Por Carlos Chagas
Mil anos atrás, este que vos escreve deslumbrou-se
pela primeira vez com a maravilha que era e continua sendo Paris. Poucos anos
haviam decorrido do fim da II Guerra Mundial e nem precisávamos puxar pela
memória de transeuntes, motoristas de táxi, garçons de bar, diplomatas,
banqueiros e povão nas ruas. Antecipavam-se, tinham sido todos da Resistência,
nenhum deixava de contar as ações heróicas de que participara na luta contra o
nazismo.
Parecia que a França jamais se havia curvado à
truculência germânica, que a ocupação fora mero pretexto para a posterior
distribuição de medalhas e a exaltação do espírito indomável do berço da
liberdade.
Ninguém lembrava de que se não fossem os americanos,
os franceses estariam falando alemão até hoje. Aliás, uma das maiores charges
da época foi publicada no New York Times, mostrando um De Gaulle imenso e
arrogante, quando expulsou a Otan de seu território, mandando embora um
soldadinho dos Estados Unidos e exclamando: "Suma daqui e só volte quando os
boches nos invadirem novamente!"
Pois é. Excessos existem de todos os lados. Até
violências inomináveis, como a tortura, os seqüestros, os assassinatos e a
ocultação de cadáveres, praticados pelos agentes do Estado brasileiro durante a
ditadura militar. Estava certa a presidente Dilma quando lembrou que a Lei da
Anistia impede a punição de quantos se envolveram naqueles horrores, afirmando
em seguida que "não perdoaremos".
Só que tem um problema: durante os anos de chumbo,
quantos resistiram? Hoje, parece que foram todos, com o PT à frente, o PMDB, o
PSDB, mais a Ordem dos Advogados, a ABI, a CNBB, os operários em massa, toda a
classe média, os banqueiros, os empreiteiros, os donos da terra e os sem-terra.
Não foi bem assim. Excluindo certas elites que davam sustentação direta ao
regime e até financiavam os horrores, a grande maioria da população
acomodou-se. Ignorou, propositadamente, as profundas agressões aos direitos
humanos e ao esfacelamento das instituições democráticas. À exceção de uns
poucos idealistas e de outro tanto de truculentos, iguaizinhos aos que
assolavam a nação, a sociedade conviveu com os generais-presidentes. Ninguém
deixou de pular o Carnaval nem de comparecer ao Maracanã ou ao Morumbi para
delirar com nosso craques. Disputavam-se empregos, alimentação, casa própria,
família, escolas, universidades e tudo o mais que se disputa hoje, mesmo sem,
lá e cá, conseguirmos o necessário.
Sendo assim, fica meio ridículo agora assistir todo
mundo apregoando, e alguns até se locupletando, por terem resistido contra a
ditadura militar. Mais ou menos como os franceses, na década de cinqüenta,
diziam haver resistido, enfrentado e vencido o nazismo. E olhem que nossos
valores são completamente diferentes. O Brasil é muito maior do que seus
excessos, suas contradições e seus horrores. Continua aqui, apesar de tudo...
Um comentário:
Os que mais falam da "ditadura", são os que melhor se deram na vida, com bons cargos, boa grana e tudo o que a maioria dos brasileiros gostaria de ter.
Nunca entendi no que essa maioria, que tanto fala, foi prejudicada. Sei que há alguns que não tiveram a sorte dessa turma que aí está, desapareceram e nunca foram localizados, mas deveriam esclarecer dos dois lados, porque culpar apenas os "ditadores", agora, é fácil. Se hoje, alguns contrários ao gov do PT se rebelassem, ela os mandaria prender e sei lá mais o que.
Ordem é ordem e justiça idem, ontem, hoje e amanhã.
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