diferentes períodos de
governo e 18 anos de poder (de 1930 a 1945 e, depois, de 1951 a 1954), governou
com um mínimo de 7 e um máximo de 11 ministros.
JK (1956-1961) contou com 11 ministros, e 5
titulares do que então se chamavam "órgãos de assessoramento", como os
gabinetes Civil e Militar.
E vamos evitar falar de nomes, pelo amor de
Deus. Ministros de Getúlio, JK e outros presidentes foram não raro gigantes políticos,
que o país conhecia e respeitava.
Quem é capaz de citar o nome de cinco dos 39
ministros atuais?
Praticamente todos os países sérios e maduros
são governados por times enxutos. Os presidentes americanos, por exemplo,
conseguem tocar adiante a superpotência de 315 milhões de habitantes e uma
economia colossal de mais de 15 trilhões de dólares com 15 ministros. A
chanceler Angela Merkel conduz a Alemanha, quarta maior economia do planeta e
país mais rico e importante da Europa, com 17 ministros - em sua primeira
gestão, eram 15.
É claro que a eficiência de uma máquina
pública não se mede apenas pelas dimensões do Ministério. Entretanto, o
primeiro e grande empecilho para que ela ande a contento é o tamanho exagerado
- que Lula não levou em conta durante o primeiro mandato, continuou a fazê-lo
no segundo e que a "gerentona" Dilma ainda conseguiu engordar mais.
Fonte: Veja.com
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