Por André Trigueiro
Lixo é assunto de prefeito. É dele a responsabilidade pelo
sistema de coleta, transporte e destinação final dos resíduos. Invariavelmente
os prefeitos recorrem a serviços terceirizados para cumprir essas funções.
Editais mal formulados de licitação, falta de transparência e fiscalização
deficiente compõem o cenário que tornou o lixo - não apenas no Brasil mas em
boa parte do mundo - um chamariz de corruptos.
O mercado se baseia no peso do lixo. Cobra-se pela tonelada
de resíduo transportada de caminhão (as empresas do setor são remuneradas com
base em estimativas de carga nem sempre precisas) e pela tonelada de resíduo
que dá entrada em aterros sanitários (onde balanças rodoviárias deveriam aferir
o peso e cobrar pelo descarte). Para cada tipo de resíduo há um valor
específico, dependendo da periculosidade da carga. O custo da tonelada de
resíduos industriais perigosos,por exemplo, pode chegar a mil reais, enquanto o
lixo domiciliar flutua numa faixa de quarenta reais.
Não é difícil imaginar porque a maioria dos prefeitos no
Brasil - sem o amparo de uma boa assessoria técnica - ainda destinem seus
resíduos em vazadouros clandestinos. Invariavelmente eles herdam o problema de
seus antecessores, temem os custos inerentes a destinação correta dos resíduos,
e mantém a rotina criminosa de descartar o lixo em lugar impróprio alugando o
serviço de uma empresa de transportes pelo preço médio de cinco reais a
tonelada. Há também a presunção de que cuidar bem do lixo não dá voto, além do
risco de não conseguir resolver o problema até o fim do mandato. Em resumo:
melhor deixar tudo como está, ainda que uma nova Lei Federal - a Política
Nacional de Resíduos Sólidos - estabeleça o prazo limite de 2014 para a
existência de lixões em território nacional.
É preciso deixar claro que todas as ações em favor da
destinação inteligente dos resíduos (reciclagem do lixo seco, compostagem do
lixo úmido, reaproveitamento de entulho, produção de energia etc.) encontra
forte resistência de prefeitos mal informados, incompetentes ou que agem de má
fé por obterem alguma recompensa ilícita despejando o lixo em vazadouros. Estes
encontram o apoio de empresários que se locupletam das estimativas grosseiras -
invariavelmente arredondadas para cima - do peso de lixo que levarão em seus
caminhões sabe lá Deus pra onde.
Ainda que o município disponha de um aterro sanitário - ou
tenha a opção de descartar o lixo num depósito credenciado no município vizinho
- pode-se coletar o material e evitar a cobrança feita pelo aterro (os recursos
ajudam a cobrir os custos do tratamento dos gases e do chorume, além do manejo
adequado dos resíduos) despejando em outro lugar qualquer onde ninguém flagre o
lançamento e nem cobre por isso. A situação é particularmente grave quando se
trata dos "Resíduos Classe 1", também chamados de resíduos perigosos, por terem
as seguintes características definidas pela Associação Brasileira de
Normas Técnicas (ABNT): "inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade e
patogenicidade”. Lixo hospitalar e resíduos industriais, por exemplo, se
enquadram nessa categoria.
Por razões óbvias, tanto o transporte quanto a destinação
final desse lixo perigoso determinam cuidados especiais e custos elevados,
razão pela qual a tentação de não seguir a risca o que determina a lei para
economizar uns trocados é gigantesca. Como o Brasil é um país continental, há
muitas rotas de fuga para despejar esses resíduos em lugares inadequados, com
enormes riscos à saúde humana e ao meio ambiente. É expressiva a quantidade de
áreas contaminadas nas cercanias das zonas industrias do Brasil. A Rede Latino
Americana de Prevenção e Gestão de Sítios Contaminados (Relasc) disponibiliza
farto material a respeito no site da entidade http://www.relasc.org/
Apenas no Estado de São Paulo existem 2272 áreas comprovadamente contaminadas.
Esse problema não seria tão preocupante se houvesse vontade
política para fiscalizar caminhões e carretas e cobrar dos respectivos
motoristas o "manifesto de resíduos", uma declaração exigida por lei que
especifica origem, destino e classificação do lixo transportado.Cabe aos órgãos
ambientais estaduais a devida fiscalização desses materiais. Mas, aqui entre
nós, alguém parece preocupado com isso? E os seus candidatos a prefeito e a
vereador? Qual a posição deles sobre tudo isso? Em tempo de eleições
municipais, convém prestar atenção de que lado eles estão. Esse é o tipo de
assunto sobre o qual não dá para ficar em cima do muro. Quem está a favor da
máfia do lixo, está contra você e a sua cidade.
Fonte: Mundo Sustentável - G1
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